Em
entrevista, o engenheiro e mestre em Finanças Públicas pela Eaesp/FGV,
ex-secretário de Finanças da Prefeitura de São Paulo (1989-1992) e consultor na
área fiscal, orçamentária e tributária Amir Khair analisa a política econômica
dos últimos vinte anos e critica o ajuste fiscal e a taxa básica de juros
por
Silvio Caccia Bava / http://www.diplomatique.org.br/
DIPLOMATIQUE–O
ajuste era necessário? Nós estamos falando de cortes no orçamento público de
bilhões de reais neste ano – cortes na Previdência, na saúde, na educação. É
tudo isso que precisa cortar nas despesas públicas?
AMIR
KHAIR –A preocupação é que as contas públicas passem a ter um melhor equilíbrio
econômico e não elevem a dívida bruta do país, pois o Brasil, diferentemente de
outros, tem uma taxa de juros incidindo sobre essa dívida, que se transforma em
despesa.
Quando
se fala em ajuste, só se considera uma economia nas despesas no governo
federal, que é onde alcançam as medidas de cortes, e de alguma forma também os
tributos na esfera federal. Esse é o superávit primário. Ignora-se a questão
dos juros.
Em
2005, tivemos o melhor superávit primário da década, chegando a 3,9% do PIB,
mas tivemos uma conta de juros muito alta e o resultado foi um déficit de 3,2%
do PIB.
O
que é resultado primário?
Você
soma toda a arrecadação do setor público, União, estados e municípios, vê as
despesas que eles têm e soma tudo. Se você excluir dessa despesa e dessa
receita a conta financeira, que são juros ou receitas financeiras, você terá o
resultado primário. Quando você considera também as despesas com juros e
receitas financeiras, você tem o resultado final das contas públicas. Esse é o
principal indicador observado no mundo por todas as instituições, as agências
de classificação de risco, o Fundo Monetário, o Banco Mundial, o Banco
Interamericano de Desenvolvimento etc. O que importa não é o superávit primário,
é o resultado final das contas públicas e o seu irmão gêmeo, que é o estoque da
dívida bruta na relação com o PIB.
Com
um resultado primário fraquíssimo – como se viu em 2005 –, mas juros baixos, o
resultado foi um déficit de 2,4% do PIB neste ano, melhor que o de 2005. Não
tem sentido falar de finanças públicas olhando exclusivamente um resultado
primário, é importante você considerar o resultado primário, os juros e ver o
resultado final. É este que altera a relação dívida-PIB, e não o superávit primário
nem os juros isoladamente.
O
debate da questão fiscal no Brasil está interditado quando se coloca a questão
dos juros. Dificilmente você vai observar qualquer órgão de imprensa, sejam
revistas especializadas, sejam análises de pessoas consideradas especialistas,
falar de juros. Eles passam ao largo porque o comando teórico, para dar as
linhas fiscais, é dado pelos grandes bancos.
Bom,
mas você não falou se era necessário o ajuste...
Eu
acho que você tem de procurar certo equilíbrio entre receitas e despesas por
uma razão simples. Toda vez que se tem mais despesa do que receita, a política
do governo é emitir títulos para cobrir a diferença, e, quando se faz isso,
aumenta-se a despesa com juros, que é o que está acontecendo.
Agora,
em pleno chamado ajuste, por meio do qual o governo está lutando por um
superávit primário de 1,2% do PIB, a conta de juros vai para 7,5% do PIB,
porque o Banco Central continua elevando a Selic, elevando a taxa de juros que
incide sobre a dívida.
Esses
cortes resolvem a questão do equilíbrio entre receita e despesas públicas com o
aumento da Selic e dos juros?
Não.
Vai dar um estouro nas contas públicas facílimo de prever, isso se houver
sucesso em alcançar 1,2% do PIB com o ajuste. Mesmo sobre isso há muita dúvida.
Uma continha simples vai mostrar isso. Se o pagamento dos juros da dívida for
de 7,5% do PIB – e é o que se espera – e o superávit primário for de 1,2%, isso
no mínimo vai dar 6,3% de déficit. Um déficit de 6,3% eleva a relação dívida bruta-PIB
cinco pontos para cima, e é esse indicador que todos analisam.
