domingo, 20 de dezembro de 2015

O passado e o futuro do impeachment

Brasília- DF 15-12-2015 Foto Lula Marques/Agência PT   Deputado, Eduardo Cunha preside a sessão da câmara. Deputados votando.
Por Thomaz Pereira // http://jota.info/
Professor da FGV Direito Rio

A decisão do Supremo sobre procedimento do impeachment (ADPF 378) foi clara. No entanto, já são feitos questionamentos sobre as suas consequências imediatas e futuras. A comissão especial eleita pela Câmara estaria imediatamente invalidada? Sendo necessária nova eleição sem candidaturas avulsas e sem voto secreto, o que acontece se o plenário da Câmara não confirmar a indicação dos líderes?

Essa contraposição entre passado e futuro permeia todo o debate sobre o procedimento do impeachment: De um lado, o processo contra Fernando Collor em 1992, de outro, qual deveria ser a regra geral para o futuro. De um lado, os procedimentos já realizados pela Câmara – ausência de defesa prévia, decisões do deputado Eduardo Cunha e a eleição da comissão especial – de outro, no caso de uma eventual derrota da presidente Dilma Rousseff na Câmara, qual deverá ser o procedimento no Senado. E, finalmente, de um lado, o que já foi decidido nessa ADPF pelo Supremo, de outro, quais seus efeitos nas ações dos demais agentes políticos.

Segundo o que foi dito pelos ministros no julgamento, e depois confirmado em manifestação do ministro Barroso, não há dúvida de que a comissão especial está em desacordo com o que exige a Constituição e, portanto, é inevitavelmente inválida. Pode haver dúvidas se Cunha acatará a mensagem clara do Supremo sem discutir questões formais. Não há, porém, dúvida de que, caso a Câmara não se conforme com a decisão do Supremo espontaneamente, novos atos cometidos em desacordo com o julgamento da ADPF serão nulos – mesmo que seja necessário provocar o tribunal para reafirmar seu entendimento em casos específicos.

Ainda nesse embate entre passado e futuro, Cunha manifestou dúvida especificamente sobre qual deverá ser o procedimento no caso de, após indicados nomes para compor a comissão especial pelos líderes (como determinou o Supremo), o plenário, em votação aberta (como determinou o Supremo), rejeite a comissão.

Quanto a isso, algumas coisas precisam ser esclarecidas.

O fato de essa hipótese não ter sido discutida pelos ministros que rejeitaram candidaturas avulsas parece ser consequência natural da própria fundamentação dessa decisão. Candidaturas avulsas foram rejeitadas em nome de uma “democracia de partidos” – a mesma que justifica decisões sobre fidelidade partidária. Ou seja, deve ter sido impensável aos ministros que nomes indicados pelos líderes dos partidos, representantes democraticamente escolhidos por suas próprias bases, indiquem nomes que depois não sejam confirmados por seus companheiros no plenário. Mas Cunha pensou no impensável.

Nisso, como em outras coisas, manifestações colegiadas e claras do Supremo são essenciais, porque trazem previsibilidade e evitam acusações futuras de casuísmo. No entanto, caso isso não tenha ficado perfeitamente claro na ata do julgamento e no futuro acórdão a ser publicado, as consequências de uma manobra como a imaginada por Cunha parecem evidentes: enquanto não aprovada pelo plenário, logicamente, não há comissão especial eleita.

Ou seja, caso os líderes indiquem nomes que não sejam aprovados pelo plenário há apenas duas possibilidades: ou os líderes insistem nos mesmos nomes, tentando conseguir maioria no plenário; ou, conversando com suas bases, algo muda. Ou muda-se nomes de indicados, ou muda-se nomes de líderes. Tal conflito poderia atrasar o prosseguimento do impeachment, mas, até certo ponto, faz parte do funcionamento normal do legislativo. O que não é normal é a existência de líderes que não liderem.


A quem esse embate beneficiaria? Nessa corrida, em que não se sabe se quem ganha é quem chega primeiro, isso não é sempre claro. Mas as cartas já estão na mesa. Nesse embate entre passado e futuro, fica a certeza de que contribuições do Supremo para garantir clareza e previsibilidade das regras do procedimento de impeachment beneficiam a democracia Brasileira como um todo.

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