A revista Época tirou do seu site
um artigo em que contava como, no final de sua presidência, FHC ‘passou o chapéu’
para recolher recursos para montar seu instituto.
O Google guardou uma foto do
texto. Quem procura a matéria no Google encontra essa cópia fotográfica.
O Google explica que o dono do conteúdo
pode pedir para remover o texto caso queira, mas até aqui a Época não se mexeu.
Abaixo segue a reportagem,
copiada e colada:
FHC passa o chapéu
Presidente reúne empresários e
levanta R$ 7 milhões para ONG que bancará palestras e viagens ao Exterior em
sua aposentadoria
Gerson Camarotti
Foi uma noite de gala. Na
segunda-feira, o presidente Fernando Henrique Cardoso reuniu 12 dos maiores
empresários do país para um jantar no Palácio da Alvorada, regado a vinho
francês Château Pavie, de Saint Émilion (US$ 150 a garrafa, nos restaurantes de
Brasília). Durante as quase três horas em que saborearam o cardápio preparado
pela chef Roberta Sudbrack – ravióli de aspargos, seguido de foie gras, perdiz
acompanhada de penne e alcachofra e rabanada de frutas vermelhas -, FHC
aproveitou para passar o chapéu. Após uma rápida discussão sobre valores, os 12
comensais do presidente se comprometeram a fazer uma doação conjunta de R$ 7
milhões à ONG que Fernando Henrique Cardoso passará a presidir assim que deixar
o Planalto em janeiro e levará seu nome: Instituto Fernando Henrique Cardoso
(IFHC).
O dinheiro fará parte de um fundo
que financiará palestras, cursos, viagens ao Exterior do futuro ex-presidente e
servirá também para trazer ao Brasil convidados estrangeiros ilustres. O
instituto seguirá o modelo da ONG criada pelo ex-presidente americano Bill
Clinton. Os empresários foram selecionados pelo velho e leal amigo, Jovelino
Mineiro, sócio dos filhos do presidente na fazenda de Buritis, em Minas Gerais,
e boa parte deles termina a era FHC melhor do que começou. Entre outros,
estavam lá Jorge Gerdau (Grupo Gerdau), David Feffer (Suzano), Emílio Odebrecht
(Odebrecht), Luiz Nascimento (Camargo Corrêa), Pedro Piva (Klabin), Lázaro
Brandão e Márcio Cypriano (Bradesco), Benjamin Steinbruch (CSN), Kati de
Almeida Braga (Icatu), Ricardo do Espírito Santo (grupo Espírito Santo). Em
troca da doação, cada um dos convidados terá o título de co-fundador do IFHC.
Antes do jantar, as doações foram
tratadas de forma tão sigilosa que vários dos empresários presentes só ficaram
conhecendo todos os integrantes do seleto grupo de co-fundadores do IFHC
naquela noite. Juntos, eles já haviam colaborado antes com R$ 1,2 milhão para a
aquisição do imóvel onde será instalada a sede da ONG, um andar inteiro do
Edifício Esplanada, no Centro de São Paulo. Com área de 1.600 metros quadrados,
o local abriga há cinco décadas a sede do Automóvel Clube de São Paulo.
O jantar, iniciado às 20 horas,
foi dividido em dois momentos. Um mais descontraído, em que Fernando Henrique
relatou aos convidados detalhes da transição com o presidente eleito, Luiz
Inácio Lula da Silva. Na segunda parte, o assunto foi mais privado. Fernando
Henrique fez questão de explicar como funcionará seu instituto. Segundo o presidente,
o IFHC terá um conselho deliberativo e o fundo servirá para a administração das
finanças. Além das atividades como palestras e eventos, o presidente explicou
que o instituto vai abrigar todo o arquivo e a memória dos oito anos de sua
passagem pela Presidência.
