Destravar o investimento em infraestrutura e
reativar o setor de petróleo e gás: estas são as duas medidas para ajudar o
Brasil a enfrentar a crise.
Joana Rozowykwiat - Portal vermelho // www.cartamaior.com.br
“Não teve
nenhuma iniciativa do governo de dizer: vamos combinar, você prende quem você
quer prender [na Operação Lava Jato], mas vamos soltar as empresas para elas
funcionarem. Porque isso que está acontecendo… Esses promotores de Curitiba são
completamente insensatos, um bando de loucos, gente que não sabe nada”,
condenou.
Belluzzo referia-se aos impactos que os
desdobramentos da Lava Jato estão tendo na atividade econômica brasileira. Ao
atingir a estratégica cadeia de óleo e gás e as maiores empreiteiras do país, a
operação desencadeou uma espécie de efeito dominó, imobilizando obras e
projetos. Um estudo do Ministério da Fazenda, divulgado em outubro, indicou que
apenas a redução de investimentos na Petrobras poderia provocar uma contração
acima de 2 pontos percentuais do PIB este ano.
“E não é só a Petrobras, são as empresas chamadas
de empreiteiras – que na verdade são conglomerados empresariais -, que têm
fornecedores, e há os fornecedores desses fornecedores e por aí vai. Então é
todo um circuito que você foi e cortou”, disse Belluzzo.
O diretor de Estudos e Políticas Sociais do Ipea,
André Calixtre, também já havia chamado a atenção para as repercussões da
operação. “Não podemos ignorar o fato de as empresas investigadas não poderem
mais operar negócios, terem acesso ao crédito e às licitações. A verdade é que
a cadeia de petróleo e gás sofreu um imenso impacto”, afirmou, lembrando também
seu reflexo sobre a construção civil.
De acordo com Belluzzo, nesse cenário, o governo
precisa sair do imobilismo para evitar um aprofundamento dos problemas. “A
gente precisa ter coragem de fazer as coisas. Se você ficar acoelhado, não faz
nada. Você tem esses projetos de concessão de infraestrutura, mais o setor de
óleo e gás. Precisa então resolver o problema da Petrobras, porque esse é um
dos centros do afundamento da economia, está paralisando tudo. Tem que reativar
isso, botar isso aí para funcionar”, opinou.
O economista avaliou que esta seria uma forma de
puxar a aceleração da economia e, caso isso não aconteça, há chances de a crise
contaminar outras áreas. “Você corre o risco de ter uma crise bancária, porque
as empresas estão assim: ninguém paga ninguém. Eles não pagam nem os juros da
dívida. Sabe quanto tem no ativo dos bancos brasileiros? Praticamente R$1
trilhão, que é desse sistema [afetado pela Lava Jato]. E, se o banco não paga,
o que acontece? O banco é obrigado a registrar como empréstimos que precisam de
provisão e, como resultado, as agências de risco vão e rebaixam [as notas de
crédito]”, declarou.
No embalo das 23 empreiteiras que estão sendo
investigadas pela Polícia Federal, outras 51 mil empresas – responsáveis por
500 mil empregos – tiveram seus negócios prejudicados. Segundo informação do
próprio presidente da Petrobras, Aldemir Bendine, 32 empresas foram bloqueadas
cautelarmente no trabalho com a companhia devido às investigações.
O “cavalo de pau” na política econômica
Belluzzo lembrou que o Brasil reagiu bem ao momento
mais agudo da crise internacional, desencadeada em 2008, conseguindo
rapidamente recuperar sua taxa de crescimento. Mas, quando os fatores
favoráveis à economia brasileira começaram a se dissipar, o governo demorou a
definir projetos de concessão e a promover os programas de infraestrutura,
avaliou.
“O PIB caiu um pouco em 2009, mas em 2010 já
cresceu, então reagiu muito bem. Só que terminou aquele frenesi do ciclo de
consumo americano e de commodities chinês. Então rapidamente os efeitos
positivos se dissiparam e o Brasil foi incapaz de dar uma resposta mais compatível.
