http://www.jb.com.br/
Os juízes exercem atividade política em dois sentidos: por
serem integrantes do aparato do poder do Estado, que é uma sociedade política,
e por aplicarem normas de direito, que são necessariamente jurídico-políticas.
Com esta observação inicio um capítulo de meu livro O poder dos juízes,
capítulo intitulado Assumir a politicidade, no qual procuro demonstrar a
necessidade e conveniência de assumir a politicidade implícita no desempenho
das funções jurisdicionais. Além desse aspecto mais amplo da politicidade,
acrescento mais adiante que o juiz é cidadão, exerce o direito de votar, o que,
obviamente, implica uma escolha política.
Existe, entretanto, uma grande diferença entre essa
participação política, em sentido amplo, e a participação político-partidária.
Com efeito, quem é filiado a um partido político ou se elegeu por ele e toma
suas decisões políticas respeitando as implicações subentendidas nessa filiação
tem reduzidas sua independência e imparcialidade, pois muitas vezes a posição posição
adotada pelo partido é o reflexo de uma circunstância particular, não sendo
raro que as direções partidárias façam acordos objetivando a obtenção de certos
benefícios mas contrariando disposições do programa do partido, que, em
princípio, é um compromisso para os filiados ao partido. E aí acaba a
independência do filiado.
A Constituição brasileira de 1988 estabeleceu no artigo 95,
parágrafo único, inciso III, que aos juízes é vedado «dedicar-se a atividade
político-partidária». É interessante e oportuno observar que no mesmo artigo da
Constituição, no inciso V, está disposto que é vedado aos juízes «exercer a
advocacia no juízo ou tribunal de que se
afastou, antes de decorridos três anos do afastamento do cargo por
aposentadoria ou exoneração». Note-se que no tocante ao exercício da advocacia
foi estabelecida a quarentena, ou seja, um prazo que deve ser observado para
que cesse a probição, ao passo que quanto à atividade político-partidária dos
juízes foi estabelecida, pura e simplesmente, a proibição, o que significa que
no dia seguinte ao da aposentadoria ou exoneração o juiz já pode filiar-se a um
partido. Isso é altamente inconveniente por vários motivos que a prática
demonstra.
Exatamente porque muitas de suas decisões têm nítido
significado político, no sentido de político-partidário, é importante que o
juiz só possa filiar-se a um partido depois de observada uma quarentena, que
poderia ser de dois anos. Com efeito, o juiz que ainda no exercício das funções
jurisdicionais já entrou em contato com um partido para filiar-se logo que
deixar o cargo será inevitavelmente influenciado por esses entendimentos. Os
casos que lhe forem submetidos e nos quais o partido ou os dirigentes
partidários tenham interesse serão conduzidos e decididos sob essa influência,
comprometendo seriamente a independência e
imparcialidade do juiz. O fato de proibir a filiação partidária durante
o prazo da quarentena impedirá o juiz de candidatar-se a cargo eletivo, mas ele
será um eleitor prestigioso e não estará impedido de externar suas opiniões
políticas. A proibição será da filiação partidária e, consequentemente, de se
candidatar, pois a lei eleitoral exige a comprovação de filiação partidária
para alguém ser candidato. Vem a propósito lembrar uma ponderação do ministro
Joaquim Barbosa, num pronunciamento favorável à quarentena para o exercício da
advocacia pelos juízes. Disse o ministro que «o caráter da quarentena prevista
na Constituição é muito restrito, uma vez que o juiz aposentado segue fazendo
jus a seus proventos.
Em conclusão, para a preservação da independência e
imparcialidade dos juízes é necessário fixar-se um prazo de quarentena para que
ele se filie a um partido político depois de deixar o cargo. É preciso impedir
que o juiz, ainda no exercício das funções jurisdicionais, estabeleça
entendimentos com algum partido político, pois ocorrerá, inevitavelmente, a
influência desses entendimentos, e por mais que se esforce para evitá-la em
suas decisões sofrerá tanto as pressões direitas do partido e de seus
dirigentes, como indiretas, decorrentes de sua opção político-partidária. E o
fato de não poder filiar-se a um partido não impedirá que ele exerça sua
cidadania como eleitor e manifestante independente, o que, parafraseando a
expressão usada pelo ministro Joaquim Barbosa, é um impedimento muito restrito.
Em benefício da cidadania brasileira e dos próprios juízes, é importante que a
lei estabeleça uma quarentena para sua filiação partidária.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
12