Anualmente, empresas e milionários deixam de recolher cerca
de 10% do PIB nacional em impostos e tributos e aumentam a carga sobre a renda
da classe média e dos mais pobres
por Rodrigo Gomes, da RBA
São Paulo – A sonegação de impostos no Brasil superou R$ 415
bilhões em 2013. O valor corresponde aproximadamente a 10% de toda a riqueza
gerada no país durante o período e é maior que os orçamentos federais de 2014
para as pastas de educação, desenvolvimento social e saúde, somados. Neste ano,
o total de impostos e tributos não recolhidos já se aproxima dos R$ 68 bilhões.
Os dados são do Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda Nacional
(Sinprofaz), que organiza o painel Sonegômetro.
O serviço calcula, a partir de estudos daquela entidade, o
total de impostos e tributos que deveriam, mas não são pagos, por obra das
chamadas pessoas jurídicas, isto é, empresas em geral, de todos os ramos e
tamanhos. Para comparação, o programa social do governo federal Bolsa Família
tem R$ 24 bilhões ao ano para atender 14 milhões de famílias. Portanto, o que
foi sonegado no ano passado equivale a 17 anos do programa.
Ainda segundo o Sinprofaz, a soma dos tributos devidos pelos
brasileiros, constantes na Dívida Ativa da União, ultrapassa R$ 1,3 trilhão,
quase um terço do Produto Interno Bruto (PIB) de 2013 que foi de R$ 4,84
trilhões.
O estudo do sindicato se baseia em dados da Receita Federal,
outras análises específicas sobre cada tributo, para então elaborar uma média
ponderada. Os tributos não pagos são relativos a impostos diretos – aqueles que
não estão embutidos em produtos – como Imposto Sobre Serviços (ISS), Programa
de Integração Social (PIS), Contribuição para Financiamento da Seguridade Social
(Cofins), por exemplo. E escancaram a diferença com que o sistema tributário
brasileiro atua sobre ricos e pobres.
“Eles são sonegados pelos muitos ricos e por pessoas
jurídicas (empresas, indústrias), com mecanismos sofisticados de lavagem de
dinheiro e de caixa dois”, afirmou o presidente do Sinprofaz, Heráclio Mendes
de Camargo Neto, que é advogado e mestre em Direito.
A sonegação gigantesca, diz Camargo Neto, impõe a
necessidade de tributar pesadamente o consumo, onde não é possível sonegar.
"É injusto que todo paguem uma carga em tributos indiretos. E o povo paga
muito. Mesmo que você seja isento do Imposto de Renda, vai gastar cerca de 49%
do salário em tributos, mas quase tudo no supermercado, na farmácia",
explica.
Outra injustiça está na forma como incide o Imposto de
Renda. Quanto mais o contribuinte tem a declarar, maiores são as possibilidades
de abater valores. "Os mais ricos podem abater certos gastos no Imposto de
Renda. Em saúde, por exemplo, se você tem um plano privado um pouco melhor,
você pode declará-lo e vai ter um abatimento (no cálculo final do imposto).
Esta é uma característica injusta do nosso sistema. Os mais pobres não
conseguem ter esse favor."
No entanto, continua o advogado, quem tem salários a partir
de R$ 2.400 é tributado automaticamente pelo Imposto de Renda Retido na Fonte e
muitas vezes não tem como reaver parte deste valor.
Em 2005, o Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário e
a Associação Comercial de São Paulo criaram o impostômetro, cuja versão física
está instalada no Pátio do Colégio, região central da capital paulista. O
objetivo, ao mostrar o tamanho da arrecadação do poder público, é justamente
debater a carga tributária do país, com vistas à redução de impostos e à
reforma tributária.
Logicamente, os valores registrados pelo impostômetro (R$
313 bilhões este ano, até o fechamento desta matéria) são superiores aos do sonegômetro
(R$ 68 bilhões), caso contrário nem sequer haveria dinheiro para manter o
funcionamento da maquina pública.
No entanto, alerta Camargo Neto, se o governo brasileiro
efetivasse a cobrança deste valor sonegado, já seria possível equalizar melhor os
impostos no país. “Se nós conseguirmos cobrar essas grandes empresas e pessoas
físicas muito ricas, o governo poderia desonerar a classe média e os mais
pobres. Seria o mais justo. Se todos pagassem o que devem, nós poderíamos
corrigir a tabela do Imposto de Renda (que incide sobre os salários) e reduzir
alíquotas sobre alimentos e produtos de primeira necessidade, que todo mundo
usa”, defende.
Desigual
Detalhando-se a carga tributária brasileira pelas principais
fontes, percebe-se que os tributos sobre bens e serviços, que afetam sobretudo
os mais pobres, respondem por quase metade do total (49,22%). Em seguida vêm os
tributos sobre a folha de salários (25,76%) e sobre a renda (19,02%). Somados,
eles respondem por 94% da carga tributária total. Para o procurador, existe uma
“escolha política” em não atuar na cobrança dos mais ricos e manter a situação
como está.
Uma demanda urgente, segundo o procurador, é uma reforma
tributária, que incida sobre o capital e deixe de onerar os trabalhadores. “É
preciso um avanço maior da tributação sobre a riqueza. Veja os lucros
astronômicos dos bancos, por exemplo. Por que o Banco do Brasil precisa lucrar
R$ 12 bilhões e não pode ser tributado sobre metade disso? Essa é uma escolha
política da sociedade. Imagine bilhões de cada um dos grandes bancos, o quanto
você poderia desonerar os produtos de primeira necessidade?”, questiona.
Camargo Neto aponta ainda que a sonegação é maior por conta
da precariedade estrutural em que a própria Procuradoria da Fazenda Nacional,
responsável pela fiscalização sobre os tributos, se encontra. Ele conta que
existem 300 vagas de procurador abertas há pelo menos seis anos esperando serem
preenchidas.
"Nós não temos carreira de apoio, por exemplo. Há menos
de um servidor de apoio para cada procurador. Os juízes, por exemplo, têm de 15
a 20 servidores de apoio. Nós temos 6,8 milhões de processos para cobrar e
quase nenhum auxílio", denuncia.
Para completar, a sonegação de impostos prescreve em cinco
anos, o que aprofunda o favorecimento dos sonegadores e sonegadoras. "É
muito fácil se livrar com todas essas condições", lamenta.
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