Só no âmbito federal, são 140
estatais, com patrimônio líquido de R$ 611,7 milhões, que poderão passar às
mãos do mercado.
Najla Passos // www.cartamaior.com.br
O Brasil possui hoje, só no
âmbito federal, 140 empresas estatais que empregam 538.436 trabalhadores e têm
seus ativos totais avaliados em R$4,5 trilhões, conforme os últimos dados
consolidados pelo Ministério do Planejamento (MP), em dezembro de 2014. Só o
patrimônio líquido dessas estatais é de R$ 611,7 milhões. Um patrimônio do povo
brasileiro ameaçado pela cobiça do mercado.
São estatais de porte, atuação e
até imagem consolidada diversas. Entre elas está a Petrobrás, gigante do
petróleo mundial envolvida em escândalos de corrupção, mas também está a
conceituada Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), referência
internacional no desenvolvimento de tecnologia para a produção de alimentos
saudáveis.
Estão também agentes consolidados
do sistema financeiro, como o Banco do Brasil (BB), o Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), o Banco da Amazônia (Basa) e a
Caixa Econômica Federal (CEF). E, ainda, empresas de atuação em outras áreas de
importância estratégica para o país, como Eletrobrás, Telebrás e Correios.
Essas estatais também têm
natureza jurídica diferentes. Há empresas públicas, cujo controle é todo do
estado, mas também há as empresas de capital aberto, cuja parcela minoritárias
das ações já está nas mãos de investidores privados. No entanto, estas últimas
ainda são minoria. Das 140, apenas nove negociam ações em bolsas: Petrobrás,
BB, BB Seguridade, Basa, Bndespar, Eletrobrás, Eletropar, BNB e Telebrás.
É justamente essa realidade que o
Projeto de Lei (PL) 555/2015 quer mudar. De autoria do senador Tarso Jereissati
(PSDB-CE), a proposta visa entregar ao mercado, em uma só tacada, parcela
significativa de todas as estatais brasileiras, o que inclui não só essas 140
empresas administradas pelo governo federal, mas também às dos estados,
municípios e do Distrito Federal.
Conforme o texto do projeto, as
estatais deverão manter em circulação no mercado pelo menos 25% das suas ações
ordinárias. Pelo menos. O projeto, portanto, propõe uma retomada da política entreguista
executada pelo governo Fernando Henrique Cardoso nos anos 1990, que vendeu ao
capital internacional – a preço de banana, como denunciava à época o jornalista
Antônio Biondi – valiosos patrimônios brasileiros, como a Companhia Vale do Rio
Doce.
Mas é uma retomada com nova
roupagem, dado o evidente insucesso da política anterior que, de tão
escrachada, naufragou ao propor, por exemplo, que a Petrobrás fosse rebatizada
de ‘Petrobrax’ para agradar o mercado internacional. O discurso que justifica tamanho
disparate, hoje, está amparado na luta contra a corrupção, usado em larga
escala, inclusive, por quem mais se beneficia dela.
Ao mercado, tudo!
E não é só isso. O projeto também
condiciona a direção das estatais brasileiras a um pequeno grupo de executivos
com formação, visão e experiência de mercado. Proíbe, por exemplo, que
ministros e ocupantes de altos cargos públicos,
sindicalistas ou cidadãos com filiação partidária (em um país que se diz
democrático) ocupem cadeiras nos conselhos das empresas. Pela proposta, esses
cargos ficam reservados exclusivamente a pessoas com comprovação de 10 anos de
mercado, o que acaba por excluir também acadêmicos e intelectuais de notório
saber.
Dentre todas as mudanças
propostas pelo projeto, a mais grave é a que altera a função social das
estatais, hoje definida a partir de uma atuação em prol do bem-estar da
população brasileira. Pelo projeto tucano, a atuação das estatais deve ser
balizada única e exclusivamente pelos interesses do mercado. Se aquela agência-barco
da CEF que percorre a Amazônia não dá lucro, que seja fechada. Danem-se os
ribeirinhos que a têm como a única opção de acesso ao sistema financeiro!
O cordão da direita
Embora o texto do projeto tenha
sido gestado em ninho tucano, com a contribuição pública do senador Aécio Neves
(PSDB-MG) e o apadrinhamento do senador José Serra (PSDB-SP), ele também agrada
aos setores do PMDB mais capturadas pelo mercado – que, é sempre bom lembrar,
não são poucos. Incluído na Agenda
Brasil proposta pelo presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), também
caiu nas graças do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ).
A dupla de peemedebistas
investigada pela Operação Lava jato aprovou uma comissão especial mista,
formada por membros das duas casas, para avaliar o projeto em tempo recorde e,
em menos de três meses, disponibilizá-lo para votação. Com isso, o projeto não
tramitou pelas comissões usuais do Senado e da Câmara e o debate público em
torno do tema ficou totalmente comprometido.
Agora, servidores dessas estatais
e as centrais sindicais de luta do país se mobilizam para tentar barra-lo. Mas
a luta é inglória. O presidente do Senado já anunciou que colocará o projeto em
votação na terça (16), imediatamente após o retorno da casa do carnaval. Fragilizado
pelas crises política e econômica, o governo não tem empreendido os esforços
mínimos necessários para derrotá-lo. Ao contrário. Há grupos do próprio governo
que apoiam o PL-555/2015.
Créditos da foto: ABr
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