domingo, 4 de outubro de 2020

O mundo pós-Covid que chegará ... um dia





Resumo:

1 - Seres humanos, instrumentos de capital
2- A acumulação infinita de capital
3 - Excesso de pessoas

1 - Seres humanos, instrumentos de capital

Dentre os múltiplos efeitos da pandemia, alguns - não sanitários - podem ser destacados, como a maior dificuldade de utilização, pelos grandes empórios, quanto ao escrutínio, classificação, manipulação de dados pessoais, para fins de sua segmentação ou homogeneização, com as normas a serem seguidas e a vigilância que as acompanha, diluindo as capacidades individuais num trabalho alienante e inútil, articulado com um tempo de lazer repleto de atividades alucinantes.

Essas atividades inúteis servem apenas para convencer seu praticante a permanecer integrado no circo do capital, por mais inútil que seja seu "trabalho" do ponto de vista de enriquecimento econômico, social ou cultural. O trabalho, sendo um esforço, só serve se produzir algo socialmente necessário ou útil; entretanto, em muitos casos, toda a vida do intérprete é percorrida sem que ele jamais se dê conta da inutilidade ou dano que resultou da aplicação de seu tempo e de suas capacidades físicas e anímicas. Essa distorção na vida dos seres humanos tornou-se típica do capitalismo e, devido à sua dimensão, acarreta prejuízos de natureza animista, ambiental e sanitária que afetam grandes grupos humanos ou mesmo a humanidade; como é o caso do canhão militar.

No passado, nas classes dominantes, sobretudo na nobreza, as suas principais atividades eram o lazer e a guerra, com a entrega da gestão do património, a cobrança de taxas e tributos, a alguém habilitado para o efeito - eclesiástico ou plebeu. Nos demais estratos populacionais, no campo ou nas cidades embrionárias, não havia lugar para tarefas inúteis, vistas como trabalho; todos sabiam o propósito e a real utilidade de seu esforço de trabalho, mesmo que fosse o lazer ou a satisfação dos caprichos de um cavalheiro. Tratava-se de garantir a subsistência e medir o esforço de trabalho de acordo com as necessidades do grupo familiar e o pagamento da homenagem ao patrão local - em espécie, jovens para a guerra ou serviço doméstico no castelo ou palácio.

Em tempos de epidemia, más colheitas ou, devastação pela guerra - não há ... subsídio de desemprego ou tarefas definidas pelo poder público para compensar a falta de rendimentos, como no New Deal restou apenas a emigração, ou a busca por ocupação nas cidades, onde a atividade produtiva era muito mais diversificada do que no campo.

A mobilidade após a expansão europeia do século XVI foi estendida ao espaço global, ganância, espírito de aventura, guerra ou através do comércio de especiarias, escravos, armas ... Essa mobilidade envolveu áreas onde viviam sociedades complexas e ainda mais avançadas do que as europeias, mas que cederam à colonização europeia. Onde isso não acontecia, como na América do Norte e no Caribe, a regra era o extermínio de seus habitantes e o recurso massivo à escravidão ... coberto pelas figuras divinas do panteão cristão e seus sacerdotes.

O capitalismo, gerando a demanda incessante de acumulação de capital e beneficiando-se de tecnologias que geram elevados ganhos de produtividade, poderia reduzir o tempo dedicado ao trabalho, libertando a Humanidade do esforço laboral e dando-lhe tempo livre para seu uso no deleite da cultura, do esporte, da sociabilidade. ..

Mas isso não aconteceu e continuará a não acontecer. Beneficia do essencial dos ganhos de produtividade, constrói imensas burocracias e instrumentos de controle do trabalho e de seus trabalhadores para que a força de trabalho fique pacificada e capturada pela lógica do capitalismo, aceitando sua subordinação às estrelas como está escrito nas estrelas. capitalistas.

É desenvolvida toda uma ideologia baseada na segmentação da renda do trabalho entre trabalhadores e empregadores; e estes, mesmo sendo minoria, se beneficiam da maioria dos ganhos. Os dirigentes do capital dizem que é essencial ter capitalistas porque são eles que criam empregos, pagam salários ... mostrando assim o caráter secundário, o acessório dos trabalhadores. Na bíblia dos capitalistas, Deus criou o capitalista e, como resultado, criou o assalariado para garantir o bem-estar e o entretenimento do primeiro.

2- A acumulação infinita de capital

O capitalismo não concebe limites para a acumulação e inventa formas de aumentá-la ao infinito, de consolidar sua perpetuidade e perpetuar seu poder sobre a população e os recursos do planeta. Por um lado, em termos de produção de bens e serviços, busca maximizar sua oferta para aumentar os lucros; e, por outro lado, em total contradição, busca manter a contenção da renda do trabalho sabendo que poder de compra restrito significa menos consumo, menos gasto. E é por isso que as pessoas apontam o recurso irracional ao endividamento para alimentar o consumismo em todas as camadas sociais, depois de esgotada a capacidade de aproveitamento da renda do trabalho. Como você sai dessa?

