A crise do presidencialismo de coalizão nasceu de uma semeadura persistente, de escândalos históricos do mundo político, reiterados, repetidos, que jamais foram enfrentados pelas instituições e pelos partidos hegemônicos, nem pelo PSDB, nem pelo PT. A Lava Jato explodiu em cima de um campo minado. Foi apenas uma questão de tempo para tudo vir abaixo.
A próxima crise institucional já tem um personagem à vista: o Poder Judiciário. Nos últimos anos, a arrogância, o corporativismo, o protagonismo político, a falta de sensibilidade das principais lideranças gerou bolhas de desconfiança, que explodirão assim que Executivo e Legislativo se livrarem da organização criminosa que os controla atualmente e recuperarem um mínimo de legitimidade.
Recentemente, um artigo demolidor do jurista Conrado Hubner, contra o STF, conseguiu a unanimidade, tanto entre defensores quanto críticos da Lava Jato, comprovando o grau de desmoralização da mais alta Corte.
Peça 1 – o Supremo Tribunal Federal
Há tempos o STF perdeu completamente o sentido de colegiado. São onze Ministros, cada um por si, vários deles valendo-se de todas as espertezas processuais para impor a sua opinião, com o uso de recursos execráveis, como o pedido de vista a perder de vista, ou críticas diretas aos colegas com os quais não concordam.
Ontem, a patética Ministra Carmen Lúcia, em sua performance mensal ao Jornal Nacional, bradou:
"É inaceitável agredir a Justiça. Pode-se ser favorável ou desfavorável à decisão judicial. Pode-se procurar reformar a decisão judicial pelos meios legais e nos juízos competentes. O que é inadmissível e inaceitável é desacatar a Justiça, agravá-la ou agredi-la. Justiça individual, fora do direito, não é justiça, senão vingança ou ato de força pessoal”.
A quem ela se referia, senão aos seus colegas de Supremo, que investem contra os próprios colegas quando perdem uma votação.
Um dos pontos maiores de abuso é justamente o poder arbitrário dos Ministros, de paralisar uma votação com um simples pedido de vista ou engavetando o caso.
Dentre todos os escândalos de pedidos de vista e de esconder processos, nenhum foi mais maléfico para o país que o da Ministra Carmen Lúcia ao esconder, desde 21 de abril de 2013, a ADIN 4234 (http://migre.me/vkVNY), que trata a questão da patente pipeline.
Pipeline é uma brecha que Fernando Henrique Cardoso deixou na Lei de Patentes, permitindo aos laboratórios farmacêuticos repatentear medicamentos cuja patente já havia vencido.
A ADIN foi proposta pela Federação Nacional dos Farmacêuticos, em cima das decisões da Rodada Uruguai da OMC (Organização Mundial do Comércio), que permitia corrigir esse monstrengo legal. E sua aprovação baratearia substancialmente as compras de remédios pelo SUS, beneficiando toda a população.
A Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC) do Ministério Público Federal entrou como amicus curiae. Nada demoveu Carmen Lúcia, que continua segurando até hoje a ADIN, beneficiando exclusivamente grandes laboratórios multinacionais, em detrimento da população e do orçamento público. E jamais veio a público explicar sua decisão. Só há uma explicação para essa atitude dela, e nem ouso pensar qual seja.
Peça 2 – os clãs do Judiciário
Os problemas do Judiciário se esparram pelos demais tribunais.
Apesar do sistema de concursos e de promoções, o Judiciário é o poder que mais está contaminado pelos “clãs familiares”. O casal Marcelo Bretas apenas expôs uma ponta do problema, ao exigir dois auxílios-moradia, morando juntos. Casal de juízes ou juiz-promotora e vice-versa são comuns nos Judiciários estaduais e nas varas de trabalho.
Nem se diga do Ministro Luiz Fux e da maneira como transformou sua filha em desembargadora. Ou dos Zveiter no Rio de Janeiro.
Há um nebuloso sistema de filtros de acesso ao Judiciário, onde quem está dentro puxa quem está fora com relativa facilidade, passando por concursos que são controlados pelo próprio Judiciário.
O acesso é muito mais fácil quando o candidato já tem alguém dentro do sistema. Os quase 400 desembargadores do Tribunal de Justiça de São Paulo têm cada qual o seu gabinete com até 20 “auxiliares” e “estagiários”, indicados pelo próprio desembargador, muitos deles com jogos de indicação cruzada – um indicando o parente do outro.
Dentro dos gabinetes, facilmente enturmam e conseguem aplainar o caminho para os concursos. O mesmo acontece com outras profissões que, no entanto, não tem poder de Estado.
Mais visível tem sido o trabalho de escritórios de advocacia tendo como titulares parentes atuando nos próprios tribunais em que trabalham os magistrados.
Peça 3 – o sindicalismo no Judiciário
Outro processo de degeneração de poder dentro do Judiciário é a sindicalização de juízes, algo que provavelmente só existe no Brasil.
Juiz já tem poderes excepcionais. Não tem lógica ter sindicatos, um mecanismo de proteção que só se aplica para quem não tem poder individual, como um operário.
Há muitas e muitas Associações de Juízes, cuja única plataforma é pleitear e proteger benefícios e privilégios.
Essas associações são uma ameaça à cidadania. E deveriam ser sumariamente proibidas por lei da mesma forma que não é permitida a sindicalização oficial ou disfarçada para integrantes da ativa das forças armadas. Seria aumentar o poder de quem já tem poder.
Peça 4 – um poder cego
Assim como o sistema político, a corporação do Judiciário não é dotada de inteligência estratégica. Não há think tanks capazes de pensar o poder institucionalmente, os fatores de risco futuros, entender as oportunidades e ameaças, exercer um poder moderador de apetites e de arrogância. E qualquer alerta sobre os riscos futuros é tratada como agressão à classe, que não demonstra nenhuma abertura a novas ideias ou mesmo a discutir seu futuro.
Em suma, o Judiciário é a peça mais intrincada desse grande jogo de xadrez que o país precisa vencer, rumo à modernidade.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
12