Demorou a definir projetos de infraestrutura e tal e a economia foi
desacelerando. Não foi desacelerando tanto quanto as pessoas pensam, mas foi
desacelerando e, em 2014, ela estava mal”, analisou.
De acordo com ele, o crescimento da China – principal
parceiro comercial do Brasil – começou a desacelerar e o Brasil passou a ter
problemas com o balanço de pagamentos e um aumento importante no déficit de
conta corrente. Para Belluzzo, “a situação fiscal começou a ficar difícil, mas
não catastrófica”.
“E o que o governo fez? Deu um cavalo de pau na
política econômica. Deu essa subida absurda dos juros, choque fiscal, e a
economia entrou em recessão. E a situação internacional é o quadro dentro do
qual isso aí se desenvolveu”, afirmou.
Questionado sobre os impactos que a crise política
tem sobre a economia, o economista avaliou que isso tem atrapalhado bastante a
situação. “O governo ficou imobilizado. Você não consegue nem passar a CPMF,
que é a coisa mais razoável que tem. Mas eles estão bloqueando”, lamentou.
Avesso ao ajuste fiscal proposto pelo ministro da
Fazenda Joaquim Levy, Belluzzo, criticou a política de juros altos praticada
pelo Banco Central, que não ajudaria a combater uma inflação de custos. Segundo
ele, falta coordenação entre as políticas do governo.
“Juntou tarifa de energia com tarifa de água e aí a
inflação foi a 10%. E aí, como você vai pegar um choque de tarifas, que é um
choque de custos, numa economia que tem inclinação à indexação de tudo… Então
você tem o pior dos mundos: um choque inflacionário, com uma renitência ao
longo do tempo, e o Banco Central pode ter a ideia de continuar aumentando os
juros. E isso vai jogar a economia mais para baixo ainda”.
Para ele, a recente desvalorização do câmbio pode
ajudar a dar um fôlego à indústria brasileira, apesar de a situação do comércio
internacional também estar difícil. Em 2004, a participação da indústria no PIB
era de 18%. Este ano, deverá ser de 9%.
“Com a recessão e a desvalorização do câmbio, você
produziu uma redução das importações. Mas as exportações não estão crescendo,
estão caindo. Só que as importações estão caindo mais. Por causa dos números da
atividade, mais o encarecimento dos insumos importados. Isso pode dar um pouco
de fôlego à indústria, porque começa a haver encomenda no mercado doméstico de
coisas que eles compravam mais barato e agora estão ficando caras”.
O tripé
Na entrevista, Belluzo comentou a prevalência do
chamado tripé macroeconômico, que consiste em câmbio flutuante, metas de
inflação e superávit primário. “Eu sempre dou um exemplo: por acaso um
importador francês e um exportador japonês podem denominar transação em reais?
Parece que não. Vão denominar ou em euro ou em dólar. Essa circunstância faz
com que o câmbio flutuante num país como o Brasil seja muito arriscado. Você
tem muita volatilidade, muita instabilidade do câmbio. Por que os chineses de
deram bem? Porque eles controlaram o câmbio”, avaliou.
“O tripé é uma criação dos anos 90. Tem a ver com a
política econômica da globalização neoliberal e os países que se entregaram a
ela. Você tem dois tipos de países: os chineses, que aproveitaram as mudanças
para fazer políticas nacionais, exercer controle sobre o que era crucial – que
era comércio exterior, o câmbio e o sistema financeiro – , e os países que
fizeram essa abertura que o Brasil fez”, disse.
Belluzzo, contudo, não vê, hoje, condições
políticas para romper com a lógica do tripé marcoeconômico. “Veja, por exemplo,
com essa desvalorização do câmbio, você reduziu muito as viagens ao exterior.
Tinha cabimento você estar subsidiando o cara para viajar para o exterior, ao
invés de viajar para Natal? Então precisa ter condições políticas. Você precisa
convencer a sua base de que isso [romper com o tripé] é importante”, concluiu.
Créditos da foto: Pedro França/Agência Senado
Nenhum comentário:
Postar um comentário