sábado, 4 de maio de 2019

FIAT + ditadura: o MPF vai investigar


Leandro Demori
The Intercept Brasi

Na semana passada, nós falamos da Raissa. Nessa, eu quero falar da FIAT. São duas news seguidas sobre impacto do trabalho do TIB, e acho que devo compartilhar essas coisas com vocês quase como um dever por todo apoio que estamos recebendo.

O Ministério Público Federal em Minas Gerais abriu um inquérito civil para apurar a eventual responsabilidade da Fiat Automóveis do Brasil na violação de direitos humanos durante a ditadura militar brasileira. A empresa, como vocês devem ter lido na nossa reportagem publicada em fevereiro, colaborou com os órgãos de repressão do Estado.

Eu e os repórteres Janaína Cesar, Pedro Grossi e Alessia Cerantola levamos mais de ano para descobrir documentos e pessoas ainda vivas que nos contaram a história sonegada pela empresa no Brasil. Papéis inéditos levantados junto ao Arquivo Público Mineiro e no arquivo da empresa em Turim indicam conversas entre o aparato repressor do Estado e uma gigantesca estrutura interna e secreta de espionagem, comandada por um coronel da reserva do Exército dentro da montadora. Ao ajudar os militares, a Fiat recebia informações sobre o movimento sindical para reprimi-lo e evitar a queda de produtividade.

A Janaína e o Pedro ligaram esta semana para o procurador da República Tarcísio Henriques Filho, responsável pela investigação em Minas. Ele disse que "iniciativas que resgatam a memória do país são fundamentais, porque um povo que não tem memória está fadado a repetir seus erros". No inquérito civil, ele escreve que a Fiat operou uma “aliança empresarial-policial, estabelecida durante o período, e que transformou-se em aliança empresarial-policial-militar, definindo um novo regime fabril” para a empresa. Um jogo de ganha-ganha entre a Fiat e os porões do terror.

Tarcísio Henriques falou sobre o procedimento da Corte Interamericana dos Direitos Humanos para que o “Brasil continue a buscar, sistematizar e publicar toda informação relativa a violações de direitos humanos ocorridas durante o regime militar”. Com nossa reportagem em mãos, ele se viu no dever de agir. 

Durante a conversa, Henriques explicou que as diligências serão conduzidas pela Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão em Minas Gerais pelos próximos quatro meses. 

A FIAT não é a única multinacional investigada por colaborar com a ditadura militar brasileira. A Volkswagen do Brasil, em 2017, admitiu que apoiou o regime. A montadora alemã foi denunciada pelo MPF por violações de direitos humanos.

Falamos também com o Pedro Dallari, advogado e um dos coordenadores da Comissão Nacional da Verdade. Queríamos dar a notícia em primeira mão. “Vejo com muita satisfação a iniciativa do Ministério Público Federal em abrir esse inquérito baseado na reportagem do Intercept”, ele nos disse. “Eu sempre falei que o relatório da CNV não era um começo e nem um fim, tínhamos clareza que nosso trabalho ajudaria futuras investigações.”

Nós compartilhamos com o MP todos os documentos que encontramos durante nosso trabalho. Esperamos que sejam usados para dar justiça aos funcionários que ainda estão vivos e a honrar a memória dos que já se foram.
Editor Executivo

Nenhum comentário:

Postar um comentário

12