Claro, isso não é suficiente. Daí resulta a demência inerente ao sistema financeiro, que, como elemento central na multiplicação do capital, é sempre superada por um impulso, uma gula que nunca se satisfaz, com o aumento e a valorização dos títulos que emite; nem com as margens de lucro que obtém com as transações que realiza, a todo o momento. Daí as crises financeiras, os conflitos militares e o “investimento” em armamentos, com a liderança dos gestores dos grandes bancos centrais, de instituições globais como o FMI ou o BIS - Bank of International Settlements, que acompanha a situação do sistema financeiro global; bem como as classes nacionais e políticas que são responsáveis ​​por administrar os impactos dos governos insensatos financeiros, e transformá-los em crises sociais e econômicas,

A financeirização, com a criação exponencial de dinheiro, de forma virtual, inserida em redes de circulação de dados, gerados de forma instantânea e interligados, é, a todo o momento, redes especulativas de negócios. A base material da economia, baseada na produção de bens e serviços ou na autoprodução e autoconsumo domésticos, perdeu relevância e tornou-se um apêndice, um subproduto do mercado, devidamente supervisionado pelo aparelho de Estado.

3 - Excesso de pessoas[1]

É um momento de grande incerteza frente ao vírus e medo frente ao assalto à renda das classes populares. Dentre os efeitos da pandemia, alguns podem ser destacados, como a maior dificuldade de utilização, pelos grandes empórios, do escrutínio, do enquadramento, da manipulação de dados pessoais, para sua segmentação ou homogeneização; também, com o estabelecimento de padrões a serem cumpridos e vigilância adequada, diluindo as capacidades individuais em um trabalho alienante e inútil; ou, com tempo de lazer repleto de atividades alucinantes. Com essas atividades inúteis - não sentidas como tal pelo trabalhador - pretende-se dar-lhe uma falsa ideia sobre a importância do seu trabalho. É uma prática alienante e pacificadora - típica do capitalismo.

Nos modos de produção pré-capitalistas, as funções de trabalho podiam ser penosas, mas seus propósitos eram conhecidos; ninguém desempenhava funções sem conhecer o objetivo, mesmo que fosse a satisfação de um capricho de seu mestre. No capitalismo, as tecnologias permitiriam reduções bruscas do tempo de trabalho, sem perda de receita, se todas as funções a serem desempenhadas fossem reconhecidas como socialmente úteis. Isso significaria aumento do tempo de lazer, para estudo, cultura ou esporte e daí resultaria a grande questão política - se os meios permitem a produção de todos os bens e serviços úteis à Humanidade, é preciso abolir aqueles que condenam a multidão às viagens. de empregos longos, penosos e de baixa renda. Bem como todas as atividades socialmente inúteis ou prejudiciais.

Pelo modo como a multidão - em tempos de covid-19 - permite o desemprego em massa, a dispensa, o recurso estendido à caridade, as limitações na circulação no espaço físico, a perda de horas de vida com os olhos vidrados no novo tela, um futuro muito nebuloso e pouco promissor, parece que a articulação entre os capitalistas e as classes políticas domina a situação.

Em Portugal, o que se seguiu ao desastre financeiro provocado pelo partido-estado PS-PSD, antes e durante a intervenção da troika (2011-2015); e, a pacificação pela "esquerda" da esparsa contestação então ocorrida, ainda mostra seus efeitos. A classe política portuguesa, como noutros países, não resolveu nenhum dos problemas dos então existentes e acrescentou os efeitos atribuídos ao covid-19.

A ocupação do Estado por partidos políticos que colocam sobre seus membros todas as responsabilidades pela gestão econômica e social da sociedade e estão vinculados, remete a população à situação de objetos mansos e brandos, de subordinados subordinados aos interesses da classe política . A crise do vírus, que tem duração muito além do inicialmente previsto, revela, em um primeiro momento, a imensa incapacidade de gestão das classes políticas - com destaque para Europa Ocidental, EUA e, Brasil - contrastando com a frieza e capacidade observada em vários países do Leste Asiático. Em todos os casos, porém, é uma constante - a ausência de iniciativas populares capazes de se organizar em rede, afastando-se da lógica piramidal e da monstruosa burocracia que caracteriza o aparelho de Estado; o povo fica na TV e assiste, passivo, ao espetáculo repetitivo estrelado por hordas de mandarins e escritores; e, sendo estúpidos, estarão prontos para dormir com uma máscara ou se banhar em alcatrão, se determinado por um primeiro-ministro.