A iniciativa de propor a doação
partiu do fazendeiro Jovelino Mineiro. Ele sugeriu a criação de um fundo de R$
5 milhões. Só para a reforma do local, explicou Jovelino, será necessário pelo
menos R$ 1,5 milhão. A concordância com o valor foi quase unânime. A exceção
foi Kati de Almeida Braga, conhecida como a mais tucana dos banqueiros quando
era dona do Icatu. Ela queria aumentar o valor da ajuda a FHC. Amiga do
marqueiteiro Nizan Guanaes, Kati participou da coleta de fundos para a campanha
da reeleição de FHC em 1998 – ela própria contribuiu com R$ 518 mil. “Esse
valor é baixo. O fundo poderia ser de R$ 10 milhões”, propôs Kati, para espanto
de alguns dos presentes. Depois de uma discreta reação, os convidados bateram o
martelo na criação de fundo de R$ 7 milhões, o que levará cada empresário a
desembolsar R$ 500 mil. Para aliviar as despesas, Jovelino ainda sugeriu que
cada um dos 12 presentes convidasse mais dois parceiros para a divisão dos
custos, o que pode elevar para 36 empresários o número total de empreendedores
no IFHC.
Diante de uma platéia tão
requintada, FHC tratou de exercitar seus melhores dotes de encantador de
serpentes. “O presidente estava numa noite inspirada. Extremamente sedutor”,
observou um dos presentes. Outro empresário percebeu a euforia com que Fernando
Henrique se referia ao presidente eleito, Lula da Silva. “Só citou Serra uma
única vez. Mas falou tanto em Lula que deu a impressão de que votou no
petista”, comentou o convidado. O presidente exagerou nos elogios a Lula da
Silva. Revelou que deixaria a Granja do Torto à disposição do presidente
eleito. “Ele merece”, justificou. “A transição no Brasil é um exemplo para o
mundo.” Em seguida, contou um episódio ocorrido há quatro anos, quando recebeu
Lula no Alvorada, depois de derrotá-lo na eleição de 1998. O presidente disse
que na ocasião levou Lula para uma visita aos aposentos presidenciais,
inclusive ao banheiro, e comentou com o petista: “Um dia você ainda vai morar
aqui”.
Na conversa, Fernando Henrique
ainda relatou que vai tentar influir na nomeação de alguns embaixadores, em
especial na do ministro do Desenvolvimento, Sérgio Amaral, para a ONU. Antes de
terminar o jantar, o presidente disse que passaria três meses no Exterior e só
voltaria para o Brasil em abril. Também revelou que pretende ter uma base em
Paris. “Nada mal!”, exclamou. Ao acabar a sobremesa, um dos convidados
perguntou se ele seria candidato em 2006. FHC não respondeu. Mas deu boas
risadas. Para todos os presentes, ficou a certeza de que o tucano deseja voltar
a morar no Alvorada, projeto que FHC desmente em conversas mais formais.
Embora a convocação de
empresários para doar dinheiro a uma ONG pessoal possa levantar dúvidas do
ponto de vista ético, a iniciativa do presidente não caracteriza uma infração
legal. “Fernando Henrique está tratando de seu futuro, e não de seu presente”,
diz o procurador da República Rodrigo Janot. “O problema seria se o presidente
tivesse chamado empresários ao Palácio da Alvorada para pedir doações em troca
de favores e benefícios concedidos pelo atual governo.”
O IFHC não será o primeiro no
país a se dedicar à memória de um ex-presidente. O senador José Sarney
(PMDB-AP) criou a Fundação Memória Republicana para abrigar os arquivos dos
cinco anos de seu governo. Conhecida hoje como Memorial José Sarney, a entidade
está sediada no Convento das Mercês, um edifício do século XVII, em São Luís,
no Maranhão. Pelo estatuto, é uma fundação cultural, sem fins lucrativos. Mas
também já foi alvo de muita polêmica. Em 1992, Sarney aprovou no Congresso uma
emenda ao Orçamento que destinou o equivalente a US$ 153 mil para seu memorial.
Do total, o ex-presidente conseguiu liberar cerca de US$ 55 mil.
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