A pressão inflacionária não vem
da demanda porque o setor público, as empresas e as famílias estão contando
dinheiro para ver se chegam bem ao fim do mês.
José Carlos Peliano* //
cartamaior.com.br
Dirão, e admito com certa razão,
que criticar é fácil, difícil é consertar ou concertar as coisas. Ok, tudo bem.
Mas para quem é economista e já passou anos na administração federal
brasileira, sua crítica vale pelo conhecimento de causa e pela experiência
pública.
Senão vejamos. A inflação não tem
reduzido no país e ela está a cargo do Banco Central para ser administrada. O
que então ocorre? Segundo qualquer alfarrábio de economia a inflação ou é de
demanda ou é de oferta.
De demanda porque as pessoas, as
famílias e o setor público têm comprado além da conta; de oferta porque os
custos dos insumos das empresas pressionam para cima os preços de venda.
Simples assim.
Pois bem, desde o início do ano
passado que o ministério da fazenda adotou medidas de austeridade para baixar a
inflação. O diagnóstico corriqueiro e comum entre os austeros é que a demanda
estava pressionando os preços pelo excesso de compras.
De imediato o COPOM (Comitê de
Política Monetária) do Banco Central adotou a indefectível medida de aumentar a
taxa básica de juros (SELIC) para sinalizar ao mercado que a demanda estava
estourando a boca do balão.
Com juros mais altos, o crédito
torna-se mais caro. Aí as vendas tendem a reagir negativamente, seja para o
consumidor na compra de carros, eletrodomésticos, imóveis, seja para as
empresas adiantarem recebimentos, tomarem empréstimos para renovação de
estoques e capital de giro, entre outras necessidades tanto de consumidores
quanto das empresas.
Foi o que aconteceu ao país ano
passado inteiro. Neste ano que começa a receita anti-inflacionária deve
permanecer a valer nas interpretações dos magos do Banco Central que não só
avaliam a situação da economia no presente, quanto dão palpites a respeito do
que irá ocorrer no médio e longo prazos.
Vamos lá, um resumo do que está
acontecendo hoje na economia. Uma visão simples de dois setores, o interno e o
externo. O interno comporta todos os que vivem no país incluindo empresas,
bancos e administração pública. O externo tudo o que não está aqui dentro
obviamente.
Muito bem, no setor interno o que
podemos ver? Uma sensível retração da demanda por todos os lados. O PIB recuou
3,6% levando com a queda o nível de atividade das empresa, do comércio, dos
serviços e das importações. Não se vende mais como antes, tampouco se produz
como antes.
Os magos do Banco Central, que se
dizem concentrados no dia a dia da economia, argumentam que os juros altos são
necessários sim para evitar a pressão da demanda pública e efetuar uma
contenção suficiente de gastos para tirar o déficit fiscal e torna-lo
superávit.
Em outras palavras, para os magos
a inflação persiste porque o governo em seus três níveis permanece comprando
mais do que arrecada, o que faz os preços se elevarem dado o baixo nível de
atividade das empresas. Segundo eles, o governo pressionando para cima os
preços de venda das empresas.
Admitamos por um momento, um
momento só, que essa explicação seja correta. Como então explicar esse excesso
de demanda do governo se a arrecadação fiscal caiu e o caixa está à
míngua? Contingenciamentos e redução de
dispêndios foram realizados ano passado exatamente para reduzir a pressão
fiscal.
Então, se a explicação não bate
na lógica, onde está o pulo do gato? Ele está exatamente no financiamento dos
gastos em geral. Os vilões da inflação são os bancos, não os agentes (o setor
público, as empresas, as pessoas e as famílias).
A turma do Banco Central parou a
explicação no meio do caminho. Faltou adicionar que, para que os agentes
continuarem cumprindo seus compromissos assumidos anteriormente bem como os
novos inevitáveis, eles têm que recorrer aos bancos para tomarem empréstimos e
financiamentos.
Só que esse dinheiro vem com
taxas de juros majoradas, de um lado pela sinalização do próprio Banco Central
via Selic, de outro pelos próprios bancos que, em situações de crise, aumentam
os juros por conta do risco que eles admitem passarem para receber de volta o
principal.
A pressão inflacionária,
portanto, não vem da demanda porque o setor público, as empresas, as pessoas e
as famílias estão contando dinheiro para ver se chegam bem ao final do mês.
Mesmo o governo que pode emitir moeda, não está fazendo. Caixas enxugados,
vazios ou inadimplentes.
Tampouco a pressão inflacionária
vem da oferta pois as empresas além de estarem com níveis baixos de atividade,
muitas com estoques avolumados, já desempregaram muita gente. Tiveram que
reduzir suas despesas mensais.
Do mesmo modo a pressão não vem
do lado externo. Com a crise, o real desvalorizou tornando as importações mais
caras e as exportações mais baratas. As empresas voltadas à importação
reduziram suas compras externas e as empresas voltadas à exportação aumentaram
as vendas. A balança comercial do ano passado ilustra bem isso, houve um
superávit nas contas externas.
Se então os magos do Banco
Central estão de óculos escuros ou suas bolas de cristal estão sujas, suas
decisões de combate à inflação via COPOM estão equivocadas para não dizer
erradas.
Nessa situação, o arrocho no
crédito via sinalização pela taxa Selic do Banco Central só tende a piorar as
coisas. Crédito caro com atividade baixa na economia e sem demanda gera mais
queda na atividade, desemprego e persistência da inflação. Esta se mantém
porque os riscos embutidos pelos bancos nos juros aumentam os custos
financeiros das empresa, pessoas e famílias com seus compromissos novos, a
serem renovados ou renegociados.
E muitos compromissos serão mesmo
renovados porque com o caixa baixo os agentes não têm como pagar e terão que
repactuar com os bancos. Esses além de serem os vilões da inflação são os que
mais lucram com a austeridade. Como se o Banco Central estivesse jogando a
favor do sistema financeiro.
Conclusão simples e imediata.
Concentrar melhor os magos do Banco Central em suas atividades para não
tornarem o banco desconcentrado, um Banco Desconcentral. Baixar a Selic para
fazer reagir a demanda e reduzir na marra a voracidade bancária.
Não se trata de apenas criticar
por criticar, nem de opor uma teoria econômica contra outra, tampouco condenar
sem justificativa o papel dos bancos. Trata-se de prestar mais atenção no que
ocorre na economia. Para isto existe um Banco Central. Não um Banco
Desconcentral.
*colaborador da Carta Maior
Créditos da foto: EBC
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