A insubordinação da vaca que escapou do abate serve
para ilustrar a independência do povo grego, que se negou a embarcar na canoa
da austeridade
Michel
Plon, de Paris / www.cartamaior.com.br
O fato talvez tenha escapado à sagacidade dos
jornalistas brasileiros. O ocorrido até chamou a atenção de alguns jornalistas
franceses, que no entanto não enxergaram a metáfora do que está acontecendo na
Europa!
Primeiro vamos à história, quase uma anedota.
Marguerite é uma jovem vaca de três anos, a idade de ir para o abate e
abastecer as geladeiras dos açougues e dos supermercados em cortes
padronizados, segundo as normas europeias, como bifes e outras peças de carne
bovina. Mas adivinhem só! Na hora de entrar no caminhão que a levaria ao local
de sua execução, Marguerite se revoltou! Saiu correndo pelo campo e cruzou
estradas até se refugiar em uma carpintaria, onde foi capturada e anestesiada
em seguida por um veterinário. Resultado da operação: por causa das substâncias
injetadas, a carne de Marguerite está
imprópria para consumo por 30 dias e Marguerite está... salva! Poderá seguir
sua vida de vida de vaca independente por algum tempo, uma vez que ninguém pode
prever o futuro dela – ou o nosso.
A insubordinação e a rebelião de Marguerite me
parecem ilustrar o que vem acontecendo entre a Grécia e a Europa nos últimos
quatro meses. Os cidadãos gregos, demonstrando toda sua independência,
recusaram-se a embarcar na canoa do FMI, do Banco Mundial e outras instituições
que insistem em impôr-lhes as normas da economia neoliberal, privatizações,
cortes nas aposentadorias, aumento das horas de trabalho e todo o conhecido
corolário! Os gregos elegeram um governo rebelde a essas normas, e os jovens
líderes eleitos, tão talentosos quanto corajosos, abandonaram a gravata de
praxe nas salas de reunião de Bruxelas, da mesma forma como Marguerite recusou
o cabresto que queriam pôr no seu pescoço.
O problema é que a Europa da senhora Merkel, dos
Senhores Hollande, Junker e outros, não encontrou ainda nem o veterinário nem a
substância capazes de transformar os "adolescentes rebeldes" que não
sossegam em suas cadeiras em "adultos" – segundo as palavras da cara
senhora Lagarde, que vela pelos preciosos interesses do FMI – capazes de
perceber que se trata da segurança dos dividendos e do mercado de ações,
considerados mais importantes que aposentadorias, a saúde e a educação dos
gregos e de seus filhos!
E então? É claro que devemos salvar Marguerite, mas
é ainda mais necessário salvar a Grécia, liberá-la de sua suposta dívida,
construção tão falsa como, há alguns anos, foram as armas de destruição em
massa no Iraque.
Enviemos todos uma foto de Marguerite aos líderes
europeus e à Madame Lagarde, que poderá enxergar nela, quem sabe, sua juventude
perdida!
Tradução de Clarisse Meireles
Créditos da foto: Steven Zolneczko / Flickr
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