OEA, Donald Trump e Kamala Harris (Foto: Reuters)
'Nações e povos latino-americanos são reduzidos a caricaturas simplórias filtradas pela cartilha estadunidense de estigmatização', escreve Tiago Barbosa
Tiago Barbosa
Mas é invisível aos olhos da mídia brasileira - o inverso do império por quem baba e rasteja - apesar das intersecções históricas. A cobertura ostensiva da eleição norte-americana esfrega na cara o contraste abissal entre a viralatice pelos EUA e o desleixo regional. Matérias em solo estadunidense fuçam ruas, moradores, cidades minúsculas, caixas de correio, parquinhos, a rotina ordinária. Dedicam dias, horas e (vários) repórteres para imergir no estilo de vida e projetar empatia, fantasiar identificação junto à audiência. É panfleto de submissão vassala à idealização ideológica da farsa batizada de "sonho americano". As coberturas das eleições (e da vida) dos países vizinhos são o exato oposto - lampejos de simplificação e indiferença. O Brasil é privado da política do México, do Caribe, dos países andinos, à exceção de menções superficiais, ligeiras, insuficientes e raras. Inexistem abordagens sobre modos de organização social, dilemas, traços culturais e perspectivas de mundo. Nações e povos são reduzidos a caricaturas simplórias filtradas pela cartilha estadunidense de estigmatização de desafetos e catalogações democráticas. Cuba e Venezuela são - invariavelmente - vilões do noticiário, maus e detestáveis.
Chile, Peru e Equador padecem na penumbra do desconhecimento pelos brasileiros.
Bolívia surge na eclosão de rompantes políticos sob caracterização alinhada à agenda norte-americana ou europeia. A bifurcação entre saturação e esquecimento é um método - nunca casualidade. Invisibilizar os vizinhos é negar a história comum de povos unidos pela resistência corajosa à opressão colonial e religiosa. É repelir elos culturais na raiz de ideais de soberania, justiça social, igualdade e união contra dominação imperialista até hoje. Essa glorificação midiática e sabuja da "América dos sonhos" desnuda de vez o apagamento violento da América real.
Endeusa a irrealidade, lá fora, para sacrificar, por aqui, povos entre sombras e silêncios.
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