Nenhum dos movimentos é sobre apenas um homem. São um reflexo de milhões de pessoas querendo ir além do neoliberalismo.
Diane Abbott, The Guardian // cartamaior.com.br
Eu passei a semana passada na Convenção Nacional Democrata na Filadélfia. Logo cedo no primeiro dia da convenção, houve uma tempestade espetacular com raios e trovões. Se você era um apoiador de Bernie Sanders e de alguma denominação religiosa, você até poderia ter se perguntado se era Deus, a própria, deixando claro seu descontentamento com a perspectiva de o Partido Democrata nomear Hillary Clinton como candidata.
Apenas um assunto estava na boca da maioria – os delegados de Sanders e como eles podiam ser controlados. Muitas das pessoas que conheci estavam interessadas em Jeremy Corbyn, quem eles viam como a resposta britânica para Sanders.
Existem muitas similaridades entre Corbyn e Sanders. Ambos, tendo arado seu próprio terreno na política progressiva por mais de 30 anos, se encontraram de repente no centro dos eventos. Sanders chegou próximo de arrebatar a nomeação do partido e de derrotar a máquina Clinton. Mas ele está envolvido em batalhas com as elites de Westminster – políticas, jornalísticas e aquelas raramente envolvidas em thinkthanks.
Ambos são felizes de se intitularem socialistas. No novo Partido Trabalhista esse era o beijo da morte para uma carreira política. Nos EUA, é ainda mais perigoso: ser acusado de ser socialista já é suficiente para tê-lo caçado para fora da vida pública.
Ambos têm programas políticos similares. Defendendo ou argumentando por um serviço de saúde gratuito é vital para ambos – mesmo que Sanders possa só sonhar com uma versão yankee do NHS. Ambos acreditam em justiça social. Eles fazem campanha pelos 99% contra o 1%. eles batalham contra o poder dos grandes bancos e instituições financeiras. Ambos acreditam em um salário mínimo maior e investimentos em infraestrutura. Ambos são defensores de longa data da ação contra a mudança climática. E também é válido pontuar que ambos parecem mais confortáveis quando não estão usando gravata.
No entanto, talvez o mais chocante, são os seguidores entusiasmados compostos por pessoas jovens. Sanders tem 74 e Corbyn, 67 anos, mas eles mobilizaram os jovens em números sem precedentes, e trouxeram muitos, que antes rejeitavam, para a política.
São os apoiadores apaixonados de Sanders, jovens e idosos, que apresentaram um desafio ao establishment do Partido Democrata nessa convenção. Eles chegaram com raiva e tristes porque seu herói havia perdido. Muitos desprezam Clinton, quem eles veêm como tudo que é corporativo e compromissado sobre o establishment do partido. Eles suspeitaram que o processo das primárias podia ter sido falso. Emails vazados pareceram comprovar isso.
Houve protestos fora da convenção quase todos os dias e vaias altas dentro do hall todas as vezes que o nome de Clinton era pronunciado. Representantes do partido se esforçaram para manter todo mundo calmo. Tinha muitos fãs de Sanders insatisfeitos no chão, muitos ansiosos por uma luta (metaforicamente).
Muitos se descreviam como “Bernie ou nada” - em outras palavras, não tinham intenção em votar em Clinton. Alguns até apareciam na TV dizendo que preferiam votar em Trump do que em Clinton. Então, Sanders pessoalmente enviou uma mensagem a cada um de seus delegados para estimulá-los a ficarem calmos e respeitosos. Mas enquanto a convenção se desgastava, até as pessoas do “Bernie ou nada” se acalmaram.
Eles foram encorajados a se acalmar por causa de discursos excelentes como o de Michelle Obama. A convenção terminara, e, enquanto os delegados retornavam para casa, a maioria das pessoas ainda acredita que os apoiadores de Sanders mais apaixonados ainda votarão em Clinton. Não é porque eles foram persuadidos de seus méritos, mas porque a perspectiva de uma presidência Trump é horrível.
Então, com todos os paralelos entre Corbyn e Sanders, veremos membros saírem em grande número se Corbyn perder a eleição de liderança esse verão? Sua liderança teve um efeito transformador. O Partido Trabalhista está maior do que nunca, com mais de 450.000 membros. Mas a ideia de que novos membros são um exército fantasma que irá desaparecer se Corbyn sair da liderança é uma desilusão espalhada por seus inimigos.
Como Sanders, a insurgência de esquerda que Corbyn está associado não é sobre um homem ou um culto a uma personalidade. A insurgência em ambos os lados do Atlântico é sobre milhões de pessoas percebendo que “um jeito melhor é possível” e querendo mover para além do neoliberalismo. Essa percepção não irá desaparecer.
Como isso se dá em termos de partido depende nos atores políticos envolvidos. Mas seria um erro para o establishment do partido, em ambos os lados do Atlântico, descartar essa insurgência, e achar que coisas irão voltar ao que eram antes.
Enquanto terminava a convenção, a tempestade parou, mas continuou a chuva. Às vezes, a mudança vem com uma trovoada. Mas, mais frequentemente, vem com uma persistência gentil que a esquerda, tanto no Reino Unido, quanto nos EUA, terá para mostrar a seguir.
Créditos da foto: reprodução
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