Braga Netto (à esq.) e Jair Bolsonaro (Foto: REUTERS/Adriano Machado)
“Há sinais de que Bolsonaro era visto como vacilão e de que os militares poderiam deixar de ser tutores do tenente golpista”, escreve o colunista Moisés Mendes
Moisés Mendes
Fez aniversário nessa segunda-feira a pregação de fé do general Braga Netto a patriotas que o cercaram na entrada do Palácio da Alvorada, onde Bolsonaro havia se entrincheirado depois da eleição.
Foi no dia 18 de novembro de 2022. Um grupo abordou o general cobrando atitude dos líderes golpistas, porque a militância acampada esperava um gesto forte para continuar agitando e conspirando.
Braga Netto foi assertivo e fez uma recomendação em tom religioso, depois de dizer que o presidente estava bem:
“Vocês, não percam a fé. É só o que eu posso falar para vocês agora, tá bom?”
Uma mulher disse que os acampados estavam sob chuva e no sufoco. O general vice na chapa derrotada de Bolsonaro a acalmou:
“Eu sei, senhora. Tem que dar um tempo, tá bom? Eu não posso conversar”.
O tom era de um general falando com segurança aos soldados sobre a batalha que se avizinhava. Braga Netto passou confiança aos golpistas amontoados diante do QG do Exército em Brasília.
Agora, se sabe que seis dias antes, em 12 de novembro, ele havia feito uma reunião para tratar de detalhes da trama em sua casa, incluindo o assassinato de Lula, Alckmin e Alexandre de Moraes. E a sequência é conhecida por todos.
Os bloqueios de estradas. A tentativa de invasão da sede da Polícia Federal no dia 12 de dezembro. A bomba colocada num caminhão-tanque, na véspera do Natal, no aeroporto de Brasília. Os ataques às torres de transmissão de energia. A fuga de Bolsonaro para os Estados Unidos e a invasão do 8 de janeiro.
Com o poder da fé, Braga Netto, que se habilitara a ocupar o lugar do inconfiável Hamilton Mourão de vice, havia mostrado a cara, com prova em vídeo. Só faltou dizer que um golpe estava sendo tramado.
Mas só um golpe, apenas um? É agora que se apresenta, com mais consistência, uma boa dúvida que merece mais atenção: o plano completo poderia estar prevendo um golpe contra o próprio Bolsonaro.
O alarido dos comandantes pouco antes da reunião na casa de Braga Netto, com declaração de guerra em manifesto contra as instituições, a sequência de atos violentos e a postura de Braga Netto indicavam, até o final do ano, que o golpe era levado a sério, antes ou depois da posse de Lula.
Bolsonaro foge, o 8 de janeiro vira uma baderna, sem a adesão e os efeitos previstos, e o golpe falha. Se tivesse prosperado, Bolsonaro estaria fora do país. Voltaria para ser seu líder?
Braga Netto e seus parceiros devem saber que o desfecho previsto talvez não fosse esse. É quase certo que o general e seus comandados estavam prontos, com um bem planejado gabinete de crise para golpear o próprio Bolsonaro.
Aos que perguntarem se os militares não dependiam do poder político de Bolsonaro, porque ele é quem tinha votos e quase vencera a eleição de novo, a resposta é essa: golpes não dependem do voto de ninguém.
Se os assassinatos e o 8 de janeiro tivessem funcionado, mais por imposição dos militares do que pela participação vacilante de Bolsonaro, os generais poderiam se livrar do líder frouxo.
Deixariam de ser tutores de um tenente que eles mesmos consideravam incompetente. Eles seriam os protagonistas.
A falha do golpe pode ter impedido que o bolsonarismo virasse outra coisa, aperfeiçoado por uma ditadura clássica. Ainda com o poder da fé, mas sem Bolsonaro acima de tudo e de todos.
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