terça-feira, 5 de dezembro de 2023

SANEAMENTO BÁSICO - Privatização da Sabesp é injustificável

Foto: Reprodução/Facebook

Venda da companhia de saneamento básico de São Paulo deve provocar aumento da tarifa e piora na prestação de serviço

Guilherme Cortez

O governo Tarcísio enviou para a Assembleia Legislativa de São Paulo o famigerado projeto de privatização da Sabesp. Embora escassa em tamanho e tempo para tramitação – são apenas dez artigos enviados para discussão em regime de urgência –, a proposta impacta por completo um dos serviços públicos mais estratégicos do estado, o saneamento básico.

A Sabesp completou cinquenta anos em 2023. Atualmente ela é responsável por fornecer tratamento de água e coleta esgoto para mais de 28 milhões de pessoas em 375 cidades do estado – das quais já conseguiu universalizar o serviço em 310. É uma empresa lucrativa, que só em 2022 teve um lucro de R$ 3 bilhões a mais do que no ano anterior.

Apesar disso, a desestatização da companhia é uma ideia fixa do governador Tarcísio. Durante a campanha eleitoral, ele até ensaiou repensar o projeto para não perder votos para Fernando Haddad, mas desde que tomou posse colocou em marcha a proposta. Criou um grupo de trabalho para estudar a privatização da empresa e contratou um suspeito estudo com uma consultoria do Banco Mundial, sem licitação. O valor do contrato admitia duas hipóteses: a consultoria receberia R$ 8 milhões se concluísse que a privatização era inviável e R$ 45 milhões se fosse favorável. O resultado do estudo, de apenas 71 páginas, é óbvio.

No entanto, nem muito bem pago o Banco Mundial conseguiu confirmar o argumento que Tarcísio queria: o de que a privatização reduziria o valor da conta. O estudo concluiu que o Estado precisaria continuar subsidiando a tarifa para segurar o valor e sugere usar o dinheiro da própria venda da Sabesp para isso. Não explica como evitar o aumento quando esse dinheiro acabar.

A privatização da Sabesp é questionável por diversos motivos. Constitucionalmente, porque a Constituição estadual prevê que o saneamento básico deve ser gerido por concessionária sob controle acionário do Estado. Eticamente, porque o acesso à água e saneamento básico são condições essenciais para a vida e saúde humanas e sua transferência para as mãos da iniciativa privada é no mínimo temerária. Ecologicamente, porque num contexto de avanço das mudanças climáticas, o mundo inteiro está buscando aumentar o controle público sobre recursos naturais estratégicos, e não diminuir.

Das 375 cidades que a companhia atende, não mais do que 20 são lhe trazem lucro. A imensa maioria depende do financiamento cruzado que a empresa faz, usando a receita obtida na região metropolitana para investir nas cidades menores. É o que garante o acesso ao saneamento básico de cidades de até 200 mil habitantes. A lógica da iniciativa privada é outra. É difícil imaginar que um acionista privado gostaria de perder o próprio dinheiro para investir em uma cidade de menos de 10 mil habitantes.

Um exemplo de como atua a iniciativa privada foi explicitado durante o temporal que atingiu São Paulo no começo de novembro, deixando 2 milhões de pessoas sem energia elétrica por conta da negligência da concessionária Enel. Apesar de ter dobrado seu lucro em quatro anos, a empresa decidiu cortar 36% do seu quadro de funcionários para economizar custos. O resultado foi a absoluta inércia para atender os usuários, que sequer conseguiam falar nos canais de teleatendimento da empresa.

Carente de argumentos, o governo opta por acelerar a tramitação para evitar que novos acontecimentos voltem à opinião pública contra as privatizações, como é o caso da Enel e das falhas recorrentes nas linhas de trem administradas pela ViaMobilidade. Enquanto isso, a população vive a iminência de ver o valor da conta de água aumentar e o acesso à água sair da gestão pública.



Guilherme Cortez é deputado estadual de São Paulo pelo PSOL.

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