Este é um artigo de opinião de
Jomo Sundaram, ex-secretário geral adjunto responsável pela análise do
desenvolvimento econômico no sistema da Organização das Nações Unidas entre
2005 e 2015. Em 2007 obteve o prêmio Wassily Leontief por expandir as fronteiras
do pensamento econômico.
Jomo Kwame Sundaram* // http://www.dialogosdosul.org.br/
O Acordo Transpacífico de
Associação para a Cooperação Econômica (TPP, em inglês), negociado em Atlanta,
Estados Unidos, em outubro de 2015 e que será assinado em Auckland, Nova
Zelândia, em fevereiro, privilegia os investidores estrangeiros e impõe custos
significativos aos países sócios.
Qualificado de acordo comercial
“modelo” do século XXI, é fundamental determinar que benefícios se podem
esperar do TPP e se estes superam seus custos.
Os benefícios são muito menores
do que asseguram os governos do TTP. Menos de 25% deles podem ser considerados
seriamente.
Escassos benefícios comerciais
Principalmente mediante o uso de
modelos de equilíbrio geral computável de metodologia discutível, todos os
estudos realizados até hoje projetam reduzidos benefícios diretos ao
crescimento econômico resultado da liberalização comercial do TPP.
Os lucros líquidos reais podem
ser ainda menores, se não negativos, já que muitos dos supostos nos exercícios
de projeção não estão no acordo comercial definitivo.
Visando argumentar a favor do
TPP, alguns estudos procuraram os benefícios em outros âmbitos, principalmente
na suposta injeção do investimento projetado, sem levar em conta os custos ou
apresentando-os como lucro.
O estudo mais citado foi
publicado em 2014 pelo conhecido defensor da globalização estadunidense, o
Instituto Peterson de Economia Internacional.
Acrescentaram aos modelos
econômicos diversas disposições previstas do TPP como se fossem simples
reduções de custos, sem dar importância alguma aos riscos de correção na baixa
e aos custos, por exemplo, devidos à redução da autonomia nacional na
regulamentação como resultado do acordo. Como tais, os custos não estão
incluídos e não proporcionam uma avaliação real do custo-benefício.
Ao excluir custos fundamentais, os
defensores do TPP exageram os benefícios comerciais projetados ao assegurar a
existência de lucros duvidosos. Por exemplo, consideram as disposições para
ampliar os direitos de propriedade intelectual (DPI) como redução de custos que
incrementarão o comércio dos serviços.
As disposições que permitem aos
investidores estrangeiros processar os governos em tribunais privados ou que
socavam o regime bancário nacional são vistas como uma redução de custos que
fomentam o comércio, o que não leva em conta os custos e riscos que implica
passar por alto a regulamentação nacional.
O estudo assegura que haverá
enormes benefícios devido à presunção de que o TPP gerará maiores exportações
ao reduzir os custos fixos que tem a entrada nos mercados estrangeiros.
Embora não exista uma base
analítica para esses enormes benefícios, supõe-se que a metade do impacto do
acordo será devida à redução dos custos comerciais fixos.
Se os modelos utilizados
empregassem métodos convencionais para calcular os benefícios obtidos do comércio,
os resultados teriam sido muito mais reduzidos, segundo o único estudo do
governo dos Estados Unidos sobre as consequências do TPP.
Fantásticas consequências no
investimento estrangeiro
Os demais benefícios projetados
pelo estudo do Instituto Peterson referem-se principalmente ao auge do
investimento estrangeiro direto (IED). A análise supõe, arbitrariamente, que
cada dólar de IED no bloco do TPP gerará uma renda adicional anual de 33 centavos,
dividida em partes iguais entre os países de origem e os destinatários, sem que
haja uma teoria econômica, procedimento de elaboração de modelo ou evidência
empírica que apoie este pressuposto.
Míseros benefícios
O estudo exagera enormemente os
benefícios proporcionados pelo TPP.
Enquanto a maioria de suas
conclusões carecem de justificativa, os únicos benefícios quantificados em
consonância com a teoria econômica e as evidências mais aceitas são os
benefícios alfandegários que conformam uma parte desconhecida, mas muito
pequena dos benefícios projetados.
Os benefícios são muito menores
do que asseguram os governos do TTP. Menos de 25% deles podem ser considerados
seriamente. Mesmo estes, é preciso compará-los com os custos que o estudo
ignora convenientemente, assim como com os detalhes reais do acordo definitivo.
Não é preciso dizer que, pela mesma razão, é necessário descontar os lucros dos
países calculados de forma similar.
Mesmo sem ajustar, os benefícios
são pequenos em relação ao produto interno bruto das economias associadas ao
TPP. Da mesma forma, embora os benefícios comerciais projetados devam demorar
uma década para concretizar-se, os principais riscos e custos serão mais
imediatos. Eles equivalem a benefícios únicos não havendo benefícios anuais
recorrentes, portanto, não elevam as taxas de crescimento das economias.
A distribuição dos lucros não foi
suficientemente analisada nestes exercícios. Se se destinam principalmente a
umas poucas empresas grandes e os demais assumem as perdas, então o TPP
exacerbaria a desigualdade.
Lucro líquido ou perda?
O TPP adentra muito mais do que
seria necessário na forma em que os governos operam para facilitar o comércio.
Estas “disciplinas” restringem consideravelmente o espaço político de que
necessitam os países para acelerar o desenvolvimento econômico e proteger o
interesse público.
Os escassos benefícios projetados
fazem com que seja fundamental levar em conta a natureza e a escala dos custos
ignorados por todos os exercícios de modelos disponíveis. O TPP imporá custos
diretos, por exemplo, mediante a ampliação dos DPI e ao bloquear ou atrasar a
produção e a importação dos produtos genéricos.
O mecanismo de solução de
controvérsias entre investidores e o Estado proposto pelo TPP permitirá aos investidores
estrangeiros processar os governos em tribunais estrangeiros, caso os
investidores considerem que as normas estatais reduzem seus lucros futuros
previstos, mesmo que essas normas sejam de interesse público. Como já existe
seguro privado com este objetivo, o mecanismo é completamente desnecessário.
Jagdish Bhagwati, um destacado
defensor da liberalização comercial, junto com outros, criticou duramente a
inclusão deste tipo de disposições não comerciais em acordos decididamente de
livre comércio.
Em vez de ser o acordo regional
de livre comércio que se apregoa, o TPP parece ser “um regime de comércio
gerido que põe os interesses das corporações em primeiro lugar”.
O TPP, que oferece limitados
benefícios quantificáveis derivados da liberalização comercial, integra um
pacote que minará de maneira fundamental o interesse público. Nesta etapa os
benefícios líquidos para os sócios do acordo são duvidosos.
Só uma contabilidade completa e
adequada baseada no texto íntegro do TPP pode resolver esta questão chave.
De fato, o TPP já foi utilizado
para tentar acabar com a Rodada de “Desenvolvimento” de Doha – as negociações
comerciais multilaterais realizadas nessa cidade de Qatar em 2001 -, mas também
poderá vir a socavar o multilateralismo de maneira mais ampla num futuro
próximo.
As opiniões expressas neste
artigo são de responsabilidade do autor e não representam necessariamente as da
IPS – Inter Press Service, nem podem lhe ser atribuídas.
* IPS de Kuala Lumpur, especial
para Diálogos do Sul – Traduzido do inglês para o espanhol por Álvaro Queiruga
e do espanhol para o português por Ana Corbisier
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