quinta-feira, 12 de dezembro de 2024

PETROBRAS - Investimentos em refino não rompem com a dependência de importações de derivados

Créditos: Petrobras

Capacidade total do parque de refino deve passar de 1.813 mil barris por dia para 2.105 até 2029. Embora a ampliação contribua para o abastecimento nacional, plano atual não traz grandes avanços em relação ao anterior.

Erick Sobral Diniz e Adhemar S. Mineiro

O Plano de Negócios 2025-2029 (PN 2025-2029) da Petrobras reflete o compromisso de uma empresa pública de capital aberto em alinhar seu planejamento aos interesses da sociedade civil e de seus acionistas. Por ser a maior empresa nacional, recaem sobre ela expectativas quanto ao seu papel no desenvolvimento econômico e na promoção de interesses públicos, como a industrialização, a garantia do abastecimento interno e a efetivação da transição energética. Ainda assim, apesar de sinalizações importantes apresentadas, as ambições voltadas ao setor de Refino mostraram-se aquém das necessidades nacionais. A expansão planejada de capacidade da Refinaria Abreu e Lima (RNEST), em Pernambuco, aliada à modesta reestruturação, modernização e ampliação (“revamp”) de outros ativos conflita com a alta dependência do país em relação à importação de derivados.

Durante a divulgação do plano, a presidenta Magda Chambriard abordou a necessidade de garantir um planejamento sólido e a executabilidade das metas e trouxe visões de longo prazo ao tratar da exploração de novas fronteiras como a Margem Equatorial e a Bacia de Pelotas, além da versatilidade de investimentos em favor da transição energética, como Bioquerosene de aviação (BioQAV), Diesel Verde (HVO) e Diesel com conteúdo renovável (Diesel R). De todo modo, a fala mais impactante da presidenta reiterou a expertise da empresa no tratamento de moléculas e não de elétrons, o que poderia sinalizar maior cautela quanto aos investimentos em rotas eletrolíticas, como a do hidrogênio verde.

Em termos de investimentos, há a pretensão de alocar US$ 19,6 bilhões totais, nos segmentos de Refino (US$ 15,2 bilhões), Comercialização e Logística (US$ 3,6 bilhões), Fertilizantes (US$ 900 milhões), representando um aumento de 17% em relação ao plano anterior, cujo CAPEX (investimentos em bens de capitais) foi de US$ 17 bilhões. No geral, há avanços para implementação de um portfólio relativo a uma empresa de energia, com previsão de atuação nos segmentos de fertilizantes e petroquímica, além de combustíveis de baixo carbono (SAF, HVO, Diesel R e etanol).

O planejamento para o setor envolve o aumento de capacidade produtiva, com ampliação da oferta de lubrificantes e combustíveis, tanto fósseis como renováveis. O PN 2025-2029 indica a ampliação da capacidade de destilação da RNEST, com uma nova unidade SNOX com capacidade de 27 mil barris por dia (mbpd), o Revamp do Trem 1 (+15 mbpd) e ampliação do Trem 2 (+130 mbpd), totalizando um acréscimo de 172 mil barris por dia nesse ativo. Com o revamp de outras refinarias, serão adicionados 120 mbpd, totalizando uma ampliação estimada de 292 mbpd. Com isso, projeta-se que o parque de refino alcance uma capacidade total de 2.105 mbpd até 2029, frente à capacidade atual de 1.813 mbpb.

Embora essa ampliação da capacidade produtiva contribua para o abastecimento nacional, o plano atual não traz grandes avanços em relação ao anterior, que previa um aumento de 225 mbpd. Desse modo, muito provavelmente, a situação nacional de dependência externa de alguns derivados se manterá (e aqui, é particularmente importante a dependência nas áreas de diesel e GLP).

Quanto aos produtos do refino, o PN 2025-2029 procura elevar a capacidade de produção de Diesel S10 em 290 mbpd, mantendo a projeção do plano anterior, além de avaliar um incremento adicional de 70 mbpd. Dos 290 mbpd em implantação, 176 mbpd serão destinados à conversão de qualidade (S500 para S10), enquanto 114 mbpd representarão incremento em volume. O plano também prevê o phase out do Diesel S500, com uma redução progressiva de 31% em 2024 até sua substituição total pelo Diesel S10 em 2029. Essa busca por alternativas menos poluentes reforça o compromisso da empresa com a sustentabilidade.