Eu
acho que se escolheu um caminho difícil politicamente, porque são cortes de
dois tipos: em despesas que caem em cima dos trabalhadores, uma redução em
alguns direitos, talvez haja abusos, mas você está reduzindo direitos; e corte
nas desonerações, isto é, isenção de impostos dada a empresas. A revogação
dessas isenções gera uma grita muito forte de gente que tem influência sobre o
Congresso, porque há vários empresários que estão se beneficiando das
desonerações e financiaram campanhas eleitorais, tendo seus deputados para
defender seus interesses.
Há
uma estimativa do custo da desoneração da ordem de R$ 100 bilhões no ano
passado...
Sim,
é possível. Eu não conheço o número exato, mas é um número pesado, muito
pesado. Isso foi feito de maneira atabalhoada e a conta das desonerações caiu
nos ombros da Previdência Social. É a cota patronal de 20% da folha de
pagamento das empresas que foi zerada e as empresas passaram a pagar entre 1% e
2% do faturamento. Aqueles setores que tinham mais folha de pagamento do que
faturamento saíram muito beneficiados, pois essa turma não devolveu isso com
redução de preço, nada disso, melhoraram a margem deles. Se o governo queria
fortalecer essas empresas, ele fortaleceu de fato, não há dúvida, mas foi o
preço pago para manter um câmbio artificial.
O
que o câmbio tem a ver com isso?
Uma
empresa que está aqui concorre não apenas com as empresas brasileiras que estão
aqui, ou empresas sediadas aqui, ela está concorrendo com todas as empresas do
mundo, e há desde 2008 uma guerra terrível de preços por questões de paralisia
ou de mercados que estão andando de lado. Estados Unidos, Europa e Japão, essa
turma entrou fortemente na disputa internacional para a colocação de seus
produtos e está invadindo tudo. Quando você tem um câmbio fora de lugar, que é
o que ocorre no Brasil há muitos anos, desde Fernando Henrique, lá no Plano
Real, você cria uma situação de dificuldade de competição interna aqui no Brasil
e principalmente uma dificuldade de competição externa nas exportações.
O
governo controla o câmbio?
O
governo controla o câmbio e é uma falsidade dizer que o câmbio é flutuante,
aliás, no mundo todo o câmbio é muito mais administrado do que flutuante. Com o
aumento da Selic, o governo atrai dólares e sua abundância força o preço para
baixo. Hoje o Brasil está inundado de dólares; deve haver uns US$ 300 bilhões
aplicados em curtíssimo prazo. E o Banco Central, nos últimos treze, catorze
meses, emitiu swapscambiais da ordem de US$ 114 bilhões para manter o real
apreciado, porque, segundo sua visão, só resta ao Banco Central controlar a
inflação por meio do câmbio, que facilita a penetração do produto importado.
Qual
é a parte que os mais ricos e as grandes empresas estão pagando nesse ajuste?
Ainda
não aconteceu nenhuma sobrecarga em cima dessas grandes empresas; elas
continuam tendo financiamento do BNDES a juros subsidiados pelo conjunto da
população, não tiveram ainda suas desonerações revertidas. Mas esses grandes
grupos só têm a perder com a economia andando devagar; isso diminui o
faturamento. A contrapartida atual é que esses grandes grupos, em geral, têm
uma geração de caixa fantástica e disponibilidades financeiras vultosas no
aguardo de investimentos interessantes. Como o investimento está paralisado
porque não há perspectiva futura de consumo maior, esse pessoal trabalha no
mercado financeiro, aplica em títulos, e às vezes uma boa parte do lucro dessas
grandes organizações vem da área financeira.
Existe
outra estratégia para enfrentar essa necessidade de reduzir os gastos públicos?
Acho
que existe, é uma estratégia mais difícil politicamente. Como todos sabem, os
meios de comunicação aqui no Brasil estão todos atrelados ao mercado
financeiro. Dificilmente você vai ver uma crítica nos meios de comunicação ao
mercado financeiro.
Se
você trabalha com as maiores taxas de juros ao consumo, você paralisa o país
com isso porque dobra o preço do produto na compra com crediário. Não vejo
muita possibilidade de progredir no país e aproveitar o potencial de consumo
enquanto não for alterada essa anomalia que é a taxa básica de juros. Isso mexe
com o câmbio, mexe com finanças públicas, mexe com o capital de giro das
empresas que se socorrem de financiamentos bancários, sacrifica o tomador final
na ponta do consumo. Há alternativa, mas estou falando de outra estratégia.
