Ontem de manhã, no rádio do carro, ouvi um âncora e um entrevistado pela CBN desancando a “corrupção generalizada” por conta da suposta doação de R$ 75 milhões de um beneficiário do Bolsa-Família a um candidato às eleições.
Devia ter havido conferência, pois atribuíam a informação ao Tribunal Superior Eleitoral e já anunciavam o envio dos dois desgraçados ao Ministério Público Federal.
Mas não houve, foi na base da “cognição sumária”. Claro, são todos ladrões na política…
Seria extremamente simples, porque a tal “doação milionária” foi feita por transferência bancária e transações desta monta são imediatamente comunicadas ao COAF.
Qualquer imbecil que visse uma doação deste valor a uma candidata humilde, vinda de um pessoa humilde, numa cidadezinha de 12 mil habitantes no interior de Pernambuco iria pensar antes num erro que numa fraude, porque só um fraudador mais imbecil ainda desviaria R$ 75 milhões desta maneira, ainda mais em depósito bancário.
Mas não houve sequer imbecis, não é? Nem no TSE nem na mídia, que repetiu o erro feito papagaio da cruzada moralista.
Hoje, na Folha, Bernardo de Mello Franco dá o tratamento devido a esta indignidade feita com a lavradora pobre Maria Geni do Nascimento, que ganha 91 reais de Bolsa-Família, e como o “doador-milionário” Pedro Rodrigues, que deu modestos R$ 75 reais – e não milhões de reais – à candidata humilde.
Moralidade, no Brasil, só existe nos milhões da mídia, do Dória, do “mercado”.
Jogaram pedra na Geni
Bernardo Mello Franco, na Folha
A notícia foi divulgada pelo Tribunal Superior Eleitoral: uma beneficiária do Bolsa Família doou R$ 75 milhões a uma campanha política. Com ar de escândalo, a corte listou o caso entre os “indícios de irregularidades mais relevantes” do primeiro turno.
Ao avisar a imprensa, o TSE informou que “compartilhou imediatamente o material com o Ministério Público Eleitoral”. A corte também acionou o Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário para a abertura de uma investigação.
Rapidamente, vazou-se o nome da suspeita: Maria Geni do Nascimento. Ela se candidatou a vereadora pelo PDT em Santa Cruz da Baixa Verde, no sertão de Pernambuco. É lavradora, tem 56 anos e não completou o ensino médio.
Segundo o banco de dados da Justiça Eleitoral, Geni teria recebido, e não doado, os R$ 75 milhões. Mesmo assim, seu caso parecia perfeito para confirmar duas teses em voga: o cadastro do Bolsa Família é uma bagunça e o veto às doações de empresas levaria o caos às eleições.
O presidente do TSE, Gilmar Mendes, declarou em setembro que doações de beneficiários de programas sociais indicavam fraudes e crimes eleitorais. “Ou essa pessoa não deveria estar recebendo o Bolsa Família ou ocorre o fenômeno que chamamos de ‘caça-CPF’, que é a ideia de se manipular o CPF de alguém que está inocente”, disse o ministro.
Nesta terça (18), descobriu-se que Geni não era fraudadora nem laranja. Ela apenas errou ao preencher o sistema eletrônico e informar sua única ajuda de campanha: R$ 75, doados por um estudante que recebe auxílio-alimentação da universidade pública. “Ela digitou zeros demais”, explicou Raquel Salazar, da corregedoria do TRE de Pernambuco, ao “Jornal do Commercio”.
A assessoria do TSE me disse que cabe à candidata, e não ao tribunal, providenciar uma correção. Até aqui, nenhuma autoridade se desculpou com Geni. Ela levou pedradas de todos os lados, mas não se elegeu. Teve apenas 13 votos.
PS. Dona Geni, não se atreva a pedir uma indenização por danos morais contra o TSE. A sua honra não vale o mesmo que a das excelências, que cobram caro por ela aos blogs.
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