A eleição de Joe Biden criou uma certa ilusão com seu governo pela derrota de Donald Trump, mas a verdade é que Biden e Harris representam o que há de pior na política mundial
Rui C. Pimenta comenta sobre os fatos mais importantes da semana todas as terças às 16h | Foto: DCO
Na última semana, vários acontecimentos da política internacional ganharam destaque nos noticiários e estes foram explicados e analisados pelo ponto de vista marxista por Rui Costa Pimenta no programa Análise Política da TV 247, na última terça-feira (10). A posse de Luís Arce e a volta de Evo Morales a Bolívia, o impeachment de Martín Vizcarra no Peru e, principalmente, as eleições dos Estados Unidos e a vitória de Joe Biden foram os principais acontecimentos abordados na análise.
Luis Arce: a volta da democracia na Bolívia?
Após a posse de Luís Arce no último domingo (8) e a volta de Evo Morales à Bolívia depois do golpe de Estado, criou-se uma falsa ilusão, principalmente da esquerda pequeno burguesa, de que essa seria a volta da democracia ao solo boliviano, o que não é. O golpe de estado na Bolívia orquestrado pelo imperialismo e a burguesia boliviana é mais um episódio de uma onda de golpes que derrubaram governos de esquerda frutos da mobilização da classe operária em toda a América Latina, como por exemplo na Argentina, Equador, Venezuela, Bolívia. Não é do interesse do imperialismo que essa situação do golpe seja revertida, inclusive o interesse era de que os regimes ficassem ainda mais rígidos, mas o imperialismo se viu obrigado a recuar com suas políticas pelo menos parcialmente em alguns países devido à intensificação da crise econômica e o aumento das mobilizações populares diante da situação.
Neste sentido, a eleição e o governo de Luis Arce devem servir como uma política de compromisso, já que não houve alternativa devido à situação à qual a Bolívia (não somente a Bolívia) se encontra. Como destacou Rui,
“O governo Arce é um governo de compromisso entre as vítimas do golpe e os golpistas, só que intermediado por elementos de confiança dos golpistas. O Arce, ele não é a volta do Evo Morales. Tudo bem, o Evo Morales fez um acordo para a volta do Arce porque ele considera que é mais favorável o Arce do que os golpistas logicamente, pra ele. Mas esse acordo é um acordo instável”.
Este acordo, ou seja, o governo de Arce é instável porque o imperialismo colocou nas mãos da ala mais direitista do MAS o enfrentamento da crise econômica e social da Bolívia que é muito grave, o que é muito difícil, e isso pode levar a um novo levante político da direita no país.
Em contrapartida, a situação revelou que a crise na Bolívia não deverá se resolver apenas pelas vias institucionais ou pelas eleições, ou seja, a situação deve se intensificar pelos dois lados, tanto pela direita e o imperialismo como também pelos trabalhadores que tendem a se rebelar ainda mais, uma maior polarização tende a acontecer no país.
Peru e o impeachment de Martín Vizcarra
Outro acontecimento de grande importância política na América Latina que ocorreu nesta última semana foi o impeachment de Martín Vizcarra, presidente do Peru. Rui Costa Pimenta analisou o verdadeiro caráter deste episódio, afirmando que
“O que aconteceu no Peru foi um golpe de estado branco, assim como aconteceu no Brasil, um impeachment inventado, não há nem provas, nada, o próprio presidente falou que não há nenhuma prova de nenhum envolvimento dele”.
O impeachment de Vizcarra foi mais um golpe muito semelhante àqueles que já vimos anteriormente na América Latina, como por exemplo, no próprio Brasil. Vale ressaltar que nas outras eleições, o governo peruano que foi eleito acabou sendo pressionado e após a eleição o presidente foi preso.
O governo eleito após esse acontecimento é um governo de direita, mas para se analisar a questão do Peru, deve-se atentar ao Fujimorismo. O Fujimorismo no Peru seria uma espécie de bolsonarismo institucional que se criou quando o imperialismo e a burguesia deram o aval para que Alberto Fujimori pudesse combater a guerrilha do Sendero Luminoso, uma guerrilha de esquerda, em que seu líder, Abimael Guzmán, com mais de 80 anos, está preso até hoje sem nenhum amparo em questões de saúde e às suas condições de vida. Essa foi uma ditadura completamente sanguinária disfarçada de democracia, e nas últimas eleições o fujimorismo acabou se recuperando e assim está tentando acabar com esses governos. O que precisa ser analisado ainda é que se esse episódio é ou não apoiado pelo imperialismo, mas não há dúvidas de que se trata de mais um golpe de Estado da direita, se aproveitando de um governo muito mais fraco e sem apoio, afinal a esquerda não apoiou o governo e inclusive se aliou ao fujimorismo em diversas questões.