Acho
até inteligente você dizer que vai fazer uma contenção de despesas, desde que
se proponha a trabalhar todos os itens de despesa, inclusive de juros. Mas,
quando põe isso na balança, você obtém aliados e inimigos.
Quem
são os aliados de uma política que mexe com taxa de juros? Em primeiro lugar,
as centrais sindicais, sem sombra de dúvida. Segundo, uma parcela do grande
empresariado, que perde mais no faturamento do que ganha na questão financeira,
porque quer mercado. Terceiro, os que exportam, em geral grandes empresas que
já tinham uma tradição de exportação, exportavam para Europa, Estados Unidos,
América do Sul etc. Essa turma quer ver consumo; é o consumo que as alimenta,
que as potencializa para ganhar musculatura para competir lá fora. Essa turma
não quer câmbio fora de lugar, e o câmbio fora de lugar, é claro para todos, é
uma distorção causada pela Selic.
Se
a Selic baixasse, o dólar iria para quanto?
Não
posso falar com certeza; tenho estimado na ordem de R$ 4 a R$ 5. Se você pegar
a série histórica e deflacionar, tanto o preço por atacado nos Estados Unidos
quanto aqui no Brasil, vai verificar que essa série histórica, que eu acompanho
desde 1980 até agora, mostra que estamos ainda no fundo do poço com essa taxa
de R$ 3; a taxa historicamente média está acima de R$ 4. Então eu acho que, se
o Banco Central parar de intervir no câmbio, ele vai na direção de R$ 4 a R$ 5.
Com isso, os produtos importados ficarão mais caros, o consumidor brasileiro
vai comprar mais produto fabricado aqui e essas empresas que têm mais tradição
de mercado internacional, que exportavam, vão reativar suas exportações.
Ao
reativar as exportações, você aprende muito, porque há uma disputa difícil.
Então, tecnologia vem, produtividade vem, inovação vem, tudo vem pelo desafio
externo, principalmente onde a briga é mais complicada.
Quando
todos se movimentaram na crise a partir de 2008, Estados Unidos, Japão, Europa,
China, todos se armaram para isso, depreciaram suas moedas, injetaram dinheiro
na economia. O Brasil fez o contrário: recuou. Recuou por quê? Porque o grande
mantra do sistema brasileiro é o fantasma da inflação. Assim, diante de
qualquer medida que você tome, automaticamente um vozerio enorme, comandado
sobretudo pelos bancos, vai dizer que vai gerar inflação.
E
olha que há outros instrumentos para combater a inflação sem aumentar a Selic.
Oitenta por cento da inflação brasileira não tem nada a ver com a Selic. Tentar
controlar a inflação pela ação exclusiva do Banco Central é o erro básico de
uma economia na qual você não articula as políticas monetária e fiscal.
Vejo
com bastante ceticismo a possibilidade de conseguir derrubar as taxas de juros,
mas isso não invalida a necessidade de começar a trabalhar no meio social,
principalmente o impacto que os juros têm na vida das pessoas. Com isso você
começa a ampliar os apoios na sociedade como um todo. O governo nunca se
mobilizou nessa direção, não teve nenhuma estratégia voltada ao enfrentamento
da anomalia do mercado financeiro no Brasil.
A
crise atual está ameaçando cadeias produtivas como as do óleo e do gás. É uma
crise passageira e nós vamos continuar desenvolvendo essas cadeias produtivas
internas?
Como
a política do começo do governo Dilma para cá visou usar a Petrobras como
biombo da inflação, não só a Petrobras como a Eletrobras, criou-se uma situação
de dificuldade financeira para essas empresas que tinham um plano estratégico
de grandes investimentos e passaram a não ter mais caixa para bancá-los. Com
isso, criaram-se vários problemas para toda a cadeia que depende delas. Hoje a
Petrobras está com atrasos de pagamento. Isso afeta algumas empresas, que são
obrigadas a demitir e não estão vendo perspectivas com investimentos que
estavam programados e anunciados. A Petrobras está desviando do plano de
investimentos grande soma de recursos para pagamento de juros de sua dívida
fora do país, sem a mínima necessidade de ter feito isso. Foi uma política
errada subsidiar gasolina por meio da Petrobras, e não do Tesouro Nacional.
