domingo, 9 de março de 2025

Brasil e os BRICS: entre oportunidades e ambiguidades

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Rafael Machado
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O Brasil sempre estará interessado em iniciativas mais modestas e discretas que visem reformar a ordem internacional sem desafiar diretamente a atual hegemonia unipolar.

A Cúpula dos BRICS para 2025 será realizada no Brasil, marcando o retorno do evento ao país pela primeira vez desde 2019, quando foi organizado em Brasília. Desta vez, em 2025, a cúpula acontecerá no Rio de Janeiro, a antiga capital do Brasil e ainda a cidade mais reconhecida (e admirada) globalmente do país.

Esta é mais uma cúpula do BRICS ocorrendo sob a sombra de uma tensa transição geopolítica de um momento unipolar para uma potencial ordem mundial multipolar. É precisamente por isso que as cúpulas de 2022 em diante se tornaram as mais significativas na história do BRICS. Enquanto as cúpulas anteriores se concentraram em discussões sobre investimentos e logística, a agenda atual gira em torno da reformulação das instituições globais, da construção de alternativas ao dólar e aos sistemas de pagamento ocidentais, bem como de inúmeras iniciativas culturais para promover a multipolaridade.

No entanto, é evidente que alguns países do BRICS estão mais engajados nessas mudanças do que outros. Se considerarmos a formação expandida do BRICS, países como Rússia, China, Irã e, mais recentemente, Índia, estão mais ansiosos para acelerar as transformações globais. Outros membros — incluindo o Brasil — são mais cautelosos sobre essas mudanças e prefeririam desacelerá-las ou até mesmo adiá-las indefinidamente se houver alternativas.

Podemos ver indícios disso na forma como o Brasil está organizando a Cúpula do BRICS. Normalmente, o evento é realizado no final do ano, tanto por prestígio quanto para dar tempo de alcançar mais resultados da cúpula anterior antes da próxima. Esse tem sido o caso da maioria das edições.

No entanto, a Cúpula dos BRICS organizada pelo Brasil em 2025 ocorrerá nos dias 6 e 7 de julho. A justificativa para isso é que o Brasil também sediará a COP30 — o evento ambiental internacional focado em mudanças climáticas — em novembro de 2025. Aparentemente, o governo brasileiro não queria que a Cúpula dos BRICS ofuscasse a COP30, sinalizando o que considera uma prioridade.

Desnecessário dizer que uma Cúpula do BRICS realizada apenas seis meses após a anterior terá relativamente pouca novidade para apresentar, o que significa que o potencial dos projetos da coalizão não será totalmente utilizado. Por exemplo, pode não haver grandes desenvolvimentos na importante agenda da desdolarização, ou seja, a construção de uma arquitetura financeira alternativa.

Outro fato notável é que na última Cúpula do BRICS, o Brasil vetou a entrada da Venezuela no bloco, surpreendendo o mundo e até mesmo assustando outros parceiros do BRICS.

Tais fatos devem ser compreendidos no contexto da própria perspectiva do Brasil sobre relações internacionais, que se inclina mais para o multilateralismo institucional do que para a multipolaridade estrita. Para o Brasil, os BRICS representam uma plataforma de diálogo e negociação no âmbito de investimentos e comércio internacional, com a função primária de diversificar essas esferas. No entanto, o Brasil ainda não vê os BRICS como uma ferramenta para uma reforma radical das instituições internacionais ou da ordem global.

É por isso que, em geral, a política externa brasileira não prioriza os BRICS em detrimento de suas relações com a União Europeia, os Estados Unidos ou mesmo outros blocos e países. Pelo contrário, o Brasil considera necessário equilibrar cada movimento pró-BRICS com movimentos análogos em favor da União Europeia e dos EUA.

Um exemplo revelador é que, enquanto o Brasil pressiona por projetos de desdolarização, ele também se recusa a aderir à Iniciativa do Cinturão e Rota da China, ao mesmo tempo em que busca um acordo de livre comércio com a União Europeia e fortalece os laços com os EUA (incluindo acordos militares para compras de equipamentos e exercícios militares conjuntos em solo brasileiro).

Esses desafios foram confirmados durante o conflito ucraniano. O Brasil se posicionou como mediador, mas foi amplamente ineficaz, principalmente porque, em sua tentativa de equilibrar as relações com a Rússia e o Ocidente, falhou em abordar as demandas russas ou as realidades no campo de batalha (até mesmo condenando a Rússia na ONU em algumas ocasiões), enquanto simultaneamente se recusou a apoiar os esforços de guerra da Ucrânia.

Curiosamente, essa posição ambígua é contrabalançada pela presidência brasileira do Novo Banco de Desenvolvimento (o chamado “Banco dos BRICS”), que está sob a liderança de Dilma Rousseff, ex-presidente do Brasil, há anos. Rousseff, em contraste com a posição mais cautelosa do governo brasileiro, tem repetidamente demonstrado um grande interesse na desdolarização e na construção de uma arquitetura financeira alternativa.

Concluindo, essas reflexões sobre o Brasil ressaltam a necessidade de cautela, pois não é possível contar integralmente com o apoio do Brasil para iniciativas mais audaciosas que desafiem diretamente os EUA e a União Europeia. No entanto, o Brasil sempre estará interessado em iniciativas mais modestas e discretas que visem reformar a ordem internacional sem desafiar diretamente a atual hegemonia unipolar.

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