A oposição esperava que milhões
de cidadãos inundariam as ruas para expulsar Dilma do Planalto. Contudo, o
público não superou as 600 mil pessoas
Darío Pignotti, para o Página/12,
desde Brasília / www.cartamaior.com.br
“Esta vez havia menos gente que em março e em
abril, as pessoas estão se cansando um pouco, esperamos que venham mais na
marcha de setembro”. O balanço é do advogado Aldo Júlio Ferreira, coordenador
jurídico do Movimento Brasil, entidade organizadora do ato em favor do impeachment
de Dilma Rousseff realizado neste domingo (16/8), em Brasília, a 300 metros do
Palácio do Planalto, onde certamente receberam com alívio os números dos
protestos a nível nacional, que ficaram abaixo do esperado pelo PSDB (Partido
da Social Democracia Brasileira), apesar da presença, pela primeira vez, do
líder do partido, Aécio Neves, que finalmente assumiu a união com as agrupações
neoconservadoras, boa parte delas conduzidas por jovens de classe média.
Às 13h10, na frente do Congresso
Nacional, começou a ser desinflado o boneco de 10 metros de altura com a imagem
de Lula vestido como presidiário. O público caminhava nas proximidades da sede
legislativa fazendo comentários abertamente fascistas como “pena que os
militares não mataram todos os esquerdistas” ou “por que tenho que pagar o
Bolsa Família com os meus impostos, e sustentar gente indolente que não quer
trabalhar?”. Outros tiravam selfies junto com o balão de Lula, enquanto faziam
comentários vingativos e ameaçadores. Parecem se divertir, como se estivessem
numa viagem kitsch a Orlando ou Miami. “O boneco de Lula nos custou 12 mil
reais, que juntamos fazendo uma vaquinha com muitos amigos contrários a esta
banda podre do PT, a mais corrupta da história. Lula é o chefe da quadrilha e
tem que ser preso, tem que prender todos os petistas. Sabe o que está faltando?
Gente nova de centro-direita”, declarou Ferreira a Página/12, corando de raiva,
enquanto tentava erguer os braços de látex do balão, com a ajuda de suas
senhoras.
“Em quem você votaria depois da
saída de Dilma? No juiz Sérgio Moro, talvez, é uma pessoa honrada, um lutador
que vai para cima dos corruptos”, afirma Bruno Torres Souza, de 30 anos,
empregado do Poder Judiciário que se aproximou da conversa para denunciar “para
a imprensa internacional que Dilma e o PT estão infiltrando o país com
mercenários estrangeiros. Com o programa Mais Médicos (programa de saúde nas
zonas mais pobres) eles meteram militares cubanos escondidos entre os doutores
para que, quando a gente expulse a Dilma, haja milícias armadas dirigidas pelos
cubanos e pela CUT (Central Única dos Trabalhadores)”.
Desde o canteiro localizado no
meio do Eixo Monumental, a superavenida brasiliense de 250 metros de largura,
se observam grupos de pessoas separadas por 5 a 10 metros de distância, o que
permitia divisar perfeitamente os dois prédios laterais, o do Itamaraty e o
Ministério da Justiça. Isso não acontecia na concentração multitudinária de
março, nem na menos numerosa de abril, quando houve cerca de 30 mil pessoas. A
impressão do cronista carece de rigor, mas coincide com a opinião do advogado
Ferreira sobre a diminuição do número de indignados.
Os números em São Paulo, o maior
bastião antipetista, também indicavam que o comparecimento diminuiu. Segundo o
Datafolha, 135 mil pessoas passaram pela Avenida Paulista entre às 13h e às
17h30, enquanto a Polícia Militar (sempre generosa com os inimigos do governo
federal) calculou 360 mil na principal artéria da cidade.
Tomando em conta os números do Datafolha,
a reunião deste domingo esteve longe do obtido em março, que juntou 210 mil
pessoas em São Paulo (a polícia chegou a cifrar um milhão) mas superou a de
abril, quando houve 100 mil na mais povoada cidade brasileira. Em todo caso, as
concentrações ocorridas no domingo, nos 26 estados da União, parecem ter estado
abaixo do milhão de pessoas, talvez sequer passaram das 600 mil.
Dados que contradizem o
prognóstico elaborado há duas semanas pela oposição, que esperava milhões de
cidadãos inundassem as ruas para pedir a saída de Dilma do Planalto, onde deve
permanecer até o dia 31 de dezembro de 2018, segundo estabelece a Constituição
do país, pelo mandato conquistado logo de ser reeleita, em outubro de 2014.
