O Brasil deve se atentar a três relações políticas: com os Estados Unidos, a Venezuela e a Argentina, devido aos acontecimentos de 2024
Danilo Sorato
Após um ano cheio de acontecimentos nas relações internacionais do Brasil, a proximidade do ano novo traz algumas reflexões acerca dos possíveis desafios que o país encontrará em suas relações exteriores. Quais serão os momentos de tensão? Quais serão os momentos de distensão?
No que diz respeito aos momentos de tensão, o Brasil deverá prestar atenção a três relações bilaterais: Estados Unidos, Venezuela e Argentina. Possivelmente, as relações políticas com esses três países não serão as mais tranquilas, considerando os sinais do último ano, ainda que as dificuldades se apresentem por motivos distintos.
Como analisado em 2024, o caso da Venezuela já gerou dificuldades em relação ao resultado eleitoral no vizinho e o veto brasileiro à entrada venezuelana no BRICS+. Se voltarmos dois anos atrás, os problemas políticos entre o Brasil e a Venezuela aconteceram em virtude das disputas fronteiriças entre o vizinho e a Guiana. Dada a instabilidade política e econômica do nosso parceiro venezuelano, possivelmente algumas falas entre Lula e Maduro vão gerar mais ruídos para 2025.
E aqui há um ponto de contato entre os problemas com a Venezuela e os outros dois focos de tensão bilateral. A chegada de Donald Trump à presidência dos EUA será um ponto de atrito entre Brasil e Estados Unidos, especialmente quando o assunto for a crise na Venezuela. Nesse jogo de xadrez, Javier Milei, presidente argentino, certamente possui visões mais alinhadas às de Trump, já que suas ações têm sido no sentido de aprofundar a crise política entre os vizinhos.
Caberá ao Brasil adotar uma postura de equilíbrio e pragmatismo em relação à Venezuela, especialmente no que diz respeito aos EUA e à Argentina. Deverá deixar claro que é crítico em relação aos resultados eleitorais de 2024, mas que não apoia pressões econômicas e políticas sobre o país vizinho. A postura brasileira deverá ser a de mediador entre os dois polos de tensão: Nicolás Maduro e a dupla Trump-Milei.
Além dos problemas com a Venezuela, outra questão problemática entre o Brasil e os EUA será a disputa STF-Musk. Pelo protagonismo que o empresário americano assumirá no governo de Trump, espera-se que ele dê uma resposta às ações judiciais impetradas pelo Judiciário brasileiro em relação à rede social X. A política externa brasileira caberá agir com inteligência para não prejudicar outras agendas (políticas, econômicas, tecnológicas) entre Brasil e EUA.
Em relação ao Brasil e à Argentina, já houve algumas dificuldades entre Lula e Milei nos fóruns multilaterais, como o G-20 e o Mercosul. Esses problemas estão relacionados ao caminho que a integração econômica no continente sul-americano deverá seguir. Enquanto o brasileiro é defensor de uma integração econômica, política e social, o argentino é defensor de uma integração estritamente econômica, inclusive com liberdade para a Argentina articular acordos comerciais bilaterais.
Com a chegada do aliado americano, Milei provavelmente deverá aumentar o tom das críticas às políticas brasileiras. Qual será a estratégia brasileira para essa relação? Além de manter uma relação formal entre os estados, Lula poderá compensar esse distanciamento articulando uma trinca de países no Cone Sul com visões de integração econômica semelhantes: Brasil, Uruguai e Chile. Essa é uma maneira de diminuir a influência de Milei na região, ao mesmo tempo em que abre espaço para novas oportunidades com os vizinhos.
Para além dos pontos de tensão, também é importante pensar quais serão os pontos de distensão. De forma similar ao que ocorreu em 2024, o Brasil apostará fortemente nos eventos multilaterais para ganhar mais protagonismo no cenário internacional. O país sediará o encontro do BRICS+ em Brasília e da COP-30 em Belém do Pará.
Nesses espaços multilaterais, o país será protagonista em duas importantes agendas: a ambiental e a das reformas das instituições globais. Por um lado, dará prosseguimento às suas políticas ambientais em busca de novos acordos que possam ser mais eficazes para conter as mudanças climáticas vigentes no mundo. Por outro lado, utilizará sua voz e seu peso para pleitear mudanças nas atuais instituições multilaterais (ONU, OMC), no caminho de equalizar o poder em um mundo multipolar.
Os dois eventos internacionais consolidarão a imagem brasileira perante o mundo. Isto é, um país que voltou a ter credibilidade internacional e que está nos grandes debates da agenda global. Será um momento de o país conseguir mais sucesso do que alcançou com a organização do G-20 no Rio de Janeiro.
Para finalizar, haverá outros pontos de tensão e distensão na política externa brasileira em 2025. Entretanto, os citados no artigo serão pontos destacados que o Brasil precisará dar atenção para que consiga defender seus interesses perante um mundo em constante transformação.
Danilo Sorato é professor de História e Relações Internacionais. Doutorando em Estudos Estratégicos pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Pesquisador do Laboratório de estudos sobre a Politica Externa Brasileira (LEPEB/UFF) e Pesquisador do Centro de Estudos Estratégicos e do Planejamento Espacial Marinho (CEDEPEM/UFF/UFPel). Escreveu diversos artigos acadêmicos e jornalísticos sobre as relações internacionais do Brasil, em especial os governos Temer, Bolsonaro e Lula.
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