segunda-feira, 2 de setembro de 2024

Comunicação Estratégica EUA-China: um novo capítulo nas relações bilaterais

Jake Sullivan, conselheiro de Segurança Nacional dos EUA, e Xi Jinping, presidente da China (Foto: Presidência da China)

O conceito de "Coexistência Pacífica" foi um dos pilares da discussão entre as partes chinesa e estadunidense, destaca o editor internacional do Brasil 247

Por José Reinaldo Carvalho

A visita de Jake Sullivan, assessor especial do presidente Joe Biden para Segurança Nacional à China na semana passada marcou uma nova etapa nas complexas e frequentemente tensas relações entre as duas maiores economias do mundo. O encontro com o chanceler Wang Yi e o presidente Xi Jinping foi descrito como uma "comunicação estratégica", um termo que sugere a tentativa de ambos os lados de estabelecer um canal de diálogo que vá além das crises imediatas, mirando a estabilidade e o entendimento a longo prazo.

Numa situação em que as tensões comerciais, tecnológicas e militares entre os Estados Unidos e a China têm-se intensificado, foi notável o tom ameno das conversações. O presidente Xi Jinping enfatizou que a comunicação estratégica entre os dois países deve ser "estável, saudável e sustentável". O jornal Global Times, veículo ligado ao Partido Comunista da China, destacou: “A visita de Sullivan à China tem um significado especial na recente série de comunicações entre a China e os EUA. Isso marca a primeira visita à China de um assessor de Segurança Nacional dos EUA em oito anos, a primeira visita de Sullivan à China e um passo importante na implementação do consenso alcançado pelos dois chefes de Estado em São Francisco. Também testemunha o papel crucial que o canal de comunicação estratégica entre o Diretor do Escritório da Comissão Central de Relações Exteriores da China e o assessor especial da Casa Branca continua a desempenhar. Dados os resultados positivos alcançados por meio desse canal de comunicação estratégica no último ano e meio, tanto a China quanto os EUA depositaram certas expectativas positivas na visita de Sullivan.”

Estas considerações e os próprios adjetivos empregados não são meramente retóricos, mas apontam para a intenção chinesa de moldar as relações bilaterais em termos de previsibilidade e pragmatismo e no quadro da sua política de coexistência pacífica. Relações políticas estáveis e a manutenção da segurança coletiva e da paz são consideradas essenciais para a China levar adiante seu ciclo de modernização socialista .

Por esta razão, o conceito de "Coexistência Pacífica" foi um dos pilares da discussão. Essa noção, profundamente enraizada na política externa chinesa, demonstra que Pequim não busca confrontar Washington, mas sim coexistir em um cenário global multipolar onde as diferenças ideológicas e de sistema político sejam respeitadas. Durante as conversações com Sullivan, as autoridades chinesas trouxeram à tona o "Respeito Mútuo" e a "Cooperação Ganha-Ganha", reforçando a ideia de que qualquer progresso nas relações bilaterais deve ser baseado em benefícios mútuos, evitando a lógica de soma zero.

Um dos pontos centrais das discussões foi a questão de Taiwan, um tema que continua a ser a principal fonte de atrito entre a China e os Estados Unidos. A China foi enfática ao afirmar que a independência de Taiwan não é admissível. Este posicionamento não é novo, mas a ênfase dada ao tema durante as conversações reflete a crescente preocupação de Pequim com o aumento do apoio norte-americano a Taiwan, presente nas vendas de armas e nas visitas de alto nível de autoridades americanas à ilha.

Jake Sullivan reiterou que os Estados Unidos não apoiam a independência de Taiwan, o que pode ser visto como uma tentativa de acalmar as tensões e evitar um confronto direto. No entanto, a ambiguidade estratégica que tem caracterizado a política dos EUA em relação a Taiwan continua a ser um motivo de sérias divergências.

Outro conceito-chave discutido, segundo o que transpareceu dos relatos das reuniões realizadas durante a semana, foi o da "competição sem confrontação". Este termo pode ser interpretado como uma tentativa de ambos os lados de redefinir a dinâmica das suas interações.

Para a China, isso significa que, enquanto está determinada a defender sua soberania e seus interesses estratégicos, também está disposta a manter um diálogo construtivo com os Estados Unidos, com o objetivo de mitigar os riscos de escalada.

As discussões da semana passada, embora ainda incipientes, podem ter implicações significativas para as relações bilaterais e a conjuntura internacional. O fato de que ambos os lados estão engajados em uma comunicação estratégica sugere que, apesar das divergências, há um reconhecimento mútuo de que o confronto não é uma opção viável.

Entretanto, o caminho para uma relação verdadeiramente estável e sustentável é longo e repleto de desafios. A questão de Taiwan continuará a ser uma pedra no sapato das relações bilaterais, e a postura ambígua dos Estados Unidos em relação à ilha pode ser uma fonte contínua de tensões. Além disso, a competição tecnológica, particularmente no campo da inteligência artificial e da 5G, promete ser uma arena de disputa acirrada, onde cada lado tentará garantir sua superioridade. Ressalte-se ainda que o aspecto central da política externa estadunidense é a contenção estratégica da China, o que significa opor obstáculos ao desenvolvimento e ao protagonismo do gigante asiático nas relações econômicas e geopolíticas. Esta concepção tem por corolário a tomada de posição dos EUA na área militar de cerco à China, mormente na região da Ásia-Pacífico.

Para a China, porém, o direito ao desenvolvimento é um princípio irrenunciável. O desenvolvimento está intrinsecamente ligado aos anseios de bem-estar do povo chinês e à realização do sonho de revitalização nacional. É essencial para avançar na modernização socialista, que por sua vez é o objetivo central do aprofundamento da reforma abrangente, recentemente ratificado pela 3ª Sessão Plenária do 20º Comitê Central do Partido Comuista da China.

A última rodada de conversações entre o assessor de Segurança Nacional com o presidente e o chanceler da China, que também sinalizaram a necessidade de um novo encontro entre os respectivos chefes de Estado, e o desenvolvimento da comunicação estratégica são fatos novos na conjuntura internacional, principalmente quando a ideia de responsabilidades mútuas com a salvaguarda da segurança e da soberania esteve no centro dos entendimentos.



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