Em conversa privada registrada em
áudio, um diretor do banco disse que o tamanho do HSBC torna violações
regulatórias praticamente inevitáveis.
Harry Davies e James Bola, do The Guardian / http://cartamaior.com.br/
Um executivo sênior do HSBC
admitiu reservadamente que certamente ocorrerão no banco outras falhas graves
de regulamentação no futuro, apesar dos esforços em várias frentes em
regularizar as operações em todo o mundo.
Os comentários do diretor mundial
de sanções do HSBC Lee Hale contrastam com as declarações públicas da
direção-executiva do HSBC de que o banco mudou suas práticas após os recentes
escândalos. Em conversa gravada, Hale afirmou que ainda há lacunas nas
políticas de controle interno do banco e no rastreamento de algumas transações
financeiras.
Stuart Gulliver,
diretor-executivo do HSBC desde 2011, e Rona Fairhead, diretora do HSBC América
do Norte, asseguraram diversas vezes diante do Parlamento do Reino Unido que o
banco é hoje completamente diferente de quando sua filial suíça facilitou a
evasão fiscal em grande escala, ou quando sua filial mexicana foi considerada
pelas autoridades norte-americanas cúmplice de um esquema multimilionário de
lavagem de dinheiro para cartéis de drogas.
"Foram feitas reformas
radicais e profundas em termos de endurecimento das regras no HSBC e de
simplificação do negócio, de acordo com os mais altos padrões de controle de
lavagem de dinheiro, de informações sobre os nossos clientes e de transparência
fiscal", afirmou Gulliver na Comissão de contas públicas da Câmara dos
Comuns, em fevereiro.
Mas uma gravação, ouvida pelo
Guardian, de uma reunião confidencial realizada há não mais de três meses,
revela que Lee Hale descreveu um quadro muito mais complexo dos esforços do
banco em adequar seus procedimentos àquilo que as autoridades esperam.
Em um comunicado, o HSBC disse
não reconhecer os comentários feitos na gravação, e que esta estaria fora de
contexto. O banco não foi capaz de dar exemplos específicos de nenhuma
imprecisão até o momento da publicação.
A gravação registra Hale em
reunião com os advogados independentes que monitoravam o HSBC como parte de um
polêmico acordo feito em 2012 com o Departamento de Justiça dos Estados Unidos.
Com o acordo, o banco evitou um processo por descumprimento de sanções e
lavagem de dinheiro em sua filial mexicana mediante uma multa de 1,9 bilhão de
dólares e um programa de monitoramento regulatório adicional por cinco anos. O
acordo foi assinado pela então procuradora do o Distrito Leste de Nova York,
Loretta Lynch, hoje indicada por Barack Obama para o cargo de Procuradora geral
dos EUA.
Durante o encontro, que durou
várias horas, Hale destacou os avanços obtidos pelo banco na atualização de
seus procedimentos de conformidade e no fortalecimento da transparência e de
seus controles financeiros em diversas áreas de suas operações globais.
Ele afirmou aos monitores que o
tamanho do banco torna virtualmente inevitáveis as violações regulatórias em
grande escala, confessando ainda não estar "confortável" com a adesão
a certas normas referentes a algumas áreas significativas de suas operações.
Durante um longo diálogo sobre a
nova política de sanções e violações internas de regras do HSBC, Hale disse ao
regulador que "dada a dimensão e escala do HSBC", em sua opinião,
"é certo que vai acontecer, em algum momento futuro teremos alguma grande
violação, alguma violação da regulamentação".
E acrescentou: "Espero que
isso não aconteça, mas é provável".
Pressionado por reguladores e
investidores, Gulliver tem repetido que o HSBC não é grande demais para ser
gerenciado. A pressão foi agravada pelas revelações de irregularidades na
filial suíça, tornadas públicas pelo Consórcio Internacional de Jornalistas
Investigativos, pelo Guardian, Le Monde e outros.
Gulliver afirma ter tornado mais
rigorosa a gestão interna no banco, abandonando a estrutura federativa
anterior, em que as operações de cada país tinham significativa autonomia.
No entanto, Hale sugere em sua
conversa com o monitor que o fato de as operações do HSBC se estenderem por 70
países ainda era um fator de complicação no trabalho dos 7.000 membros da
equipe de compliance do banco.