Você
falou que o medo maior que justifica todos esses cortes é a inflação. Existem
outras maneiras de combater a inflação além dessa que está sendo usada?
A
inflação no Brasil pode ser decomposta em três fatores, que compõem o IPCA,
indicador que mede a inflação oficial. Um grupo é o dos preços chamados livres,
dentro do qual você tem o grupo de alimentação e bebidas, que participa com 25%
do IPCA. Então, se você tiver inflação, por exemplo, de 10% num mês no item
bebidas, ele vai dar 2,5 de IPCA naquele mês.
O
outro item são os serviços, praticamente 70% do PIB. São prestados por milhões
de empresas e pessoas, empregadas domésticas, motoristas, manicures,
cabeleireiros, restaurantes, e assim vai. Serviços é um setor muito forte, o
comércio está muito ligado a isso. Ora, os serviços estão ligados à lei da
oferta e da procura, porque são um mercado concorrencial, com milhões de
consumidores e milhões de ofertantes.
Lula
deixou como maior legado, em minha opinião, a entrada de cerca de 30 milhões,
40 milhões de pessoas na classe média. Essa turma quer celular, TV, automóvel,
uma variedade enorme de coisas, e quer serviços, um monte de serviços que antes
não tinha. Quarenta milhões de novos consumidores de serviços criaram um
desbalanceamento entre oferta e procura. Isso cria uma inflação de demanda que
foi de 8,5% ao ano, nunca abaixo de 8%. Como serviços pesam 35%, você faz as
contas, 35% de 8% dá 2,8 pontos no IPCA.
Esses
preços não são comandados pelo Banco Central. Preço de serviço é comandado pelo
mercado, como eu falei, e os dos alimentos são comandados principalmente pelas
condições climáticas.
E
finalmente o terceiro grupo seriam os preços monitorados, ou seja, preços que
dependem de decisões de governo, federal, estadual e municipal. O que é isso?
Energia elétrica, combustíveis, governo federal; água e esgoto, governos
estaduais; transporte coletivo, governos municipais, fundamentalmente.
O
governo Dilma, diferentemente dos governos Lula e Fernando Henrique, passou
quatro anos apanhando de alimentos. Pouca gente fala isso. Ela teve contra si
uma inflação de alimentos que não dependeu dela, e sim de condições climáticas,
e compensou isso nos preços monitorados, segurando o preço do combustível e o
da energia elétrica. E nós estamos agora desovando esse problema. A inflação
deste ano vem fundamentalmente desses preços monitorados que estão voltando ao
nível em que foram contidos.
Há
um quarto grupo, que corre por fora, que são os chamados bens comercializáveis.
São bens sujeitos à concorrência internacional. Se uma empresa aumentar o preço
do azeite produzido aqui, vai haver um azeite vindo da Espanha, de Portugal, da
Itália, de onde quer que seja, que vai competir. A dona de casa vai ao
supermercado, olha na gôndola e, se houve uma mudança de preço, testa outro
produto. Aqui a competição está muito ligada à questão externa.
Ora,
você não combate preços monitorados com Selic, não combate preços dos serviços
com Selic e não combate preços dos alimentos com Selic. Nada a ver, e isso são
80%. Você combate 20% da inflação com o câmbio, e é para combater a inflação
que o Banco Central joga pesado na Selic elevada, que atrai dólar especulativo.
Se você tem muito dólar querendo entrar aqui, o real se valoriza, e é essa a
política suicida que vem sendo feita desde o Plano Real no Brasil.
Quando
se tem em finanças públicas mais despesa do que receita no conjunto todo,
incluindo juros nisso, o que o Brasil tem feito é simplesmente emitir títulos
da dívida pública.
O
Banco Central é proibido de emitir títulos, mas o Tesouro Nacional, não. Então
o Banco Central pede ao Tesouro que emita. Se o Tesouro fosse fiscalmente
responsável, ele não faria isso. É preciso botar um limite para a dívida
federal. A Lei de Responsabilidade Fiscal tornou obrigatórios limites aos
estados, aos municípios e ao governo federal, mas essa parte do governo federal
nem o Fernando Henrique quis regulamentar e aprovar no Congresso; tampouco Lula
e Dilma; eles querem liberdade de ampliar sua dívida, e eles próprios definem a
taxa de juros sobre essa dívida. Se você regulamentar essa parte da Lei de
Responsabilidade Fiscal, essa turma vai pensar se vai emitir título ou não.
