terça-feira, 7 de março de 2017

Na era Temer, o desmanche iniciado por FHC se aprofunda

Por Carlos Drummond de Andrade

Da Carta Capital // http://www.carosamigos.com.br/

Após dois anos de recessão, corte generalizado do gasto público, contenção do crédito e redução das exigências para a venda e a concessão de ativos do Estado, aumentam os indícios de que o governo Temer tornará o Brasil ainda mais frágil para seguir rumo próprio na economia e mais vulnerável no contexto global.
O pacote em preparação para atrair, segundo os jornais, 370 bilhões de reais em investimentos em dez anos não parece obedecer a outra estratégia além de austeridade na proteção social e facilidade na transferência do controle de ativos do Estado para investidores particulares, principalmente estrangeiros. 

“A combinação de tudo isso só tem um resultado possível: o esfarelamento de nossa soberania e a elevação sem precedentes da vulnerabilidade do País e do seu atrelamento a interesses que não são nossos, menos ainda da população pobre”, alerta a professora de economia da USP, Leda Paulani.
Faz parte do frenesi privatizante e desnacionalizante o condicionamento da liberação de recursos a estados e municípios em crise à venda de empresas públicas locais. Na segunda-feira 20, a Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro aprovou o projeto de oferta à iniciativa privada da companhia estadual de saneamento, a Cedae, medida exigida pelo Ministério da Fazenda para aprovar a ajuda federal. No mesmo dia, o governo definiu uma norma geral para casos do tipo.
O estado candidato ao recebimento de recursos deverá antes aprovar lei para autorizar a desestatização de instituições financeiras e empresas de energia e saneamento, as mais atraentes para o mercado mundial, e destinar as receitas ao abatimento de dívidas.
Segundo denúncias de sindicalistas, mudanças estruturais aceleradas preparam o Banco do Estado do Rio Grande do Sul, o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal para a privatização. O governo gaúcho foi avisado, só terá dinheiro quando vender o Banrisul, instituição rentável que põe em xeque o dogma neoliberal da ineficiência da gestão estatal.
A interrupção do movimento para vender aos poucos a CEF, no período de  Dilma Rousseff, teria irritado ao extremo alguns barões das finanças interessados no filé dos bancos públicos. Do furor atual nem o BNDES estaria a salvo, comenta-se no setor.
Em alguns estados e municípios, nem foi preciso recorrer ao toma lá dá cá. Geraldo Alkmin há muito declarou-se favorável à privatização parcial do Metrô de São Paulo e João Doria Jr. anunciou, em vídeo apresentado primeiro em Dubai, a oferta de 47 empresas e bens públicos da capital, de cemitérios e linhas de ônibus a símbolos da cidade como o Estádio do Pacaembu e o Parque do Ibirapuera.  
 A ação do governo conta também com a ajuda de parte do Judiciário e do Ministério Público. Não há o menor indício, na Lava Jato, de separação entre o combate à corrupção e a inviabilização das grandes construtoras nacionais integrantes da cadeia produtiva da Petrobras, a mais importante do País.

A indiferenciação é esdrúxula, se a referência for o comportamento da Justiça na Europa e nos Estados Unidos em casos semelhantes, mas encontra complemento perfeito na decisão do presidente da Petrobras, Pedro Parente, de facultar a concorrência de fornecedores de plataformas apenas às competidoras estrangeiras das empreiteiras.
A manobra está longe de garantir imunidade à corrupção, se é que esta era uma preocupação. Figuram entre as candidatas a espanhola Acciona, a inglesa Amec Foster Wheeler e a estadunidense Chicago Bridge & Iron Company, envolvidas em escândalos de corrupção em seus países de origem. 
O Legislativo contracena também com o Executivo no desmonte, viu-se na aprovação da PEC dos gastos, que comprime recursos públicos e escancara a saúde e a educação para investimentos privados, locais e estrangeiros. O governo pressiona agora os parlamentares para a aprovação da reforma da Previdência, outra porteira a se abrir às múltis. 
Quatro quintos do investimento esperado no plano do governo proviriam da venda de ativos nacionais, sendo 70 bilhões de reais em terras, segundo projeto revelado em primeira mão por CartaCapital, e 300 bilhões em consequência da provável mudança das exigências de conteúdo local nas plataformas e navios de exploração de petróleo e gás, em discussão entre a Petrobras e as fornecedoras locais.
Na terça-feira 21, a empresa brasileira Brasil Amarras conseguiu barrar na Justiça a contratação, pela Petrobras, da concorrente chinesa Asian Star Anchor Chain, que descumpriu a exigência de conteúdo local mínimo em equipamentos para seis plataformas do pré-sal.
Nas telecomunicações, um projeto de lei sustado temporariamente por senadores da oposição permitirá ao governo, a título de modernizar as normas do setor, transferir em definitivo ao menos 20 bilhões de reais em bens dos contribuintes às empresas privadas e perdoar valor igual em multas.

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