Para ele, muitos eruditos lêem tanto que se tornam burros
Schopenhauer
era tão pessimista que dizia o seguinte: “A pior coisa que pode acontecer a
alguém é nascer”. Seu pessimismo derivou
da grande influência exercida nele pelas filosofias orientais. Para o budismo,
por exemplo, a vida é, numa palavra, sofrimento. Concordo. Mas chamei
Schopenhauer por outro motivo: falar sobre a arte de ler e escrever, tema de um
ensaio que no Brasil foi publicado pela LPM numa edição de bolso. É mais um capítulo
de nossas Conversas com Escritores Mortos.
Herr
Schopenhauer, como o senhor divide as pessoas que escrevem?
Há
três tipos de autores. Em primeiro lugar, aqueles que escrevem ser pensar.
Escrevem a partir da memória, de reminiscências, ou diretamente a partir de
livros alheios. Essa classe é a mais numerosa. Em segundo lugar, há os que
pensam enquanto escrevem. Eles pensam justamente para escrever. São bastante
numerosos. Em terceiro lugar, há os que pensaram antes de escrever – e eles são
raros.
Na
internet, muita gente escreve insultos sob pseudônimos. O que o pensa disso?
Parafraseio
Riemer em seu livro sobre Goethe. Um adversário que exibe a cara abertamente é
uma pessoa honrada, moderada, com a qual é possível se entender, chegar a um
acordo e mesmo a uma reconciliação. Em compensação, um adversário escondido é
um patife covarde e infame, que não tem coragem de assumir seus pensamentos,
portanto alguém que não defende sua opinião – e só se interessa pelo prazer
secreto que sente em descarregar sua ira sem ser conhecido e não sofrer
retaliações.
O
que o senhor acha de quem imita o estilo de outro?
O
estilo é a fisionomia do espírito. Imitar o estilo alheio significa usar uma
máscara. Por mais bela que esta seja, torna-se pouco depois insípida e
insuportável porque não tem vida, de modo que mesmo o rosto vivo mais feio é
melhor que ela.
Algumas
pessoas gostam de escrever com pompa. O que o senhor pensa disso?
Não
há nada mais fácil, do que escrever de maneira que ninguém entenda. Em
compensação, nada é mais difícil que expressar pensamentos significativos de
modo que todos os compreendam.
Voltaire
disse: “Todo adjetivo é inimigo do substantivo”. Ele estava criticando a
prolixidade. Como o senhor vê isso?
Muita
gente procura esconder sua pobreza de pensamento sob uma profusão de palavras –
e, por isso, deve-se evitar toda prolixidade. É preciso ser econômico com o
tempo, a paciência e a dedicação do leitor. É sempre melhor deixar de lado algo
bom do que incluir algo insignificante.
O
senhor poderia falar um pouco mais sobre isso?
Usar
muitas palavras para comunicar poucos pensamentos é sempre sinal inconfundível
de mediocridade. Em contrapartida, o sinal de uma cabeça eminente é resumir
muitos pensamentos em poucas palavras.
Ler
muito ajuda?
Quem
lê muito e quase o dia todo, mas nos intervalos passa o tempo sem pensar nada,
perde gradativamente a capacidade de pensar por si próprio – como alguém que,
de tanto cavalgar, desaprendesse caminhar. Este é o caso de muitos eruditos:
leram até ficarem burros.
O
senhor entende que devemos ser muito seletivos no que lemos?
Sim.
A vida é curta, o tempo e a energia são limitados.
Muitas
pessoas compram mais livros do que conseguem ler. Alguma recomendação?
Seria
bom comprar livros se, ao mesmo tempo, comprássemos o tempo para lê-los, mas é
comum confundir a compra de livros com a assimilação de seu conteúdo.
Herr
Schopenhauer? Dank und applaus. Clap, clap, clap.
O jornalista Paulo Nogueira é fundador e diretor editorial do site de notícias e análises Diário do Centro do Mundo.
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