O senador Humberto Costa, líder
da bancada do PT, afirmou que “o fato de que as manifestações foram menos
numerosas não significa que o descontentamento popular diminuiu. Muitos
problemas estão começando a ser revertidos, mas o governo necessita dar
melhores soluções econômicas”.
Ou seja: que a presença nas ruas
tenham diminuído não é sinônimo de que a reprovação do governo, que é de 71%,
tenha sido superada, assim como o baixo respaldo de Dilma, de 8% segundo as
medições deste mês. Com o governo recuperando a margem de manobra e tempo, já
que o impeachment saiu da agenda imediata, a bola ficou agora no campo do
adversário (melhor dizendo, do inimigo). Isso porque o relativo fracasso da
estratégia destituinte terminou tendo um custo político para os dirigentes mais
apressados, como Aécio Neves (que discursou no domingo, em Belo Horizonte),
ex-candidato presidencial, derrotado no ano passado por Dilma.
O fiasco político do dia 16
deixou Neves em desvantagem em comparação com outros membros do PSDB, como o
ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e o governador de São Paulo, Geraldo
Alckmin. Eles se opõem à consigna do “Impeachment Já”, reivindicada pelos
manifestantes, pois a consideram uma aposta temerária, e, pelo menos por
enquanto preferem que Rousseff conclua seu mandato.
Dezenas de milhares de cidadãos
se mobilizaram em São Paulo, no Rio de Janeiro, em Brasília e em Belo
Horizonte, com camisetas mostrando o rosto de Sérgio Moro, o juiz encarregado
do processo de corrupção dentro da empresa estatal Petrobras. O jovem
magistrado se posiciona como uma espécie de vingador dos políticos com
ambições, o que poderia transformá-lo num futuro Sílvio Berlusconi, segundo o
deputado petista Wadih Damous.
Aquartelados
Quando terminou a manifestação,
eram cerca de 14 horas no centro de Brasília, com 27 graus de temperatura e 30%
de umidade. Nesta capital semiárida localizada ao norte do Rio e de São Paulo,
não há quatro estações, mas sim duas: a úmida e a seca, que é a atual. Um
caminhão levou o balão de Lula e uma jaula onde estavam presos o ex-presidente
e a atual, Dilma Rousseff. Só ficaram de pé, em frente ao Congresso, cinco
grandes cartazes, sobre as estruturas metálicas, pedindo o retorno dos
militares, ao lado do Acampamento Patriota, com sete barracas ocupadas por
defensores da intervenção das Forças Armadas.
Como já não havia manifestantes,
se ouvia com mais nitidez o “Hino aos Expedicionários”, uma melodia que vinha
de dentro de uma das tendas de campanha.
Nesse momento, José Antônio
Romeiro veio até nós. Após nos convidar a sentar, contou que estava há 147 dias
“atrincheirado”, como forma de pressão, para que a presidenta renuncie.
“Aqui temos 22 pessoas, estamos
de forma permanente, recebemos muito apoio das pessoas, temos reuniões, falamos
com militares, mas não me peça o nome deles, não posso comprometê-los.”
O lugar tinha clima que mesclava
o de piquenique (havia uma churrasqueira, caixas térmicas com cerveja,
espreguiçadeiras onde uma garota conversava com os visitantes) com o de um
quartel (as pessoas se cumprimentavam com tom marcial e parecia imperar certa
hierarquia entre os mandos superiores e a tropa).
Quando perguntamos “você
reivindica a ditadura?”, Romeiro olhou como se houvesse escutado algo absurdo.
“De que ditadura você me fala?”. Tomou ar e continuou. “Aqui o que houve entre
1964 e 1985 foi um governo militar, onde havia alternância no poder, porque a
cada quatro anos mudava o general na presidência, e havia eleições indiretas
para o Congresso”.
“Mas não existe alternância no
poder?”, indaguei. “Atualmente, não existe alternância, porque estamos sendo
sempre governados pela esquerda, ou pelo PT, depois pelo PSDB (de Cardoso e
Neves). Precisamos de um governo militar, por seis meses, que ponha as coisas
em ordem, e depois convoque eleições. Antes das eleições, toda essa esquerda
tem que ir para a cadeia”, propôs o aparente chefe dos manifestantes, a 100
metros do Congresso.
Tradução: Victor Farinelli
Créditos da foto: reprodução
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