![](https://aterraeredonda.com.br/wp-content/uploads/2025/02/ano-novo-chines.png)
Ano Novo chinês, o ano da serpente, comemorado no bairro da Liberdade em São Paulo. Foto: Paulo Pinto/ Agência Brasil
JIANG SHIXUE*
A cooperação econômica, investimentos em infraestrutura e alta tecnologia, e a possibilidade de um Tratado de Livre Comércio entre Brasil e China
Em 21 de novembro de 2024, o presidente chinês Xi Jinping e o presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva anunciaram a elevação dos laços bilaterais entre os dois países para “uma comunidade com um futuro compartilhado por um mundo mais justo e um planeta mais sustentável”. Esta é a terceira vez que o relacionamento é elevado desde o estabelecimento de laços diplomáticos em 1974. A primeira foi a parceria estratégica em 1993, e a segunda, a parceria estratégica abrangente em 2012.
“Uma comunidade com um futuro compartilhado por um mundo mais justo e um planeta mais sustentável” para a China e o Brasil significa, em termos práticos, que ambos os países se unirão mais estreitamente para contribuir com a construção de “uma comunidade com um futuro compartilhado para a humanidade”, uma meta ambiciosa proposta pelo presidente Xi Jinping em 2013. Simultaneamente, os dois países redobrarão seus esforços para intensificar a cooperação nos campos político e econômico, bem como promover intercâmbios culturais, a fim de fortalecer o entendimento mútuo.
O mundo atualmente passa por grandes mudanças nunca antes vistas em um século. Particularmente, após a posse de Donald Trump na Casa Branca, é esperado que a política externa dos Estados Unidos exiba de forma mais acentuada as características dos quatro “ismos”: hegemonismo, unilateralismo, protecionismo e intervencionismo, profundamente enraizados na diplomacia americana. Juntamente com outros países em desenvolvimento, China e Brasil precisam reforçar o consenso político no esforço de resistir a esses quatro “ismos”.
Relatórios indicam que os EUA irão impor altas tarifas a diversos países, incluindo China e Brasil. Para contrapor essa ação protecionista, China e Brasil necessitam ampliar a cooperação econômica.
O Brasil carece de investimentos em infraestrutura, setores manufatureiro e agrícola, enquanto a China está apta a suprir essa necessidade de capital. Até o momento, o estoque total de investimentos chineses no Brasil alcançou US$ 70 bilhões. Essa cooperação, de natureza ganha-ganha, tem gerado resultados significativos. Por exemplo, a Usina Hidrelétrica de Belo Monte é frequentemente chamada de “projeto do século” no Brasil. Em fevereiro de 2014, a State Grid of China, em parceria com a brasileira Eletrobras, venceu a licitação para a primeira fase do projeto de transmissão de ultra-alta tensão da Usina Hidrelétrica de Belo Monte. Em julho de 2015, a empresa chinesa venceu, de forma independente, a licitação para a segunda fase do projeto. Estima-se que essa iniciativa tenha beneficiado 22 milhões de pessoas, o equivalente a 10% da população brasileira.
Nos últimos anos, mais investimentos em alta tecnologia têm sido direcionados ao Brasil. Por exemplo, a montadora chinesa BYD construirá um grande complexo industrial com três fábricas no estado da Bahia.
Em agosto de 2023, o presidente Lula lançou o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que prevê o investimento de mais de R$ 1 trilhão em infraestrutura, energia e transporte ao longo dos próximos quatro anos. A China apresentou a Iniciativa do Cinturão e Rota em 2013. Durante a visita do presidente Xi Jinping ao Brasil, em meados de novembro do ano passado, China e Brasil decidiram alinhar a Iniciativa do Cinturão e Rota ao PAC e a outras estratégias de desenvolvimento. Portanto, espera-se que mais investimentos chineses sejam direcionados ao Brasil.
Na área comercial, China e Brasil possuem muitas vantagens comparativas. Isso explica o crescimento acelerado no valor do comércio bilateral, que atingiu US$ 188 bilhões em 2024, comparado a US$ 87 bilhões há dez anos. Esse aumento no comércio entre os dois países pode ser impulsionado caso os EUA continuem a usar tarifas como instrumento de pressão. Nesse contexto, a China poderá desviar parte de suas importações dos EUA, buscando novos fornecedores no Brasil e em outros países. O mesmo se aplica às exportações brasileiras. Por exemplo, a China já está disposta a comprar mais soja e outros produtos brasileiros.
Para fomentar ainda mais o comércio bilateral, Brasil e China precisam considerar a possibilidade de firmar um Tratado de Livre Comércio (TLC). O Brasil é membro do Mercado Comum do Sul (Mercosul). De acordo com algumas pesquisas, a assinatura de um acordo de livre comércio entre o Mercosul e a China poderia adicionar até 1,43% ao PIB brasileiro, aumentar o investimento estrangeiro em 7,2% e impulsionar as exportações em 7% até 2035.
Há mais de duzentos anos, a Camellia sinensis, ou chá, chegou ao Brasil quando o imperador Dom João VI trouxe 500 produtores de chá chineses de Macau ao país. O biólogo alemão Johann Baptist Spix e o botânico Carl von Martius escreveram em seu livro Viagens ao Brasil (1817-1821), publicado em 1824: “O chá cultivado aqui (no Brasil) é colhido e processado usando os mesmos métodos da China”. Hoje, a carne de churrasco servida em muitos restaurantes chineses é preparada seguindo os métodos brasileiros. No entanto, a futura relação bilateral entre China e Brasil, nesta nova era, não será uma mera repetição do passado. Atualizado de parceria estratégica abrangente para “uma comunidade com um futuro compartilhado por um mundo mais justo e um planeta mais sustentável”, o relacionamento será marcado por maior consenso político, mais cooperação econômica ganha-ganha e um entendimento mútuo mais profundo.
*Jiang Shixue é professor da Universidade de Ciência e Tecnologia de Macau.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
12