Jair Bolsonaro e Paulo Guedes (Foto: Isac Nobrega/PR)
O governo Bolsonaro, com seu lugar-tenente Paulo Guedes, está matando as contradições políticas. Esmagou-se a luta de classes. Há dominação absoluta de classe
Não há estímulo algum para discutir economia política no Brasil atualmente. O sistema de poder – ou seja, Executivo, Judiciário, Ministério Público e Legislativo - está cristalizado em torno da ideia central do neoliberalismo, segundo a qual o livre mercado resolve todos os problemas econômicos e sociais. Portanto, segundo eles, as duas grandes qualidades morais que devemos expressar, em face da economia, são as de paciência e “confiança”.
A economia política trata de relações de poder por trás dos processos econômicos. Em tese, a vida política deveria ser, essencialmente, uma disputa de valores econômicos, colocando, de um lado, os trabalhadores e o povo em geral, e do outro a classe dominante proprietária. Ora, o governo Bolsonaro, com seu lugar-tenente Paulo Guedes, está matando as contradições políticas. Esmagou-se a luta de classes. Há dominação absoluta de classe.
Nos primórdios do socialismo, ali pelos idos do século XIX e primeiras décadas do século XX, a aspiração de alguns revolucionários sociais era a ditadura do proletariado, que se materializaria na tentativa soviética nesse sentido. É claro que não foi exatamente uma ditadura de classe. Ela foi evoluindo para um sistema burocrático rígido que acabou matando a criatividade do povo. De qualquer forma, as contradições foram esmagadas a ferro e fogo.
Visto do ângulo civilizatório o grande mérito soviético foi ter forçado uma síntese política em confronto com o liberalismo radical anterior aos anos 30. Essa síntese tomou a forma de estado do bem-estar social, o qual se generalizou no pós-guerra na Europa Ocidental, na Austrália, na Nova Zelândia e, em menor escala, nos Estados Unidos. Tanto em termos ideológicos quanto práticos representou certo equilíbrio entre liberalismo e socialismo.
A ideia de uma ditadura de classe reapareceu no Ocidente, na medida em que a União Soviética sucumbia, na forma de neoliberalismo econômico. Ditadura, sim, mas ao contrário de uma ditadura do proletariado ressurgiu como uma proposta camuflada de ditadura da classe dominante econômica. Vivemos esse momento, mas a forma como processo se manifesta na prática depende, sobretudo, da estrutura dos meios de comunicação.
Onde existe pluralidade e efetiva competição entre meios de comunicação as idéias circulam com certa liberdade e o sistema de poder político se torna permeável à opinião pública. A democracia de cidadania ampliada (direito de voto), mãe das demandas sociais desde fins do século XIX, reagiu e continua reagindo, por seus líderes, ao neoliberalismo econômico, de forma a impedir o triunfo definitivo dessa seita hegemônica.
No Brasil a situação é mais complexa. Temos uma democracia deformada por meios de comunicação monopolizados ou oligopolizados que se vendem para subordinar ideologicamente os interesses sociais aos interesses das classes dominantes econômicas. Os ricos tem também a seu serviço elementos das classes médias elevadas, ou políticos cooptados no sistema eleitoral pelas classes dominantes, através dos meios de comunicação.
Nesse sentido estamos, no momento atual, sob uma ditadura de classe, na qual os poderes da República operam na mesma direção contrária ao interesse público geral. Quando o Supremo autoriza a venda sem licitação de subsidiárias da Petrobrás e o Congresso se omite, e de fato respalda decisão monocrática do Executivo, ele atende exclusivamente ao interesse do capital, sobretudo do capital internacional, sem uma única crítica da grande mídia.
É claro que as tensões criadas nesse processo dialético um dia vão explodir e produzir resultados. Creio que isso se dará por influência dos novos meios de comunicação, quando a sociedade conseguir distinguir entre manipulação do poder e verdade. A grande onda democrática que surgiu no início do século XX, produzindo ao longo do tempo espetaculares resultados sociais, em algum momento retornará sobre si mesma produzindo nova síntese.
A experiência brasileira será pedagógica nesse processo. Nós não estamos sendo conduzidos ao neoliberalismo como um fato novo. A novidade é a radicalização. Quanto mais radical tem sido a radicalização econômica, maior será a reação política, proporcional ao fracasso inevitável do modelo (negativo) adotado. Só haverá uma vantagem nisso: a sociedade perderá o escrúpulo de propor a subordinação completa do capital aos interesses sociais.
Jose Carlos de Assis
Economista, doutor em Engenharia de Produção pela Coppe-UFRJ, professor de Economia Internacional da UEPB
Economista, doutor em Engenharia de Produção pela Coppe-UFRJ, professor de Economia Internacional da UEPB
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