"É preciso reconhecer que é
difícil para nós, como empresa. Operamos em mais de 70 países e visitamos
alguns países, em 2014, em que não foi possível implementar o programa",
disse.
Perguntado se havia previsto as
amplas violações no sistema de governança do banco, Hale disse que havia
"algumas categorias", em que sua equipe se questionava se a política
existente era suficiente e se o banco estava fazendo o suficiente. Ele
observou, no entanto, que seria exagero afirmar que tinha certeza da existência
de graves violações.
Pressionado pelos monitores a dar
mais detalhes, Hale identificou a triagem de doações de caridade como uma área
de preocupação para a sua equipe. "Este seria um exemplo de onde não estou
totalmente confortável sobre termos feito o suficiente", admitiu. Ele não
deu outros exemplos.
O executivo britânico também
destacou o "processo doloroso" de melhoria dos padrões de gestão
realizado pelo grupo financeiro para garantir a conformidade com as políticas
de sanções – uma das principais causas da multa recorde imposta pela Justiça
americana ao HSBC.
Ele afirmou que sua equipe
acumulou mais de 90 pedidos de isenção – pedidos formais para executar uma ação
que estaria fora das normas do HSBC – que ele se recusou a assinar por não
estarem, no seu ponto de vista, suficientemente justificados.
Sobre a dificuldade de revisão
das normas de sanções do banco, Hale disse que a equipe HSBC não estava
habituada a proporcionar o nível de detalhamento requerido para a autorização
de isenções. "Acho que é realmente a primeira vez que procuramos fazer
isso com o rigor adequado... as primeiras requisições não tinham grande
qualidade."
Os observadores devem apresentar
anualmente um extenso relatório ao Departamento de Justiça americano que, por
sua vez, elabora um resumo para um tribunal de Nova York. Quando o acordo foi
assinado, em dezembro de 2012, o chefe da divisão criminal do Departamento de
Justiça disse que o HSBC estaria com a "espada de Dâmocles" sobre a
cabeça se não cumprisse seus compromissos.
Apresentado na última
quarta-feira, o último relatório afirma que o HSBC fez progressos e está
"mais bem protegido contra crimes financeiros e mais apto a
detectá-los", elogiando ainda os esforços da direção executiva e da equipe
de compliance.
O relatório também registra, no
entanto, preocupações com o HSBC, inclusive em relação à sua cultura
corporativa, afirmando: "Algumas das deficiências culturais históricas do
Grupo HSBC continuam a permear suas operações hoje". A equipe sênior da
divisão americana de investimentos do banco foi especialmente criticada.
É provável que tal crítica à
cultura do HSBC desaponte a diretora do banco na América do Norte, Fairhead,
que presidiu o comitê de auditoria durante vários dos famosos episódios de
falhas éticas do banco, além de atuar como presidente do BBC Trust e ter uma
função não executiva na PepsiCo.
Fairhead havia dito à Comissão de
contas públicas que sua abordagem no processo de auditoria se apoiara
substancialmente "na cultura do HSBC, considerada de grande
integridade", o que logo se mostrou inadequado. Fairhead disse que,
posteriormente, ajudou a conduzir programas de reformas.
As conversas gravadas também
abordaram problemas da equipe de compliance da filial norte-americana. Hale
disse: "A equipe de auditoria interna fez uma avaliação da divisão dos EUA
e o que encontraram não é nada bom". Os resultados, de acordo com Hale,
levaram o banco a romper o contrato com um dos altos executivos de compliance
do banco em Nova York, um ex-funcionário do Tesouro americano.
Em 2012, um relatório do Senado
americano observou que a alta rotatividade de pessoal da área de controles
internos na subsidiária norte-americana tornava difícil a implementação de
reformas.
Em um comunicado, o HSBC afirmou
não reconhecer as informações do Guardian, e que estava em conformidade com o
acordo feito com a Justiça americana.
“Nós não reconhecemos os
comentários apresentados pelo Guardian, que contêm imprecisões e foram tirados
do contexto", diz o texto. "O Departamento de Justiça dos EUA
reconheceu que o HSBC tem feito progresso no sentido de cumprir os mais rigorosos
padrões de conformidade impostos até hoje a uma instituição financeira global.
Continuamos a cumprir todas as nossas obrigações estabelecidas no acordo”.
Tradução de Clarisse Meireles
Créditos da foto: Gyver Chang /
Flickr
Nenhum comentário:
Postar um comentário
12