Se a humanidade não pode, por limitações físicas ou institucionais, produzir os rendimentos necessários para acompanhar a deriva financeira especulativa, deve recorrer a artifícios para aumentar o capital envolvido no circuito econômico; e, nesse processo, o sistema financeiro globalizado e os governos que o servem desorganizam sociedades, espalham sofrimento, artificializam economias, ofendem o planeta.

Em Portugal, este verão, a taxa de poupança superior a 10%, que é perto de zero (quando não negativo) valores nos últimos anos; e isso está relacionado a grandes quedas no consumopção e rendimento disponível. O povo tem o bom senso de se precaver para dias piores, porém, o sistema bancário e os governos não sabem o que pode acontecer; por exemplo, podem penalizar contas com saldo acima de determinado valor para estimular o consumo ou, aumentar a carga tributária para reduzir o déficit público. O poder quer voltar à taxa de poupança zero para que o dinheiro possa ser capturado pelo carrossel financeiro; seu negócio é gerar dívidas, não economias. E em 2023, espera-se que na Europa, no euro, não haja dinheiro em papel ou metal; tudo ficará registrado, não nas estrelas, mas nos servidores do sistema financeiro globalizado [2], um grau de controle muito maior sobre a vida das populações.

Hoje, o tão almejado crescimento econômico, do nebuloso PIB, tem como característica central e mais usual o recurso às dívidas contraídas por famílias, empresas e, Estados. O carrossel financeiro segue em outro estágio.

· Regra geral, as famílias endividam-se com os bancos, nomeadamente para o apoio à habitação e aos meios de transporte, necessidades essenciais negligenciadas pelos Estados; estes, ávidos cobradores de impostos, davam sua satisfação à sagrada "iniciativa privada" [3]. A engrenagem da dívida, originada nas famílias, tem o seguinte enquadramento:

· Famílias estão endividadas há décadas, aproveitando as baixas taxas de juros concedidas pelos bancos; e os Estados mostram seu parasitismo cobrando impostos - IMT, Selo e, posteriormente, IMI, ad secula seculorum.

· O risco para os bancos é baixo porque o imóvel está sujeito a hipoteca e fiança; o risco é inteiro das famílias, em casos de desemprego ou separação conjugal, por exemplo;

· As taxas de juro baixas estão em linha com os salários, também com uma evolução fraca. E o primeiro não preocupa particularmente os bancos, como será visto a seguir;

· Os bancos credores não esperam décadas para recuperar o capital e os juros emprestados. Somam um grande número de créditos, compartilham seu valor em títulos que colocam no mercado financeiro, recuperando o equivalente a grande parte do crédito concedido às famílias devedoras. Esta operação denomina-se securitização e corresponde à constituição de uma cascata de operações sucessivas, com inclusão de novos créditos, envolvendo grupos sucessivos de compradores de habitação de longa duração ou outros;

· Resumidamente, existe uma dívida familiar acumulada há várias décadas e um banco que concede o empréstimo. Este banco irá captar diversos empréstimos deste tipo (e outros) e emitir obrigações que serão adquiridas por outras instituições, recuperando assim um valor que inclui o valor da totalidade destes vários empréstimos concedidos. No entanto, ele não deixou de ser credor daquela família e de outras; apenas um expediente usado para antecipar o retorno do valor do empréstimo.

A operação colocou em circulação um valor que é o espelho do crédito habitacional nela incluído; e, este pode ser multiplicado n vezes, tantas quantas as securitizações efetuadas envolvendo as dívidas, podendo ser associado a um conjunto de espelhos ou à constituição das pirâmides de Ponzi, cujo valor máximo é, teoricamente, o infinito. Somando todas essas dívidas, o mesmo banco torna-se devedor daqueles que compraram os títulos emitidos, mas arrecadaram dinheiro para novos investimentos.

A operação colocou em circulação um valor que é o espelho do crédito habitacional nela incluído; e, este pode ser multiplicado n vezes, tantas quantas as securitizações efetuadas envolvendo as dívidas, podendo ser associado a um conjunto de espelhos ou à constituição das pirâmides de Ponzi, cujo valor máximo é, teoricamente, o infinito. Somando todas essas dívidas, o mesmo banco torna-se devedor daqueles que compraram os títulos emitidos, mas arrecadaram dinheiro para novos investimentos. O equilíbrio financeiro não muda; soma-se o presente e futuro furo fiscal para saldar a dívida pública e o endividamento privado, decorrente do abandono das políticas de habitação e transporte público pelos estados em favor da tão cantada iniciativa privada.

