Após uma corte estadunidense
‘derrubar’ a neutralidade da rede, relator do projeto de lei do Marco Civil da
Internet no Brasil aponta para a urgência de assumirmos de vez o protagonismo
mundial na defesa da Internet livre
Por Felipe Bianchi, em Centro de Estudos Barão de Itararé
A comunidade digital e os
ativistas pela Internet livre acenderam o alerta vermelho nesta semana, após
uma corte estadunidense ‘derrubar’ a neutralidade da rede, princípio
fundamental para a liberdade e a democracia na Internet. O tribunal de apelo em
questão determinou inválidas as regras da Comissão Federal de Comunicações
(FCC), que garantia a não-interferência dos proprietários da infraestrutura da
Internet no fluxo de dados e conteúdos que por ela trafegam.
Assim como as teles pleiteiam a
quebra da neutralidade no Brasil, foi a partir de um processo aberto pela
operadora Verizon que o princípio caiu nos Estados Unidos. A FCC, no entanto,
promete recorrer: “Estamos comprometidos em manter nossas redes como máquinas
para o crescimento econômico, como espaço de testes para serviços e produtos
inovadores, e como canais para toda forma de discurso protegido pela primeira
emenda [que garante a liberdade de expressão nos EUA]“, afirmou Thomas Wheeler,
presidente do órgão.
O objetivo, segundo ele, é
“garantir que as redes das quais a Internet depende continuem oferecendo uma
plataforma livre e gratuita para inovação e expressão”.
A polêmica em torno da
neutralidade da rede é o principal entrave na aprovação do Marco Civil da
Internet no Brasil – espécie de ‘Constituição de direitos e deveres’ na arena
digital. O relator do projeto de lei, Alessandro Molon (PT-RJ), acredita que a
decisão norte-americana aponta para a urgência de o Brasil assumir de vez o
protagonismo mundial na defesa da Internet livre.
“A decisão só reforça a
necessidade de garantir a neutralidade da rede por lei e não por uma norma
inferior, como um regulamento”, afirma. Segundo Molon, em nota enviada à
imprensa, é justamente essa regulamentação que o Marco Civil pretende fazer.
“Ao aprová-lo, o Brasil consolidará seu protagonismo na área (…), servindo de
exemplo para outros países, inclusive os EUA”, complementa.
Bloqueado pelo lobby das empresas
de telecomunicações, que pretendem seguir os passos dos Estados Unidos e tornar
o direito ao acesso à Internet um “privilégio”, similar aos pacotes de TV a
cabo, o projeto tramita em urgência constitucional desde setembro do ano
passado. A votação é sistematicamente boicotada devido a articulações e lobby
nos bastidores.
O Sinditelebrasil (Sindicato
Nacional das Empresas de Telefonia e de Serviços Móvel Celular e Pessoal), por
exemplo, defende o liberalismo econômico – e não os direitos civis – como
principal baliza para o uso da Internet no Brasil. Em nota ao portal de
tecnologia do UOL, o Sindicato diz apoiar “toda iniciativa que venha a dar
flexibilidade na oferta de serviços à população e sociedade em geral” e que
“garantam os princípios da livre iniciativa e da livre concorrência”.
Em consonância com o movimento
pela Internet livre no país, o deputado Molon rechaça a visão puramente
mercadológica e opina que ser contrário à neutralidade da rede é ter
“preconceito contra pobre” e “posicionar-se contra milhões de internautas
brasileiros”. Isso porque o modelo defendido pelas empresas de telecomunicações
prevê a venda de pacotes de conteúdo no lugar da velocidade, similar à TV paga.
Em suma, ao invés de contratar um
plano com determinada velocidade e navegar livremente na rede, o internauta
seria obrigado a escolher um plano que dê acesso, por exemplo, apenas ao e-mail
e a um determinado portal de notícias; um plano que dê acesso ao e-mail, a uma
rede social, a uma ferramenta de busca e ao YouTube custaria mais caro e assim
sucessivamente. Os provedores de Internet, em especial os de pequeno e médio
portes, alegam que tal política cerceia a liberdade e prejudica também as
empresas de conteúdo digital, que perderiam espaço no mercado.
Além disso, há uma discussão
importante em torno do controle e da censura do que circula na rede, já que a
quebra da neutralidade possibilitaria, por exemplo, que empresas privadas
compartilhassem dados com agências de inteligência e espionagem. Ainda que o
vazamento de documentos da Agência de Segurança Nacional (NSA) dos Estados Unidos,
promovido por seu ex-funcionário Edward Snowden, indique que esse processo já
está em curso, a regulamentação da neutralidade da rede tornaria a prática
ilegal, assegurando os direitos à privacidade e à liberdade de expressão.
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