A eleição de Joe Biden e o que esperar de seu governo
O fato mais importante e comentado na política internacional na última semana foram as eleições dos Estados Unidos e a vitória de Joe Biden. De primeiro momento, a reação de Trump com o resultado das eleições gerou uma crise gigantesca no país, e ao contrário do que a grande imprensa, apoiadora de Biden, fez parecer, Trump não está isolado, e até mesmo o presidente do Senado já sinalizou apoio a Trump e a seu processo de investigação de fraudes nas eleições, e ele não foi o único. Cerca de 78% do partido republicano declarou apoio a Donald Trump, além de governadores, como por exemplo na Geórgia, estado tradicionalmente republicano, em que o governador acabou demitindo os integrantes do seu governo responsáveis pelas eleições no estado. Isso mostra a tendência à ampliação da crise e as eleições dos Estados Unidos estão longe de terminarem.
Outro fator desestabilizador é que a crise no partido democrata já começou. A ala progressista do partido já sinalizou para a parte direitista, a ala de Joe Biden, Kamala Harris, Hillary Clinton e Barack Obama que não irão aceitar acordos com democratas nem com representantes de grandes corporações e do sistema capitalista, o que pode levar a um verdadeiro racha dentro do partido, já que Biden já sinalizou o caráter reacionário do seu governo. Essa é uma grande ilusão da ala progressista do partido. Como destacou Rui,
“Os progressistas estão achando que eles têm o poder de controlar o governo direitista, ultra direitista, diga-se de passagem, do Biden”.
Outro fator que devemos analisar nas eleições dos Estados Unidos é a dificuldade em que o imperialismo teve para derrotar o governo Trump que tinha pouquíssimo apoio. A votação foi extremamente dividida, a diferença entre Biden e Trump foi de apenas 4 milhões de votos, e isso revela também o caráter dos votos que cada um recebeu e também sobre a fragilidade do próximo governo:
“Ele é frágil porque o sistema político norte americano está dividido, o voto de Trump é um voto de protesto contra o sistema político, uma boa parte dele, o voto de Biden é um voto sem convicção, de gente que vai rapidamente se indispor com Biden dependendo da política que ele traz, então tudo isso aí mostra um cenário de crise… o voto em Trump não é um voto ideológico de extrema direita, assim como o de Bolsonaro. Bolsonaro tem aquele núcleo de extrema direita, mas ele ganhou a eleição com voto disperso, um voto meio sem identidade política… muita gente que vota em Trump está votando contra o tradicional sistema imperialista norte americano, que levou o país a uma situação de crise semelhante à crise da década de 1930.”
Com a premissa de que a vitória de Biden seria uma vitória contra a extrema direita, uma grande parcela da esquerda, principalmente no Brasil, além da grande imprensa dos Estados Unidos, colocou as eleições como se a disputa ocorresse entre a “chapeuzinho vermelho e o lobo mau”, mas a realidade é que Joe Biden representa o que há de pior na política mundial:
“Biden pode parecer simpático aqui no Brasil, o pessoal não conhece ele também, mas nos Estados Unidos o pessoal acha que isso é a pior coisa que existe no mundo”
Joe Biden não representa progressismo, muito menos nada de novo na política internacional, na verdade estamos lidando com o mais puro representante do neoliberalismo e das políticas imperialistas, tradicionais nos Estados Unidos. Tanto Biden quanto Kamala Harris, sua vice negra usada demagogicamente com os identitários, representam políticas genocidas e as suas fichas criminais contra os trabalhadores são extensas. Devemos lembrar que Joe Biden foi vice presidente de Barack Obama, até então um político nada sólido para assumir o país, enquanto isso, Joe Biden, já prestigiado nos círculos capitalistas, de Wall Street à CIA, entre tantos outros aparelhos do imperialismo, comandou verdadeiramente as políticas internacionais de guerras e golpes que marcaram o governo de Barack Obama, inclusive o golpe de Estado no Brasil contra a presidenta Dilma Rousseff foi fruto das políticas de Joe Biden. Biden representa o que há de mais sujo na política, e está no mesmo lado de pessoas como os Clinton, os Bush, entre tantos outros genocidas que derramam sangue dos trabalhadores mundo afora.
Muito se questiona sobre como deverá ficar a situação das populações mais oprimidas no país agora com o governo Biden/ Harris, como se algo fosse realmente mudar, mas isso também é outra ilusão. Devemos lembrar que Kamala Harris foi responsável por várias condenações de morte de negros no país, e enquanto a mesma usa da demagogia de “representatividade” para a população negra, o país segue com 37% da população carcerária de negros para uma população total de apenas 15% de negros no país. Quanto aos imigrantes, devemos lembrar que o governo Obama deportou muito mais imigrantes que o governo Trump, e a política de internacionalização da produção, típicas do neoliberalismo que Biden segue, devem ser também muito prejudiciais tanto para americanos e ainda mais para imigrantes. Ainda sobre os crimes de Biden contra os trabalhadores devemos destacar também as suas políticas de encarceramento, afinal ele foi o responsável pela Lei de encarceramento no país, onde as penas para crimes leves foram aumentadas colocando mais pessoas ainda dentro das prisões, alguns até mesmo condenados a prisão perpétua.
É ilusão esperarmos que a eleição de Joe Biden seja algo positivo para os próprios Estados Unidos e também para o resto do mundo, afinal o mesmo representa aquilo que há de pior na política mundial, onde na realidade devemos aguardar é que a crise se intensifique no país, pois somente uma crise no coração do imperialismo pode representar algo bom para as populações oprimidas pelo imperialismo.
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