Políticos
irresponsáveis como Aécio e colegiados corporativistas como o TCU agem por puro
interesse e estão levando o Brasil para o precipício.
J.
Carlos de Assis* // www.cartamaior.com.br
Ditadura
miliar não é coisa que a gente pede a frio. É coisa que a gente sofre a
contragosto. Escrevi um artigo mostrando que estamos nos encaminhando para um
terrível processo de convulsão social que pode acabar numa ditadura militar e
alguns comentaristas, não entendendo patavinas do que escrevi, alegaram que eu
estava propondo uma ditadura “benigna”. É o exato oposto. Na história, só
existiram ditaduras “benignas” na Roma antiga, quando os senadores entregavam o
poder a um ditador a fim de que ele tivesse as mãos livres para enfrentar algum
perigo comum. Uma vez cumprido o dever, o ditador tratava de abrir mão do poder
o mais rápido possível, pois considerava vergonhoso ser ditador.
Na
atualidade brasileira, as condições para que tenhamos uma ditadura “benigna” em
face do caos reinante é praticamente nula. Não há consenso possível em torno de
uma solução desse tipo. Não obstante, as instituições da República estão se
deteriorando em ritmo acelerado. Quando isso chega a um nível de não retorno,
algo tão impensável quanto o impeachment de presidente da República por um
capricho formal do TCU ou do TSE pode acontecer com uma “naturalidade” falsa,
com característica similares ao golpe paraguaio. E é nesse momento que um
estado de convulsão social transforma-se nas preliminares de uma guerra civil,
levando muitos da população a pedir a intervenção militar.
Políticos
irresponsáveis como Aécio e colegiados corporativistas como o TCU, agindo por
puro interesse partidário, estão levando o Brasil de forma absurdamente leviana
para a beira do precipício. Agem como se estivessem sozinhos no mundo sem
considerar a reação do outro. Olhando acriticamente o resultado das pesquisas
de opinião, acham que Dilma e o PT não tem condições de suscitar qualquer
reação efetiva da população no caso de cassação dela. Esquecem o que é o PT, a
CUT e o MST, com suas múltiplas correntes políticas internas, muitas delas se
orientando explicitamente por uma vocação revolucionária. Deem a eles motivo –e
não existe maior motivo que a cassação de Dilma -, e teremos o início de um
banho de sangue.
Não
tenho em mente os homens maduros, as pessoas de classe média, os chefes de
famílias. Tenho em mente, principalmente, os jovens. Basta lembrar a guerrilha
urbana brasileira e a guerrilha de Araguaia no início dos anos 70: a maioria
eram jovens. César Benjamim tinha 16 anos. Dilma Roussef, 18. Ambos conseguiram
salvar suas vidas. Outros foram
assassinados pela repressão antes dos 25. É que jovens, em geral, não tem medo
de morrer na luta. São generosos. Não tem compromissos de família. Tomem o
mandato de Dilma e, qualquer coisa que ela faça ou diga, ou que diga Lula, e
centenas de milhares de pessoas irão para as ruas tirar a forra. Tudo isso
começará “democraticamente”.
Contudo,
recordam-se do que promoveram os black blocs nas manifestações de 2013?
Lembro-me da expressão espantada dos apresentadores da Globo descrevendo as
ações dos “vândalos”. No entanto, eram uns gatos pingados. Imaginem agora as
ruas e avenidas das grandes capitais brasileiras ocupadas por dezenas de
milhares de militantes enfurecidos do PT, da CUT, do MST, do PCdB, do PSTU, do
PSOL, nem todas em apoio a Dilma, mas todos contra a quebra da
institucionalidade: será que as PMs evitarão uma quebradeira generalizada? Será
possível conter as multidões? Isso não vai misturar-se com a chamada luta
contra o capitalismo, cujos maiores símbolos, bancos e empresas, provavelmente
não restarão de pé?
Nossa
obrigação, enquanto cientistas sociais, é relembrar a história para evitar que
ela se repita. Estamos numa situação de derretimento de instituições similar ao
que aconteceu séculos atrás, na Revolução Francesa. Então, o Rei estava contra
a aristocracia, a aristocracia contra os burgueses, os burgueses contra os
operários, os camponeses contra os latifundiários, todos contra a Igreja. Nós
vemos o TRU e parte do TSE contra o Executivo, o Legislativo contra o Executivo
e o Judiciário, o Judiciário contra todas as instituições e contra si mesmo. Na
França, a guerra civil começou com a queda da Bastilha, que sequer era uma
prisão política. Aos poucos quase nada sobraria da velha ordem e algumas
milhares de cabeças rolaram.
Não
pensem que os ministros do TCU e do TSE que ficarão impunes se a ordem política
brasileira degenerar-se por obra de suas ações irresponsáveis. O mesmo se pode
dizer dos políticos também irresponsáveis que, por puro interesse próprio,
estão contribuindo para degenerar as instituições de forma próxima do
irreparável. Pela história, sabemos como começou a Revolução Francesa e como
terminou: caiu nas mãos de um general genial que impôs ao país uma ditadura
“benigna”. Não sei se teríamos a mesma sorte no fim do processo. Mas estou
convencido de que, entre o início caótico e a ditadura final, teríamos uma fase
intermediária que a história tornou conhecida como Terror!
P.S.
Prometo que no próximo artigo relatarei os esforços que um grupo responsável de
brasileiros está fazendo para recuperar a economia, a política e as
instituições, sem apelo para ditaduras.
*Economista,
doutor pela Coppe/UFRJ, autor, entre outros livros de economia política, de “Os
Sete Mandamentos do Jornalismo Investigativo”, Ed. Textonovo, SP.
Créditos da foto: reprodução
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