domingo, 8 de janeiro de 2017

Eu sou, mas quem não é? Se não tem culpa atire a primeira pedra!

JOSE CARLOS DE ASSIS // http://www.brasil247.com/
Jose Carlos de Assis

O sistema partidário brasileiro apodreceu. Isso não significa que a podridão resulte da atuação das massas de filiados, nem mesmo, individualmente, apenas das cúpulas partidárias. O que o Ministério Público ofereceu de provas para denegrir a imagem dos partidos não resiste a uma checagem rigorosa. A lista da Odebrecht contém apelidos e quantias, e mesmo que as quantias correspondam fielmente aos apelidos, e os apelidos a nomes, não quer dizer que o dinheiro indicado foi para benefício próprio, para o chamado caixa dois da legenda ou para comprar leis, medidas provisórias e decretos.

Recorde-se: caixa dois não é crime no Brasil, ainda hoje. A recente tentativa de incriminá-lo esbarrou na resistência dos procuradores da Lava Jato que viram nisso um meio de "anistiar" os responsáveis pela prática, que são julgados por analogia com outros crimes: corrupção ativa ou passiva, lavagem de dinheiro etc, como aconteceu no chamado mensalão. Ora, os procuradores preferem ficar na periferia da lei em lugar de clarificá-la, já que sua clarificação implicaria criminalizar caixa dois só após a vigência da respectiva lei de sua criminalização.

É uma situação absurda, digna dos desvios morais da Lava Jato. Suponhamos que roubar maçã não fosse crime, e que uma lei a ser introduzida no sistema penal o incriminasse. Os procuradores tipo Curitiba se rebelariam porque o reconhecimento formal de um novo crime implicaria ignorar todos os tipos legais dessa ordem, a ele anteriores. Por essa lógica, seria necessário esperar que todos os processos contra ladrões de maçã caducassem para que o novo crime fosse introduzido na lei penal. Quando isso ocorreria? Nunca, porque provavelmente sempre continuaria havendo o ato não criminalizado de roubar maçã.

Os promotores da Lava Jato e seu juiz querem atuar na fronteira entre a lei e a justiça para garantir condenações extraordinárias por analogia. E embora o sistema partidário não seja um inocente absoluto, também não é um culpado absoluto. O dinheiro de empresas direcionado para o caixa dois era uma prática comum a todos os partidos políticos no Brasil justamente por presunção de impunidade pois não era reconhecido como crime. O que está sendo feito agora é punir "sem prévia cominação legal", como é negado pelo bom Direito há décadas e séculos.

Os deputados se acovardaram quando discutiram a atualização da lei sobre o caixa dois. A grande mídia, como sempre, pressionou a opinião pública, a opinião pública manipulada deu respaldo aos procuradores, e os procuradores manipularam a grande mídia. Agora é necessário que algum parlamentar de biografia impecável no campo da corrupção assuma a bandeira da criminalização do caixa dois, não propriamente por conta de dinheiro que é dado aos partidos, mas de dinheiro que compra medidas provisórias e leis no Parlamento, e decretos no Executivo.

Sem limpar esse terreno será impossível reconstituir o sistema partidário brasileiro. Gramsci dizia que não há canalha absoluto; canalha absoluto é uma figura literária. Homens de carne e osso são meio bons e meio maus, em proporções variadas. Quanto à culpa, ela deve ser provada pelo Ministério Público à luz da lei vigente. Não é possível que procuradores e juízes façam eles próprios, através de interpretações muitas vezes carregadas de facciosismo, e com caráter seletivo, leis pessoais que penalizam culpados mas também destruam reputações, honra e a integridade moral de inocentes.

Nós temos que reconstituir o sistema partidário brasileiro. Nenhuma República subsiste sem partidos políticos, muito menos a democracia. Nas bases partidárias de todos os partidos, do PMDB ao PT, do PSDB ao PCdB, de todos enfim, há gente movida por uma vontade sincera de ajudar a melhorar o país e o bem estar do povo. As cúpulas erraram, e em alguns casos erraram feio. É preciso que façam um exame de consciência para encontrar o exato ponto de equilíbrio ético por onde recomeçar com as próprias forças mediante um processo de depuração junto às bases, que serão seus julgadores últimos.

Já foi o tempo em que nefelibatas como eu, vivendo nas nuvens, encaravam desvios de conduta como corrupção absoluta, merecedora de punição também absoluta. Se fosse assim quem sobraria para povoar o Brasil quando vemos a anistia para repatriamento de recursos de origem dúbia, mandados ilegalmente para o exterior, trazer de volta uma quantia inacreditável de bilhões de dólares para a lavanderia legal? Disso não há sequer a contrapartida de que não haverá surto semelhante no futuro. Portanto, que essa questão seja vista do ponto de vista do provérbio espanhol: Todo es según el color del cristal com que se mira!

Jose Carlos de Assis

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