Roberto Campos Neto (Foto: Reuters/Brendan McDermid)
"Basta de aumentos na SELIC!"
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O roteiro é um velho conhecido de quem acompanha a evolução da política monetária em nosso País. No intervalo de 45 dias que separa as reuniões do Comitê de Política Monetária (COPOM), a nata do sistema financeiro começa a lançar seus balões de ensaio a respeito daquilo que pretende que seja definido como o futuro patamar da SELIC. O próximo encontro do colegiado está marcado para 17 e 18 de setembro. Ali, mais uma vez, os nove diretores do Banco Central (BC) deverão trocar de boné e assumir a condição temporária de membros do órgão responsável por estabelecer a taxa referencial de juros.
Com a recente decisão de manter a SELIC em 10,50%, tal como adotada na 264ª reunião do COPOM de 30 e 31 de julho, o Brasil segue ocupando a segunda posição no ranking mundial das maiores taxas reais de juros. Atualmente, estamos apenas atrás da Rússia neste quesito, cujo cálculo subtrai a taxa de inflação da taxa nominal de juros. Assim, faz muito tempo que estamos disputando o pódio com outros países, tais como México e Turquia. Esta é apenas mais uma das inúmeras manifestações que caracterizam nosso espaço como um verdadeiro paraíso para o financismo.
Pois agora estamos em meio a mais uma tentativa de promover outra elevação da SELIC na próxima reunião daquele comitê. Para o pessoal do financismo pouco importa que a inflação esteja em níveis reduzidos e sob controle. Para os que raciocinam com os modelos econométricos da ortodoxia e do monetarismo, não é relevante a existência de um nível de desemprego ainda próximo a 7% da população economicamente ativa. Para eles tampouco interessa que os níveis elevados da remuneração financeira atuem como um freio para qualquer processo de retomada de necessário processo voltado ao desenvolvimento econômico, social e ambiental.
Modo terror para aumento da SELIC.
Os argumentos que voltam a ser esgrimados referem-se aos “riscos” apresentados pela recuperação da atividade econômica de forma geral e pelos aumentos identificados na massa salarial e nos componentes da demanda de consumo de forma geral. Aqui e ali são plantadas notícias e opiniões a respeito da necessidade de um novo aumento na taxa referencial de juros. O próprio diretor de política monetária do BC tem adotado esse discurso. Gabriel Galípolo chegou ao governo do terceiro mandato de Lula na condição do segundo cargo do Ministério da Fazenda, responsável pela Secretaria Executiva da pasta. Pouco mais de 6 meses, em julho de 2023, ele foi nomeado para o novo posto da autoridade monetária.
Atualmente, ele é considerado como um dos possíveis nomes à disposição Presidente para substituir o chefe do BC, Roberto Campos Neto. No entanto, desde que passou a integrar o quadro diretivo do órgão responsável pela regulação e pela fiscalização dos sistemas bancário e financeiro, Galípolo passou a se comportar de acordo com o figurino proposto por Campos e sugerido pelos representantes do povo das finanças. As expectativas de que haveria uma mudança significativa na condução das políticas monetária e cambial a partir das nomeações do novo Presidente da República foram sendo frustradas a cada novo período. Algumas das declarações mais recentes do economista colaboram para reforçar o pessimismo de setores progressistas com relação ao seu futuro no comando da economia.
Comentando a respeito das possibilidades de um novo aumento na SELIC e mesmo quanto ao comportamento futuro dos juros, Galipolo afirmou:
(...) “A função do BC é ser o chato na festa. Quando a festa está ficando legal, pede para os outros abaixarem o volume" (...)
Ora esse diagnóstico não é compatível com as visões que têm sido expressas pelo Presidente Lula. Na verdade, o BC deveria se “o chato” na sua relação com os operadores do universo do financismo. Mas a “festa” a que o diretor do banco se refere é o cenário desejado pela grande maioria da população, ou seja, de crescimento das atividades, de aumento da oferta de trabalho e de recomposição dos ganhos salariais. Ocorre que o indicado pelo ocupante do Palácio do Planalto incorpora o discurso e a narrativa das elites financistas e se refere a esse quadro bastante positivo do cenário econômico como sendo um problema. Uma completa inversão de valores e de prioridades.