No que tange à produção de lubrificantes, a Petrobras informa que contribuirá com cerca de 30% a 40% do fornecimento de óleos básicos e o projeto Boaventura/RJ reduzirá a necessidade de importação de óleo em cerca de 100 mbpd, avançando na produção de lubrificantes mais modernos (Grupo II) produzidos pela rota de hidrorrefino e com menor teor de impurezas. A finalização da Rota 3 e a inauguração do Complexo de Energias Boaventura trazem perspectivas interessantes para o avanço do mercado de gás no Rio de Janeiro, além da expansão da produção de lubrificantes mais modernos. De todo modo, há um longo caminho a ser percorrido até a efetiva competitividade dos preços do gás natural.

Em relação ao biorrefino, há metas de ampliação da produção de Diesel R5 e projetos relacionados à produção de Bioquerosene de Aviação (SAF) e diesel verde (HVO) pela rota HEFA (via ácidos graxos e ésteres hidroprocessados, utilizando óleos e gorduras). Estuda-se também a produção de SAF pela rota ATJ (Alcohol to Jet). As plantas dedicadas ao biorrefino e com carteira em avaliação são: produção de BioQAV e HVO em Boaventura com 19 mbpd; produção de BioQAV e HVO via rota ATJ na Replan com 10 mbpd; e potenciais parcerias com a Acelen (20 mpbd) e Riograndense (15 mpbd). A produção de BioQAV e HVO na RPBC está na carteira de implementação. O Plano anterior trouxe um investimento de US$ 1,5 bilhão para o biorrefino, prioritariamente para projeto de diesel R5, ao passo que o atual amplia as rotas tecnológicas para o SAF e o HVO, além de tratar a retomada do mercado de etanol.

No que tange ao Diesel R5, o plano atual dispõe que a capacidade instalada de produção por processamento está dividida nos seguintes ativos: 46% na Repar; 21% na Regap; 14% na RPBC; 10% na Reduc; e 9% na Replan, totalizando 63 mpbd. A Petrobras estima que o potencial aumento da capacidade do coprocessamento dependerá da regulação, uma vez que a Lei do Combustível do Futuro pretendeu trazer estratégias voltadas à incipiência dos mercados de SAF e HVO, não tendo tratado o mercado de diesel com conteúdo renovável. Ademais, a potencial aprovação legislativa do mercado de carbono nacional pode trazer perspectivas relevantes para o desenvolvimento e a expansão de produtos mais sustentáveis.

Em relação à logística, prevê-se a construção de dezesseis novos navios de cabotagem, investimentos no Terminal Aquaviário do Porto de Santos e construção de novos dutos de combustíveis para abastecimento do Centro Oeste. O investimento total é de US$ 3,6 bilhões, com objetivo de ampliar e adequar a infraestrutura logística de dutos e terminais, a ampliação da frota própria de navios e a melhoria das operações.

O segmento de fertilizantes totaliza, no quinquênio, US$ 900 milhões em projetos com a retomada da construção da Unidade de Fertilizantes Nitrogenados (UFN-III), em Três Lagoas (MS), e a reativação da fábrica de fertilizantes Araucária Nitrogenados S.A. (Ansa) no Paraná. A dependência externa de fertilizantes ultrapassa 80%, sendo insumo relevante para o desenvolvimento do agropecuário nacional. Desse modo, a Petrobras amplia o fornecimento de um componente chave para a economia nacional.

A capacidade de produção dos ativos da Petrobras chega a 2.820 mil toneladas por ano (kta) de ureia, 370 kta para amônia verde e 365 kta para agente redutor líquido automotivo (Arla). A atuação no segmento petroquímico segue em estudos, há possibilidade de negócios com a Braskem, uso do gás para rota petroquímica em Boaventura/RJ e produção de hidrocarbonetos leves de refinaria e propeno verde.

É inegável a contribuição da Petrobras para o abastecimento interno, porém a ampliação de seu parque de refino prevista no novo plano de negócios é insuficiente para reduzir a alta dependência de importação de derivados. A superação do perfil primário exportador, tanto da Petrobras quanto do país, exige investimentos substanciais em novos ativos, infraestrutura logística e expansão significativa da capacidade de processamento, condições imprescindíveis para garantir maior valor agregado à produção interna. Além disso, a instrumentalização de rotas orgânicas e sintéticas é fundamental para inserir a Petrobras nos promissores mercados futuros de combustíveis sustentáveis, posicionando a empresa como agente estratégico da transição energética e do desenvolvimento nacional. Para tanto, é crucial que a Petrobras amplie de forma mais substantiva os segmentos que a consolidarão como uma empresa integrada de energia.


Erick Sobral Diniz é doutorando e mestre em Direito da Regulação (PPGD) pela FGV Direito Rio e pesquisador da área de Refino do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep).

Adhemar S. Mineiro é economista, doutorando pelo Programa de Pós-Graduação em Ciência, Tecnologia e Inovação em Agropecuária (PPGCTIA/UFRRJ) e pesquisador do Ineep.



 

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