Heather Boushey (*) Carta Maior
O Capital no Século XXI foi escrito na tradição dos grandes
textos econômicos. Onde John Maynard Keynes escreveu A Teoria Geral do Emprego,
do Lucro e do Dinheiro, em resposta aos “economistas clássicos” e Karl Marx
escreveu O Capital em resposta aos “economistas burgueses”, Thomas Piketty
escreve em resposta aos “economistas dos EUA”. Como seus antecessores, ele não
mede palavras. Depois de dar aulas no MIT aos 22 anos, ele voltou a Paris aos
25, em 1995, dizendo: “não achei o trabalho dos economistas estadunidenses
muito convincente”.
O método de Piketty é uma crítica explícita aos acadêmicos
“preocupados demais com problemas matemáticos insignificantes, de interesse
apenas para eles mesmos”. Embora as ferramentas da matemática sejam elementos
de importância fundamental para a moderna profissão da economia, Piketty está
certo ao chamar a todos os cientistas sociais, inclusive os economistas, a
“começarem com as questões fundamentais e tentar respondê-las”.
Piketty faz duas questões fundamentais no seu novo livro: “O
que realmente sabemos a respeito de como a riqueza e a renda evoluíram, desde o
século XVIII, quais as lições que podemos obter desse conhecimento para o
século atual?”.
Piketty e seus colegas passaram os últimos anos reunindo um
banco de dados da renda mundial, sua investigação detalhada na renda dos países
ao redor do globo, abrangendo várias décadas. Em alguns casos – França e Reino
Unido – ele também sustenta a análise em fatos relacionados à acumulação de
riqueza ao longo de séculos. Como ele diz, “foi pacientemente estabelecendo
fatos e padrões e então comparando diferentes países que pudemos identificar os
mecanismos em operação e ganhar, assim, uma ideia clara do futuro”.
Informado por uma base de dados histórica e transnacional,
Piketty avalia – e rejeita – uma série de conclusões geralmente aceitas no
pensamento econômico, embora admita, cuidadosamente, as limitações inevitáveis
das fontes “imperfeitas e incompletas”. O principal achado de sua investigação
é que o capital ainda importa. Os dados mostram um ressurgimento recente nos
países desenvolvidos da importância do rendimento de capital em relação à renda
nacional, de volta a níveis vistos pela última vez antes da Primeira Guerra
Mundial.
Na análise de Piketty, sem um crescimento econômico rápido –
que ele argumenta ser altamente improvável agora, que o crescimento
populacional está se tornando mais lento – retornos de investimentos
continuarão a crescer mais rápido do que os da produção. As desigualdades de
heranças e de renda continuarão crescentes, possivelmente em níveis jamais
vistos anteriormente.
Dentre outras conclusões, os dados levam Piketty a descrever
o argumento popular segundo o qual vivemos numa era de nossos talentos e
capacidades importando mais como “otimismo irracional”. Os dados também o levam
a rejeitar a ideia de que a desigualdade de salário cresceu na medida em que a
mudança tecnológica aumentou a demanda por trabalhadores altamente qualificados
e bem educados.
Em vez disso, a evidência de Piketty sugere que é a ascensão
do que ele chama de “supercomando” dos 1%, desde 1980, que está impulsionando o
aumento da desigualdade de renda. É aqui que Piketty dá o golpe mais sério nos
economistas.
Na sua discussão sobre os prósperos 1%, ele observa que
“dentre os membros dos grupos dos super ricos, estão economistas acadêmicos,
muitos dos quais acreditam que a economia dos EUA está funcionando muito bem e,
em particular, que ela recompensa os talentos e os méritos acurada e
precisamente. Esta é uma reação humana muito compreensível”. Piketty concorda
que, no longo prazo, os investimentos em educação são um componente importante
para qualquer plano voltado à redução das desigualdades no mercado de trabalho
e para a melhoria da produtividade. Mas por si sós, eles não são suficientes.
Este livro é importante pelos seus achados, assim como pelo
modo como Piketty neles chega. É fácil –
e divertido – argumentar a respeito de ideias.
É muito mais difícil argumentar a respeito de fatos. E fatos é o que
Piketty nos dá, ao passo que pressiona o leitor a se engajar na jornada de suas
implicações.
(*) Heather Marie Boushey é diretora executiva do Washington
Center for Equitable Growth e integra o Center for American Progress, um think
tank dos EUA. Artigo publicado na The American Prospect.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
12