terça-feira, 9 de agosto de 2016

O Brasil intranquilo, por Fábio de Oliveira Ribeiro

             Fábio de Oliveira Ribeiro // http://jornalggn.com.br/
por Fábio de Oliveira Ribeiro 

A situação distópica em que nosso país se encontra é evidente. A presidenta eleita não governa. O interino quer impor ao povo um projeto de governo que não foi endossado pelas urnas. Os principais partidos afundam na corrupção, mas a justiça e a imprensa escolheram sacrificar apenas o PT. Um cenário de guerra civil está sendo montado e ainda pode ser desarmado por novas eleições, desde que Lula seja candidato. Caso contrário, a tragédia será inevitável. 

Nunca antes nosso país forneceu um contexto histórico tão perfeito para a literatura. Desgraçadamente, porém, não temos um grande romancista capaz de explorar com maestria o presente conturbado em que vivemos. Por isto, resolvi recorrer a um romancista inglês para traçar alguns paralelos literário-políticos.
O Americano Tranquilo é, sem dúvida alguma, uma obra de mestre. Neste romance Grahan Greene desenvolve duas histórias (a do Vietnã e a do triangulo amoroso entre o narrador, Pyle e Phoung) e explora a confusão entre o público e o privado. Duas coisas banais e imprevisíveis (a paixão de Pyle por Phuong e o desejo dela de ser tirada do contexto de pobreza e guerra em que se encontra) provocam instabilidade nos cenários políticos cuidadosamente planejados pelo agente da CIA.

No capítulo I, da terceira parte do livro, Grahan Greene retoma o procedimento narrativo que adotou na primeira parte do mesmo. Apesar de o texto alternar entre dois tempos (antes e depois da morte de Pyle) há uma sincronia entre ambos, pois a tensão crescente é mantida em cada um dos momentos por razões distintas.

As suspeitas sobre a conduta de Pyle antes de sua morte equivalem, de certa maneira, às de que Thomas participou do assassinato dele. Tudo se encaminha para um desfecho previsível e que, no entanto, ainda não pode ser totalmente antevisto: as circunstâncias da morte de Pyle.

Quando chega a terceira parte do livro, o leitor fica querendo saber como o narrador solucionará a trama sendo ele mesmo um personagem envolvido no triangulo amoroso que será fatal para Pyle. O interesse pela historia do Vietnã (fonte de motivação das ações de Pyle) se desvanece. A vida amorosa privada de Thomas se torna mais interessante, mesmo que isto possa interferir de alguma maneira na realidade que o agente da CIA se esforça para construir.

Não podemos deixar de notar a ironia que existe entre a constante afirmação de Thomas de que não está envolvido na guerra, apesar de seu evidente envolvimento amoroso com Phuong. Afinal, o narrador tem consciência de que o amor e a guerra são fenômenos que produzem a mesma coisa“Todos nós nos envolvemos, num momento de emoção, e depois não podemos libertar-nos”. (item 5, capítulo I, terceira parte de O Americano Tranquilo).

Esta frase do livro de Grahan Greene se aplica perfeitamente ao que está ocorrendo no Brasil. Ao se empenhar para destruir Dilma Rousseff, o PSDB alimentou a cobiça do PMDB pelo poder (que em nosso caso ocupa a posição de Phuong). Ocorre que o poder pode ser tão escorregadio quanto a jovem vietnamita por quem Thomas e Pyle se apaixonaram. 

No livro O Americano Tranquilo a personagem Phuong (síntese do Vietnã) parece desempenhar um papel secundário e passivo. Contudo, é ela que seduz Thomas e Pyle e fornece a ambos as ilusões amorosas que eles desejam (ópio e uma jovem amante no caso do inglês; uma esposa perfeita e submissa no caso do norte-americano). Como o amor, o poder também seduz e causa mortes. Todavia, como as vítimas de Phuong, aqueles que foram seduzidos pelo poder são levados a acreditar que podem ser os protagonistas de uma história que irá usar e descartar alguns deles.

Nada está resolvido na consciência de Phuong. Ela tanto pode ficar com Pyle como continuar com Thomas. Ela dança e faz ambos dançarem até que um deles prevaleça eliminando o outro. O poder (a soberania popular) já descartou o PSDB e pode perfeitamente descartar o PMDB. A fragilidade de Michel Temer é idêntica a de Pyle. Quando acredita que conseguiu tudo que queria (conquistar o Vietnã e penetrar no coração de Phuong) ele é levada para a armadilha fatal. A armadilha da Lava Jato já está se fechando sobre os líderes do PMDB e não há ninguém capaz de salvá-los.

A única coisa ausente no Brasileiro Intranqüilo é o cenário de guerra. Mas este também está sendo diariamente criado pela imprensa. As palavras condicionam os atos. E depois “Todos nós nos envolvemos, num momento de emoção, e depois não podemos libertar-nos”.

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