sexta-feira, 19 de novembro de 2021

Adolfo Pérez Esquivel: "Macri ficaria feliz com a bandeira dos Estados Unidos em nosso país"

Fontes: Agência Paco Urondo

Por Juan Borges
https://rebelion.org/

O ganhador do Prêmio Nobel da Paz e ativista em defesa dos direitos humanos conversou com AGENCIA PACO URONDO e analisou várias questões relacionadas à sua carreira na proteção dos direitos humanos.

O ganhador do Prêmio Nobel da Paz e ativista em defesa dos direitos humanos, Adolfo Pérez Esquivel, conversou com AGENCIA PACO URONDO e analisou diversos temas relacionados à sua carreira ligada à proteção dos direitos humanos.

AGENCIA PACO URONDO: Se você tivesse que fazer uma definição sobre você, como você se definiria?

Adolfo Pérez Esquivel: Eu me defino simplesmente como um ser humano. Quem tenta aprender a viver. Buscando me alimentar dos setores populares e da maior diversidade que habita o mundo. Eu nunca quis construir um personagem em minha pessoa verdadeira. Muitos se escondem atrás dos personagens. Eles são simplesmente construções irreais, são atores que são tratados dessa forma. Sempre procuro ser simplesmente uma pessoa. Exatamente o oposto de ser um personagem.

APU: Como você avalia a sua experiência nos anos 70?

APE: Os anos 1970 expressam o que já acontecia muito antes na América Latina. Ditaduras militares, opressão, pobreza. Esses mesmos males que atormentaram o continente durante séculos. Porém, com o surgimento das ditaduras promovidas pelos Estados Unidos para consolidar seu domínio. Sua ferramenta ideológica foi a Doutrina de Segurança Nacional. Essas práticas produziram danos profundos que com o tempo se tornaram irreparáveis. Devemos primeiro buscar resistência e consciência do que estava acontecendo. Mais tarde a organização chegaria diante daquela barbárie que estava passando por nós. A humanidade estava em perigo e era necessário fazer algo para detê-lo. Infelizmente, teve um alto custo humano, Porém, tivemos a capacidade de nos unir e gerar unidade nas cidades para acabar com toda aquela barbárie. Fizemos parte desse processo, sofremos exílio, perseguições, prisões, torturas, as fugas da morte. Somos sobreviventes de um genocídio que foi cometido em nosso país, mas também em todo o continente latino-americano.

APU. Como você vê à distância ter recebido o Prêmio Nobel da Paz?

APE: Já se passaram 41 anos desde que o recebi e sempre o vi como um instrumento ao serviço dos povos. A ideia sempre foi que serviria para a luta pela paz e justiça por parte dos povos. Esse é o único propósito desse prêmio. Nunca o vi como meu. Tanto é que o assumi em nome dos povos latino-americanos. Em nome dos indígenas, camponeses, homens e mulheres das cidades. Ele está atualmente na casa dos ganhadores do Prêmio Nobel da América Latina. Em nossa sede de resistência onde todos os prêmios são recolhidos em favor dos povos latino-americanos. Acho que é o melhor lugar onde eles deveriam estar.

APU: Como o senhor analisa a situação dos direitos humanos em nosso país nos últimos anos?

APE: Hoje vejo um governo que faz todo o possível para defender os direitos humanos e todos os direitos em geral. No entanto, é necessário compreender a questão dos direitos humanos de um ponto de vista mais abrangente. Não apenas os episódios de tortura, desaparecimentos e mortes. É necessário incluir também os problemas de meio ambiente, desenvolvimento e autodeterminação dos povos. Nestes aspectos temos nossas fraquezas. A democracia é uma construção. Estamos em um processo de construção da democracia que não é fácil. O macroismo devastou o país. É também um governo que causou muitos danos a nível continental. Apoio ao golpe contra Evo Morales na Bolívia. Colabore com todas as tentativas desestabilizadoras contra a Venezuela. Boicote todas as empresas venezuelanas em nosso país. Macri tem uma mentalidade colonial. Eu ficaria muito feliz em colocar o emblema da bandeira dos Estados Unidos em nosso país. Isso é muito sério. Isso nos deixa uma dívida externa imoral e injusta. O FMI (fundo monetário internacional) pressiona o país para que faça uma negociação que o favoreça. É preciso reverter a grave situação que o governo anterior nos deixou.

APU: Qual deve ser o caminho a seguir para reverter essa situação?

APE: Devemos restaurar a soberania e fortalecer a democracia. É preciso fortalecer os direitos populares. A Argentina é um país empobrecido pelas políticas neoliberais. A entrega do patrimônio nacional em mãos de empresas estrangeiras. É preciso encontrar novas formas de fazer política para construir algo diferente do que vivemos. Essa empresa exigirá muito tempo e muito esforço. É o caminho a seguir.

APU: Como você analisa o avanço da direita em nível global?

APE: Infelizmente, esse avanço da direita não acontece apenas aqui, mas também em todo o mundo. Isso é consequência da apropriação da palavra, da linguagem dos povos. No Brasil com Bolsonaro, no Chile com Piñera. Mas também em países europeus, na África. É preciso aprofundar muito os aspectos de consciência dos povos. Fundamentalmente as novas gerações que não viveram ditaduras. A resistência cultural também é vital. Eles alcançaram uma dominação cultural que deve ser transformada e receber um conteúdo diferente. A direita sempre busca uma forma de penetrar na imensa população para manipulá-la. A saída passa pela resistência cultural, a consciência crítica, a educação como prática de liberdade são essenciais para evitar aqueles desvios que sempre terminam em violência.

APU: O que você considera ser a raiz da violência institucional hoje?

APE: Sem dúvida existe violência social, mas também existe aquela que é estrutural. Grande parte da violência sofrida pelos jovens nos bairros é impulsionada pela mídia. Eles são os geradores de violência em muitas ocasiões. Promoção da discriminação e estigmatização de setores empobrecidos. Não há um olhar crítico sobre a raiz da pobreza. A condenação social daqueles setores humildes que hoje sofrem é mais fácil.

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