Um eticamente desqualificado manda a julgamento uma
mulher íntegra e ética
Por Leonardo Boff // http://www.brasil247.com/
O Presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo
Cunha, é acusado de graves atos delituosos: de beneficiário do Lava-Jato, de
contas não declaradas na Suíça, de mentiras deslavadas como a última numa
entrevista coletiva ao declarar que o Deputado André Moura fora levado pelo
Chefe da Casa Civil Jacques Wagner a falar com a Presidenta Dilma Rousseff para
barganhar a aprovação da CPMF em troca de rejeição da admissibilidade de um
processo contra ele no Conselho de Ética. Repetidamente afirmou que a
Presidenta em seu pronunciamento mentiu à nação ao afirmar que jamais se
submeteria à alguma barganha política.
Quem mentiu não foi a Presidenta, mas o deputado
Eduardo Cunha. Seu incondicional aliado, o deputado André Moura, não esteve
barganhando com a Presidenta Dilma, como o testemunhou o ministro Jacques
Wagner. Vale enfatizar: quem mentiu ao público brasileiro foi Euclides Cunha.
Imitando Fernando Pessoa diria: Ele, mentiroso, mente tão perfeitamente que não
parece mentira as mentiras que repete sempre.
É mentira que seu julgamento foi estritamente
técnico. Pode ser técnico em seu texto, mas é mentiroso em seu contexto. O
técnico nunca existe isolado, sem estar ligado a um tempo e a um interesse. É o
que nos ensinam os filósofos críticos. Ele deslanchou o processo de impeachment
contra a Presidenta exatamente no momento em que, apesar de todas as pressões e
chantagens sobre o Conselho de Ética, soube que na votação perderia pois os
três representantes do PT acolheriam a aceitação de um processo contra ele, o
que poderia, depois, significar a sua condenação.
O que fez, foi um ato de vindita reles de quem
perdeu a noção da gravidade e das consequências de seu ato rancoroso.
É vergonhoso que a Câmara seja presidida por uma
pessoa sem qualquer vinculação com a verdade e com o que é reto e decente.
Manipula, pressiona deputados, cria obstáculos para o Conselho de Ética. Mais
vergonhoso ainda é ele, cinicamente, presidir uma sessão na qual se decide a
aceitação do impedimento de uma pessoa corretíssima e irreprochável como é a
Presidenta Dilma Rousseff.
Se Kant ensinava que a boa vontade é o único valor
sem nenhum defeito, porque se tivesse um defeito, a boa vontade não seria boa,
então Eduardo Cunha encarna o contrário, a má vontade, como o pior dos vícios,
porque contamina todos os demais atos, arquitetados para tirar vantagens
pessoais ou prejudicar os outros.
Seu ato irresponsável pode lançar a nação em um
grave retrocesso, abalando a jovem democracia, que, com vítimas e sangue, foi
duramente conquistada. Não podemos aceitar que um delinquente político,
destituído de sentido democrático e de apreço ao povo brasileiro, nos imponha
mais este sacrifício.
Faço um apelo explícito ao Procurador Geral da
República, o Dr. Rodrigo Janot e a todo o Supremo Tribunal Federal: pesem,
sotopesem e considerem as muitas acusações pendentes contra Eduardo Cunha nas
áreas da Justiça. Estimo que há suficientes razões para afastá-lo da
Presidência da Câmara e que venha a
responder judicialmente por seus atos.
A missão desta mais alta instância da República,
assim estimo, não se restringe à salvaguarda da constituição e à correta
interpretação de seus artigos, mas junto a isso, zelar pela moralidade pública,
quando esta, gravemente ferida, pode constituir uma ameaça à ordem democrática
e, eventualmente, levar o país a um golpe contra a democracia.
Mais que outros cidadãos, são suas excelências, os
principais cuidadores da sanidade da política e da salvaguarda da ordem
democrática num Estado de direito, sem a qual mergulharíamos num caos com
consequências políticas imprevisíveis. O
Brasil clama pela atuação corajosa e decidida de vossas excelências, como
ultimamente, tem demostrando exemplarmente.
Leonardo Boff, ex-professor de ética da UERJ
Nenhum comentário:
Postar um comentário