Outra
forma de financiar o déficit é emitir moeda. O governo passa a injetar recursos
na economia, mas automaticamente os que são contra vão dizer que isso vai dar
inflação porque bota dinheiro na economia. Se fosse assim, haveria uma grande
inflação nos Estados Unidos, que quase triplicaram a base monetária desde a
crise; Europa, a mesma coisa; Japão, a mesma coisa; China também. No entanto,
eles estão com medo da deflação.
A
base monetária do Brasil está na ordem de 4% a 5% do PIB. No mundo, isso tudo é
acima de 30%, 40% do PIB. Com a atual política, o governo brasileiro segura a
economia por todas as formas possíveis e desagua num baita custo fiscal para o
setor público da ordem de 7% a 8% do PIB, quando no mundo todo esse custo
fiscal da dívida não passa de 1% a 2% do PIB.
E
por que não seguimos os outros?
Porque
tanto o governo quanto a oposição e os analistas falam a língua do mercado
financeiro, e esta é dominante na economia brasileira. Dificilmente você vai
ver um analista colocar posições que façam uma crítica mais ampla, mais
completa, mais redonda, mais sistêmica à economia brasileira.
Olhando
para a frente, considerando a situação em que estamos, como saímos dessa
espiral descendente a que o ajuste está induzindo?
Às
vezes eu acho que a crise é que dá o caminho. Se insistirmos no caminho atual,
para este ano teremos uma queda do PIB da ordem de 2%. Acho que isso não ocorre
há décadas, e no ano que vem deve crescer entre 0% e 1%. O que isso vai
repercutir em termos sociais? Vai aumentar o desemprego, vai haver tensão
social, as pessoas reagem se acautelando, não querem comprar, o que repercute
no faturamento e no lucro das empresas... Vai haver um agravamento da situação
social e econômica atingindo o país, o que pode chegar a um ponto de quase
ruptura. Não estamos nesse ponto ainda porque existe um pouco de esperança no
tal do ajuste.
Você
não pode ficar parado diante da compreensão de que isso se agrava; você tem de
alertar e começar a procurar aliados nesse processo e botar a boca no trombone.
Procurar
aliados supõe se somar para cumprir uma agenda mínima. Que agenda é essa, que
aliados são esses?
Falando
dos trabalhadores, a maior aliança se dá pela defesa do emprego e, em segundo
lugar, por uma melhoria nas questões salariais e de benefícios. Nos
empresários, você tem os aliados no faturamento. Toda empresa quer aumentar seu
faturamento, melhorar sua posição competitiva, e essa melhoria está muito
ligada ao crescimento econômico; todo país é assim. Esse é outro aliado
importante. E, finalmente, um aliado que está surgindo agora com maior força é
a própria sociedade civil, a própria população que está se organizando e
reclamando do que recebe do setor público. Esse grupo ainda é meio amorfo do
ponto de vista de propostas etc., mas é um grupo que grita e perturba. Você
precisa falar para esse grupo também, que pode ser um maravilhoso aliado; não é
um grupo que vai falar em impeachment ou não impeachment, governo militar ou
não militar, mas vai cobrar duramente resultados dos governantes, e estes, se
quiserem responder com impostos, não vão ser aceitos.
É
o caso de Curitiba agora, dos professores.
Isso,
é um dos casos bem fortes, é bem marcante, é uma categoria organizada a dos
professores. Toda essa turma que tem relações estreitas com o poder público, ou
depende como assalariado do poder público ou dos serviços por ele prestados
vota, faz barulho, e as redes sociais multiplicam esse clamor, essa força.
Agora você precisa falar para elas.
Quando
você começa a ter coisas concretas... Por exemplo, o Mais Médicos foi um
excelente programa do governo, que começa a botar médico em lugar a que nunca
ninguém iria. Assim, você cria uma opinião pública favorável; a turma que é
contra começa a perder força. Existe muita experiência já feita, trata-se de
botar isso em funcionamento para valer.
Silvio
Caccia Bava
Diretor
e editor-chefe do Le Monde Diplomatique Brasil
Ilustração:
Daniel Kondo
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