BRENO ALTMAN - http://www.brasil247.com/
Dificilmente chegará a 2% o total
de votos dos candidatos a presidente do PSOL, PSTU, PCB e PCO. Mas não é apenas
a influência eleitoral desses partidos que é pífia. Também são forças de pouca
envergadura no movimento sindical, estudantil e camponês. Não passam de franjas
isoladas na intelectualidade. Apesar de tentarem se integrar às manifestações
de junho do ano passado, não tiveram papel de relevo e tampouco se constituíram
em referência para as massas juvenis que ocuparam as ruas.
Diversos motivos poderiam ser
identificados para desempenho tão marginal. Há interpretações sociológicas e
políticas de todos os gostos para ajudar a compreender essa fragilidade. Creio
que existe, no entanto, ao menos entre seus militantes de boa fé, uma razão de
fundo para tamanho isolamento: a política de todas essas correntes é baseada na
ideia de hipotética traição do PT ao programa de esquerda e aos interesses
populares.
De acordo com esta interpretação,
teria ocorrido fenômeno semelhante ao que se passou com a social-democracia
européia. O partido de Lula teria assumido o mesmo programa neoliberal do
capital financeiro, transitado de armas e bagagens para o campo da burguesia
rentista e renunciado à construção de um projeto independente dos trabalhadores.
Segundo esse raciocínio, ainda que haja diferenças táticas, o PT e os demais
partidos burgueses seriam farinha do mesmo saco.
Esta posição empurra facilmente
setores da ultra-esquerda para assumir o discurso falsamente moralista da
direita contra o PT e até se alinhar com o conservadorismo quando se trata de
fazer oposição ao governo petista.
A absoluta falta de audiência
popular à sua narrativa poderia levar estas correntes a refletir sobre a
justeza ou não de sua política, mas não o fazem. Prevalecem o dogmatismo, o
rancor de ex-petistas e a origem de classe: afinal, a maioria esmagadora de
seus quadros tem origem nas camadas médias, onde viceja ambiente generalizado
de ódio e desconfiança contra o PT.
O erro fundamental de sua análise
consiste em não compreender que a natureza petista e seu papel concreto nada
tem a ver com a social-democracia dos dias atuais. Ainda que se possa criticar
os governos de Lula e Dilma pela eventual opção por um reformismo fraco, no
dizer de André Singer, o fato é que se constituíram em ferramentas de
resistência ao neoliberalismo em todos os terrenos.
Estes últimos doze anos foram
marcados pela expansão dos gastos públicos, pela adoção de políticas
distributivistas, pela ampliação de direitos sociais, pelo aumento do emprego e
da renda dos trabalhadores. O Estado está sendo paulatinamente reconstruído
como epicentro de um modelo econômico que associa desenvolvimento e criação de
um mercado interno de massas, através de mecanismos para a inclusão social. No
mais, o país impulsiona política internacional contra-hegemônica e de apoio à
integração de blocos que se separam do campo de gravidade do imperialismo
norte-americano.
Como se pode ver, pela realidade
dos fatos, um caminho absolutamente distinto da social-democracia européia. Não
apenas por questões programáticas, mas também pela posição na luta de classes:
não é à toa o esforço beligerante do núcleo dirigente da burguesia para
derrotar o PT a qualquer preço, aceitando até o risco de inflar uma candidatura
de oportunidade como a de Marina Silva.
Há espaço, à esquerda do PT, para
forças que pressionem pelo aprofundamento e a aceleração de reformas, buscando
forjar um bloco histórico que mude a qualidade do processo de mudanças. Mas
essa orientação é impossível para quem vê no PT o inimigo principal ou como
integrante do campo político e classista da burguesia. Essa postura
visceralmente antipetista não provoca apenas isolamento dentro da esquerda, mas
também tornam inacessíveis os corações e mentes das dezenas de milhões de
trabalhadores, de pobres do campo e da cidade, cuja vida melhorou
admiravelmente desde a posse de Lula em 2003.
Por fim, a insistência nessa
política sectária faz da ultra-esquerda um aliado objetivo das forças
reacionárias nos momentos de grande polarização e disputa. O caso mais
emblemático foi o processo do chamado "mensalão", mas muitos foram os
episódios políticos e eleitorais nos quais essa lógica se reproduziu. Afinal,
se o governo é do PT e esse partido passou para o outro lado, transformado em
instrumento da dominação burguesa, contra essa administração deve ser a direção
do golpe principal.
Trata-se da fórmula perfeita para
a irrelevância e a residualidade.
Breno Altman
Breno Altman é diretor do
site Opera Mundi e da revista Samuel
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