terça-feira, 23 de maio de 2017

O flautista de "Hamelin"


O flautista de "Hamelin"
Algumas palavras sobre o nosso tempo presente

Por Jean de Menezes

Diz a narrativa folclórica que uma cidade medieval chamada “Hamelin” estava infestada de ratos. Não havia um só lugar onde não estivessem… trazendo doenças e tormento à toda população. O ratos haviam tomado a cidade por completo. Não existia paz e tranquilidade… apenas terror e morte.

Um certo dia, surge na cidade, um flautista, com vestimentas diferentes daquele povoado, em tons de vermelho desbotado, e, ali, constatou que poderia mudar aquela realidade. Procurou as autoridades corruptas da cidade para oferecer os seus serviços. Conseguiu uma audiência com o prefeito e seus conselheiros... disse que poderia resolver aquela situação. Assim, acordaram, o flautista e os políticos da cidade, uma quantia de valores para que o músico colocasse os ratos sob seu encantamento e acabasse de vez com aquele problema.

Sem muitas delongas, o flautista encantador colocou-se diante do pelourinho e passou a tocar sua flauta… os ratos ficaram alvoraçados… seguiam o som com rigor marcial, seguiam o flautista como se fosse o verdadeiro líder de toda ninhada. Ao passo que tocava e caminhava, afastava da cidade aquela desgraça que atormentava os políticos e o povo. Um a um saíram da cidade, encantados pelo flautista, atiravam-se ao rio, morrendo todos eles. 
Serviço feito, foi o flautista receber a sua propina. Tinha realizado a sua parte do acordo… livrou a população dos tormentos dos ratos, acalmou as manifestações, tranquilizou os políticos e seus lacaios! Fez o serviço muito bem feito. Todos estavam felizes: a população livre dos ratos e os políticos corruptos, livres de manifestações populares, de greves e contestações. Parecia tudo bem (…).

“Hamelin” parecia controlada, pacificada, as pessoas acreditavam: nos políticos e no flautista. Não viam problema algum em estarem acordados para combater um mal maior… e assim pensavam por um tempo. Ao chegar na prefeitura da cidade o flautista, aliado dos políticos por um tempo, constatou que algo estranho estava acontecendo… Não demorou muito para perceber que tinha sido usado pelo prefeito de "Hamelin" e todos os seus lacaios. Em audiência, os políticos disseram que não necessitavam mais dos seus serviços… que já tinham o flautista em boa conta e que não lhe pagariam como combinado. O flautista foi chutado da mesa de banquete dos poderosos… pois já havia lhes servido muito bem, bastava agora enxotá-lo como o mesmo fizera com o ratos!
"Nosso flautista não tinha sangue nobre, nem tampouco pertencia mais a massa da população sofredora e constantemente enganada pelos políticos da cidade. O flautista tinha as suas distinções, já se aliara a outros poderosos em outras partes do mundo, ele sabia o que fazer. E, como em um fantástico golpe de política, resolveu responder aos seus aliados que naquele momento o traída"

Nosso flautista não tinha sangue nobre, nem tampouco pertencia mais a massa da população sofredora e constantemente enganada pelos políticos da cidade. O flautista tinha as suas distinções, já se aliara a outros poderosos em outras partes do mundo, ele sabia o que fazer. E, como em um fantástico golpe de política, resolveu responder aos seus aliados que naquele momento o traída. Era uma disputa pelo poder entre os que dominavam e aquele que servia os dominadores em "Hamelin" e em outras parte do mundo. 

Sentindo-se injustiçado pelos próprios aliados, o flautista empunhou novamente a sua flauta e fez o que sabia. Com maestria de encantador, desta vez, contra parte de seus antigos aliados, fez que todas as crianças de "Hamelin" o seguissem rumo a montanha… assim como fizera com os ratos, marchavam marcialmente para fora do vale… o flautista se vingava de seus antigos aliados retirando o futuro daquele lugar…Foi apenas ai que a grande parte da população de trabalhadores explorados de "Hamelin" perdera de uma vez por todas aquela ideia fantasiada de felicidade que lhe dera o próprio flautista, pais, mães, avós, tios, primos, vizinhos… ficaram todos em desespero e imobilizados pelo encantamento da flauta (…).

A maioria das crianças seguiram o flautista, todas encantadas e felizes, pois a flauta lhes mostrava um lugar de pleno emprego, de saúde, alimentos, moradia, educação e trabalho honesto… foram quase todas encantadas… Disse, quase todas, pois uma parte delas nunca aceitaram a política do prefeito e seus lacaios, assim como não foram encantadas pelo poder conciliador do músico e sua flauta. Até hoje não se sabe ao certo o que aconteceu com a maioria das crianças da cidade germânica de "Hamelin". Uns dizem que entraram por um portal na montanha e jamais retornaram. Outros, que foram assassinadas pelo flautista. Há ainda aqueles que dizem que elas jamais existiram… o que de fato aconteceu com a maioria delas não se sabe ao certo. Mas sobre aquelas que ficaram...

Estas crianças que ficaram em "Hamelin", cresceram e representavam um terceiro campo diante da realidade política de "Hamelin", pois não se iludiram com o flautista encantado, menos ainda com a política dos ricos senhores. Estas ficaram e fizeram a história, com muitas dificuldades é claro, mas ficaram! Não se encantaram com o reformismo do flautista e nem se prostraram diante do derrotismo de uma grande crise internacional. Estas ainda hoje lutam, para além da flauta e da política dos ricos!

Estas crianças hoje são adultos e estarão quase todos em Brasília dia 24 e 25 de Maio, fazendo a Greve Geral e construindo um outro projeto de vida, uma outra sociedade que não cabe nos moldes da política dos ricos opressores e exploradores!



♦ Jean Paulo Pereira de Menezes é docente no curso de Ciências Sociais da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, campus de Paranaíba

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