Nome de Lula no BC deve ser para mudança.
Na verdade, caso continue por essa via conservadora, não falta muito para que o cotado a substituir Campos Neto comece a reverbar as teses austericidas quanto à necessidade de elevar o desemprego e de reduzir salários para que os riscos inflacionários sejam afastados do horizonte. Uma loucura! Caso o governo concorde com tal avaliação, tornar-se-á praticamente impossível que o Presidente Lula consiga cumprir suas promessas de campanha de “realizar 40 anos em 4” e de “fazer mais e melhor do que nos dois primeiros mandatos”. Se a cada melhoria no cenário econômico e social o BC voltar a subir a SELIC, todos os ganhos tendem a ser reduzidos pelo impacto negativo de uma política monetária restritiva.
Esse quadro torna-se ainda mais dramático se agregarmos a essa rigidez na política monetária o garrote que o Ministro da Fazenda mantém, cheio de orgulho, na política fiscal. A insistência de Haddad em cumprir à risca as metas de austeridade fiscal extremada que ele mesmo propôs ao governo atua como um elemento de impedimento da recuperação do protagonismo do Estado. Com a conhecida obsessão em reduzir gastos públicos e inviabilizar a realização de um plano de desenvolvimento que exige investimento público de vulto, o caminho que resta é se contentar com taxas de crescimento do PIB entre 2 % e 3% ao ano, muito aquém das nossas necessidades e das possibilidades potenciais que o Brasil contempla.
Galipolo tem uma parte de razão apenas quando se refere à missão oferecida pelo governo à autoridade monetária. Como a meta de inflação é determinada pelo Conselho de Política Monetária (onde o governo tem maioria), os dirigentes do BC meio que lavam as mãos para jogarem a batata quente de volta ao Chefe do Executivo. O problema é que o Ministro Haddad recusou os alertas realizados pelos economistas desenvolvimentistas para que elevasse um pouco a meta oficial da inflação, por exemplo para algo em torno de 4%. Como a meta atual baixa é muito ambiciosa e pouco razoável para um país como o nosso que pretende crescer bastante suas atividades econômicas, o BC sempre terá o argumento para endurecer ainda mais o arrocho. De acordo com o próprio Galipolo,
(...) “O BC tem que perseguir uma meta de 3% e as hoje expectativas se encontram acima dos 3%” (...)
Ora, frente a esse quadro de indefinição quanto ao futuro da composição do BC, o pessoal da Faria Lima não perde tempo. Eles colocam seus representantes nos meios de comunicação sintonizados com o modo “terror” e abrem apenas para os postulantes de novos aumentos na taxa referencial de juros. Boa parte das empresas de consultoria financeira e as assessorias dos bancos já começam a soltar suas notas e informativos onde são dados como certos novos aumentos na SELIC ao longo das 3 reuniões previstas do COPOM até o final do ano. A única diferença diz respeito à intensidade da elevação: se 0,25% ou 0,50% a cada encontro.
Basta de aumentos na SELIC!
Como esse tipo de informação passa a compor os relatórios da Pesquisa Semanal Focus, realizada pelo BC, é bem possível que esse material de estímulo ao reforço do austericídio esteja presente nos ambientes em que o COPOM venha a se reunir daqui até dezembro deste ano. Assim, o que se percebe é que a sabotagem à implementação do programa de governo de Lula possa ter continuidade, mesmo após a substituição da maioria bolsonarista que ele herdou a partir desde a sua posse em 1º de janeiro de 2023.
Ao movimento progressista, às centrais sindicais e aos defensores de um projeto de futuro para o Brasil cabe manter firme a resistência contra toda e qualquer tentativa de promover novos aumentos na SELIC. É preciso das um basta ao terrorismo colocado em marcha pelo financismo.
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