sexta-feira, 16 de setembro de 2022

A lógica política do xingamento

Josef Herman, Esboço de uma mulher, sem data.

Por JORGE ALEMÁN*

Somente existe um jeito de dobrar a potência do xingamento até o máximo e é prolongá-lo com a ameaça de morte

O xingamento é o invento da linguagem para interromper qualquer diálogo.

O xingamento não se direciona à palavra do outro, como a seu ser.

Direciona-se ao ser no sentido amplo do termo: à sua história, ao seu corpo, à sua existência em tanto valor de vida.

Somente existe um jeito de dobrar a potência do xingamento até o máximo e é prolongá-lo com a ameaça de morte.

Com a ameaça de morte suspende-se o pacto mínimo: o de continuar com a palavra.

Se a ameaça de morte se estende ao espaço democrático ele desapresse e passa a ter lugar o estado de exceção.

O neoliberalismo, na sua interpretação e no exercício do poder, já não tem condições de legitimar-se democraticamente. E isto por razões estruturais. Seu plano de apropriação e exploração de uma nação exige a permanente prática do ódio, o xingamento e a ameaça. Para isso conta com um grande número de sujeitos devastados simbolicamente cuja única identidade possível somente se conquista através destas práticas. É só questão de recrutá-los.

Logo, os políticos neoliberais e seus dispositivos da mídia se encarregam da operação perversa. Primeiro bater de frente, depois semear a dúvida sobre a existência do machucado, por último culpar à própria vítima pelo dano ocorrido. Obviamente, esta sequência se “espetaculariza” na mídia com diferentes estratégias dramáticas.

Os quadros políticos atuais decididos a combater este estado de coisas, que sem dúvida contam com uma grande usina internacional, devem analisar estas estratégias como sendo uma análise que forma parte de sua militância. Pois apesar de apresentarem-se como relatos, no seu cerne habita uma maquinaria de destruição sistemática da democracia.

*Jorge Alemán é psicanalista e escritor. Autor, entre outros livros, de Capitalismo: crimen perfecto o emancipación (Ned Ediciones).

Tradução: María Cecilia Ipar.

Publicado originalmente no jornal Página 12.

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