Similar em intensidade ao
terremoto financeiro de 2008, o novo abalo teve início na China, mas é o
coração do Ocidente que está no centro da tormenta.
Le Yéti, do Politis.fr / www.cartamaior.com.br
O novo tremor atingiu os mercados
de ações globais em agosto: primeiro os asiáticos, depois os ocidentais. Uma
queda vertiginosa que logo levou ao ioiô característico dos tsunamis
financeiros, como nas vésperas da crise de 2008, quando computadores de alta
performance trabalhavam no limite, tentando salvar as aparências, em vão.
Os pilares da economia continuam
tão capengas quanto a estrutura financeira, com um crescimento global ainda
lento, tanto nos Estados Unidos e na Europa (França com 0% no segundo
trimestre), quanto no Japão, Canadá e Austrália. E isto apesar das injeções de
enormes somas pelos bancos centrais, particularmente o Banco Central Europeu.
O que marca este novo episódio de
um colapso sistêmico é, justamente, a perda de controle pelos bancos centrais,
últimos bastiões do sistema contra o buraco negro financeiro de uma dívida que
não para de crescer.
"O buraco negro" é como
o engenheiro russo-americano Dmitry Orlov chama o ciclone financeiro que está
sugando o velho mundo dominante em seu turbilhão autodestruidor.
"O buraco negro suga a
medula de famílias (embora às vezes também sugue cidades inteiras como Detroit,
Michigan ou Bakersfield, na Califórnia, e Camden, em New Jersey). Ele suga
casas, e as regurgita cheias de dívidas podres. Com a ajuda da indústria
médica, suga os doentes e os cospe de volta arruinados. Com a ajuda do
extorsivo ensino superior, suga a esperança dos jovens, e os cospe de volta com
diplomas e presos a uma dívida estudantil vertiginosa. Com a ajuda do complexo
industrial-militar, o buraco negro suga praticamente tudo o que há pela frente,
e regurgita cadáveres, inválidos, desastres ambientais, terroristas e a
instabilidade mundial".
Eis que, explica Dmitry Orlov,
agora o buraco negro começa a engolir países inteiros: a Grécia, por exemplo, e
os países que a cercam...
Há um piloto no avião para nos
tirar desse vespeiro? – você se pergunta. Infelizmente não, responde Dmity
Orlov, no comando há apenas marionetes, que o buraco negro tornou estúpidas e
completamente incapazes de deter a queda aos infernos.
Mas o buraco negro ainda encontra
alguns obstáculos: a Rússia de Putin, recentemente, com o atoleiro ucraniano.
Também não está certo que tudo esteja mesmo acabado na Grécia, o berço da democracia,
que conseguiu dar duas bananas ao buraco negro: primeiro ao eleger um poder não
institucional (Syriza), depois com o memorável referendo de 5 de julho. A
Grécia talvez não tenha ainda dado sua última palavra – mesmo com o naufrágio
político pessoal do seu líder Alexis Tsipras – e poderia dar algumas idéias
para seus vizinhos do sul, também vítimas do infernal buraco negro.
E há, também, a China. É de lá
que vem o atual terremoto. Mas há uma diferença entre as marionetes viciadas em
buracos negros dos mercados mundiais e a China. Como observou Michael J.
Panzner, a China só se serve dos mercados quando eles servem a ela. Quando
jogam contra, ela os fecha e os isola. E os manipula à vontade. Pergunte-se,
por exemplo, por que a desvalorização do Yuan chinês levou imediatamente à
queda do dólar-padrão dos EUA, quando deveria ter sido o oposto, como diz Lucie
Roofer no Mediapart. A resposta é: porque os chineses não desvalorizaram
realmente sua moeda, mas criaram novos sistemas de regulação, sob seu próprio
controle, especialmente na fixação de preços e de paridades, que permitem
limitar as manipulações monetárias no mercado cambial. A guerra cambial em seu
auge.
Por isso é que, hoje, não são as
ultrapassadas marionetes do Império Ocidental que possuem as chaves para sair
do buraco negro financeiro, mas, provavelmente, países como a China. E, talvez,
até mesmo, oh que horror!, a Federação Russa do infame Vladimir Putin.
Ah, claro que diante de tal
constatação os adeptos da negação irão perder a cabeça, nos chamar de
catastrofistas, de adeptos da teoria da conspiração, acusar-nos de semear o
caos, vão soltar gritos desesperados e repetir ad nauseam os jargões totalmente
ocos soprados pelas marionetes que os dirigem: “Putinista! Esquerdista
radical!”. Deixemos Dmitry Orlov dar uma resposta condizente:
"Você ama seu buraco negro?
Se não tem certeza, deixe-me fazer mais algumas perguntas. Você gosta do fato
de que seus cartões de crédito ainda funcionam, ou que você ainda pode deixar
seu dinheiro no banco, e até mesmo sacar dinheiro em um caixa eletrônico ou
receber – ou esperar receber – sua aposentadoria, mais cedo ou mais tarde? Você
gosta de poder obter coisas úteis como alimentos, gás, passagens aéreas, com
notas comuns de papel impressas com imagens de homens brancos mortos,
monumentos ou animais? Você gosta de ter acesso à Internet, poder acender as
luzes e ter água na torneira? Bom, se você gosta dessas coisas, você também
deve gostar do buraco negro financeiro, porque é ele que torna todas essas
coisas possíveis, apesar da falência do seu país. Talvez seja uma relação de
amor e ódio: você gosta de fingir que está tudo bem, mesmo sabendo que não
está, e você quer aproveitar um pouco mais do atual estado da economia, antes
que o inferno caia sobre nós, seja por alguns dias ou por um ano ou dois; mas
você detesta o fato de que, mais cedo ou mais tarde, o buraco negro vai sugá-lo,
até que tudo aquilo que damos como certo seja também sugado".
Tradução de Clarisse Meireles
Créditos da foto: reprodução
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