As empresas também recorrem ao endividamento. As taxas de juros baixas estão enraizadas na política do banco central na mesma direção, com as devidas repercussões na banca comercial, que por sua vez desenvolve ações de securitização para liberar capital para novos empréstimos.

O crédito barato - e as taxas de retorno quase zero sobre os depósitos - trabalham em conjunto para estimular o consumo e, ao mesmo tempo, desestimular a poupança; portanto, forma-se uma quase obrigação no sentido de endividamento ... pois é do interesse do sistema financeiro e das classes políticas que, na sequência, se apoderam do futuro das pessoas e das empresas, capturadas pelas obrigações no financeiro sistema. Nasce o treinamento de crédito, não a poupança, mas sim a pirâmide Ponzi em que surge a prática da securitização.

Essas pirâmides também são ampliadas pela entrada constante nos circuitos "legais" de dinheiro de vários tipos de tráfico (drogas, armas, seres humanos ...), corrupção, etc. para a alegria do sistema financeiro e o olhar distraído da supervisão de bancos centrais e outros reguladores pomposos; como regra, os governos são mais cautelosos quanto ao vazamento fiscal de pequenas empresas e muito pouco quanto à evasão fiscal dos ricos [4] . Esses reguladores e governos nacionais têm sido tradicionalmente distraídos pelo dinheiro que circula entre o sistema financeiro visível e as dezenas de registros offshore em todo o mundo, especialmente em ilhas remotas.

Ao maximizar a disponibilidade de crédito barato, as empresas reduzem o uso de capital; e, no caso português, banalizou-se também - e já há muitos anos - a utilização, pelas empresas, de contribuições, devidas e não pagas, à sonolenta Segurança Social portuguesa , parasitada por todos os governos ... sem qualquer protesto da parte o mundo sindical ou os ditos da oposição dos partidos. A descapitalização da Previdência Social é uma prática recorrente que faz parte de um acordo tácito dentro da classe política. 

A competitividade das empresas decorrerá, assim, dos baixos níveis salariais dos trabalhadores - atomizados e desorganizados - em jornadas não remuneradas em trabalhos precários, demissões ou, mesmo facilitadas, por dispensas facilitadas pelo governo em covid-19 vezes.

Todo este sistema baseado em cascatas de crédito é extremamente vulnerável ainda que ancorado em taxas de juros muito baixas, para evitar dificuldades para as empresas e, vinculado a taxas de inflação igualmente baixas; assim, promove uma elevada propensão ao consumo da população, que, com a estagnação dos salários, embarca no recurso ao crédito, facilitado pela banca.

· Este modelo de integração de entidades - empresas, especialmente as mais pequenas, os Estados e o sector bancário - depende essencialmente do banco central, que dificilmente o pode anular:

· O abastecimento do sistema financeiro não pode ser interrompido porque o crédito bancário seria muito mais caro e difícil de obter sem garantias firmes, que muitas empresas não poderiam oferecer;

· A sua cessação conduziria a uma enorme crise global, seria o colapso de um castelo de cartas, com a falência de inúmeras empresas, endividadas e com uma acumulação de créditos podres nos bancos. A ativação das hipotecas levaria à acumulação de imóveis sem compradores e, portanto, desvalorizados, com impactos a montante, na construção, que incorpora elementos de muitas indústrias, serviços e obras;

· As demissões de trabalhadores e a mobilização de rendas de reposição, oriundas da esfera estadual, não impedem m dificuldades no pagamento das parcelas dos empréstimos para habitação;

Os efeitos subsequentes nas contas públicas (déficits) afetariam o uso usual dos “leilões” de dívida pública, certamente com taxas de juros bem mais elevadas do que hoje.

Este e outros textos em:


Grazia.tanta@gmail.com 1/10/2020 1 


[2] O desaparecimento do dinheiro físico na Europa do euro - hoje, um valor de $ 14,5 ^ 11 - que vai incorporar a disponibilidade do sistema financeiro para especulação à qual devem ser adicionados os custos de fornecer às populações notas e moedas, deixando as populações sem quaisquer instrumentos de troca que não sejam a troca direta de batatas por cebolas, por exemplo. Se você acha que a fortuna das cinco pessoas mais ricas do planeta - Bezos, Gates, Arnaud, Zuckerberg e, Ellison - é de $ 414 ^ 9 ... pode não ser muito ...



[4] Em Portugal, o caso do BES é um bom exemplo do entrelaçamento de circuitos e da parcimônia de como os governos vêem a questão, incorporando nas suas listas pessoas muito bem relacionadas com o crime financeiro ou escritórios de advocacia sénior. Nenhum governante quer (ou pode) se mostrar como um Robin of the Woods, embora a equipe dos ... xerifes de Nottingham abundem dentro dele.

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