sábado, 10 de março de 2018

Rússia e China trabalham juntas pela Rota Polar da Seda

O diário britânico Financial Times, porta-voz do caduco neoliberalismo global, ao defender seus interesses plutocráticos, amarra navalhas entre Rússia e China pelo controle da criativa Rota Polar da Seda, enquanto o muito bem informado portal russo Sputnik revela a coordenação entre Moscou e Pequim

Por Alfredo Jalife-Rahme - La Jornada 


A Rússia trabalha para se acoplar às três rotas da seda da China: 1) a continental, vinculado com a Europa por meio da Ásia Central e da Rússia, 2) a marítima, que une o sudeste asiático e a África oriental, e 3) a polar.

Alexandr Lomanov, do Instituto do Oriente Distante, aponta as instituições que estabelecem a convergência dos três relevantes projetos: a União Econômica Euroasiática (UEE), a Organização de Cooperação de Shanghai e a Associação de Nações do Sudeste Asiático. Para ele, “a União Europeia (UE) poderia ser um dos motores da integração global, graças ao seu poder financeiro e científico, e também por sua experiência administrativa em projetos de integração”. Porém, ele também acredita que “ a UE se afastou destas oportunidades, ao parecer por razões ideológicas. Sua renúncia à cooperação direta com a UEE tem a ver com um preconceito ideológico contra a China”.

O czar Vlady Putin declarou que “a Rússia deve garantir a segurança militar e ecológica no Ártico”. Não é um detalhe menor, já que o Ártico é um dos pontos mais próximos numa hipotética e devastadora briga nuclear entre Rússia e Estados Unidos. A infraestrutura militar do complexo do ártico da Rússia – com uma superfície de 14 mil metros quadrados – ostenta suas armas mais avançadas. A Rússia é o único país do mundo que dispõe de bases militares no Ártico. A região ártica possui abundantes recursos minerais e, segundo Putin, os projetos extrativos deverão se apegar às normas ambientais, as mesmas que Trump desdenha.

A presença militar russa comporta três objetivos: 1) acesso exclusivo à rota marítima do Norte, que é uma das rotas comerciais mais importantes do mundo, 2) defender suas jazidas de petróleo e gás no Ártico, o que gera tensões com Estados Unidos, Canadá, Islândia, Noruega, Suécia, Finlândia e Dinamarca, e 3) proteger sua fronteira norte, através dos seus sistemas de defesa antimísseis e da frota do norte na zona.

Cerca de 85% do gás e 11% do petróleo que a Rússia produz provêm da zona ártica, onde dispõe de quase 50 centros de hidrocarbonetos.

A Rota Polar da Seda poderia provocar uma nova ordem mundial. Segundo Vladimir Remiga, presidente do Conselho Coordenador do Congresso Internacional de Industriais e Empresários, a iniciativa de criar a UEE e liga-la ao projeto da Rota Polar da Seda Continental da China está se transformando numa iniciativa verdadeiramente global, capaz de mudar radicalmente a ordem mundial existente.

Segundo a imprensa chinesa, a iniciativa da Rota Polar da Seda vem do governo russo. Segundo a agência Sputnik, essa rota é considerada o terceiro caminho da iniciativa proposta pela China: cruza o círculo polar ártico, que conecta três grandes centros econômicos: América do Norte, Ásia oriental e Europa ocidental. E destaca que essa configuração deixaria a América Latina muito para trás, abandonada nas mãos de Deus.

O desenvolvimento conjunto dos campos de petróleo e gás, a construção de instalações de infraestrutura, ferrovias e portos marítimos, serve aos interesses da Rússia e da China. Para Remiga, a principal área de cooperação é o desenvolvimento da infraestrutura da roa marítima do Norte e a organização de seu transporte de carga, para tornar esta rota uma artéria competitiva de transporte global.

A rota marítima do Norte é considerada pela China como a parte mais importante da Rota Polar da Seda, cujo potencial reduzirá o custo anual do comércio marítimo internacional em até 127 bilhões de dólares até 2020. Para Remiga, China e Rússia negociam a criação de uma empresa conjunta para construir buques de carga de gelo e modernizar portos e infraestrutura geral de navegação. Toda uma revolução do transporte na Eurásia!

Putin, que joga magistralmente o xadrez geoestratégico, já havia formulado a ideia de compartilhar com a China a revolução do transporte na Eurásia. Andrei Volodin, da Academia Diplomática do Ministério de Assuntos Exteriores, comentou que a Rússia é um corredor de transporte essencial entre o Leste e o Oeste. E o Leste não inclui somente a China como também toda a região da Ásia e do Pacífico, incluindo o nordeste e o sudeste asiático.

Ekaterina Arápova, especialista em relações exteriores, defende que o grande tripé – a aliança euroasiática com países da UEE, a Organização de Cooperação de Shanghai e a Associação de Nações do Sudeste Asiático – está entre as prioridades da China. Se trata da oxigenação da China devido ao assédio dos Estados Unidos. Segundo Arápova, a China entende que a situação no mercado de trabalho a longo prazo pode chegar a ser bastante tensa. Devido à introdução de tecnologias de economia de mão de obra, existe o risco de que muitos chineses fiquem sem trabalho em algum momento futuro. O país deve tentar compensar esta situação proporcionando emprego no exterior, com a implementação de projetos a grande escala. Arápova concluiu que a iniciativa russa de uma grande aliança euroasiática coincide com os interesses da China.

Para Alexandr Gabúev, do Centro Carnegie de Moscou, existem duas etapas na colaboração entre a Rússia e a China: 1) chegar a um acordo sobre a eliminação das barreiras e a melhora dos termos de comércio, e 2) a redução mútua de tarifas”. Ele acha que o efeito mais provável do emparelhamento da UEE com o projeto da Rota Polar da Seda se verá somente daqui a dez anos. São projetos geoestratégicos de médio prazo.

A rota marítima do Norte permitirá à China entregar seus carregamentos à Europa mais rapidamente, ao reduzir o trajeto em até 30% e economizar combustível e recursos humanos. Como 90% dos produtos chineses são transportados por via marítima, a Rota Polar da Seda promete dar a Pequim um aumento mais que significativo dos benefícios.

Claro que a China também busca os seus próprios interesses, além da economia em transporte. Não faltam os que supões que esta expansão representa uma ameaça. Segundo Ivan Andrievski, primeiro vice-presidente da União de Engenheiros da Rússia, “teoricamente, pode haver conflitos no futuro, como um maior derretimento dos gelos e um crescimento das ambições militares da China. Mas no momento estas ameaças são exageradas”.

Contudo, também há outra ameaça, que tem a ver com os esquemas desestabilizadores que podem ser provocados pela dupla Estados Unidos e Grã-Bretanha, que seriam os grandes perdedores dessa nova jogada geopolítica.

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